Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Vlado vivo

Uma apropriada citação do filósofo alemão Walter Benjamin (1895-1942) – “A tarefa dos homens, a cada tempo, não é só preservar o passado, mas realizar as suas esperanças” – abre no Estado de S.Paulo desta quinta-feira, 14, a primeira matéria publicada na imprensa brasileira sobre a criação do Instituto Vladimir Herzog, marcada para 25 de junho.

Vlado, como era chamado o diretor de jornalismo da TV Cultura, morreu sob tortura no DOI-Codi de São Paulo, em 25 de outubro de 1975. O seu holocausto – e a versão infamante dos generais de que ele se suicidara – desencadearam no país o maior movimento de protesto até então contra os crimes da ditadura de 1964. Foi o embrião da luta pela anistia e as diretas-já.

Mas, como deixa claro o título da reportagem de Gabriel Manzano Filho, “Uma casa para Vlado vivo”, a ideia do instituto não é prantear a sua morte, mas identificá-lo “com a vida, com o hoje”, diz o seu filho mais velho, Ivo.

Daí o mote do instituto: “Contribuir para a reflexão e produção de informação voltada ao direito, à justiça e ao direito à vida.” Nessa pauta, a questão dos direitos humanos deverá ter um lugar central. [O endereço eletrônico do instituto é http://www.vladimirherzog.org].

A matéria:

“A tarefa dos homens, a cada tempo, não é só preservar o passado, mas realizar as suas esperanças. Foi nesse famoso pilar, plantado pelo filósofo Walter Benjamin, que se inspiraram a família e os amigos de Vladimir Herzog para dar uma virada em três décadas de homenagens rotineiras e anunciar, para o dia 25 de junho, a criação do Instituto Vladimir Herzog.”

Foi nesse famoso pilar, plantado pelo filósofo Walter Benjamin, que se inspiraram a família e os amigos de Vladimir Herzog para dar uma virada em três décadas de homenagens rotineiras e anunciar, para o dia 25 de junho, a criação do Instituto Vladimir Herzog.

A data diz tudo. ‘No dia 27, meu pai estaria completando 72 anos’, lembra o engenheiro Ivo Herzog, 42 anos, filho mais velho do jornalista. ‘O que queremos é que ele e o instituto sejam identificados com a vida, com o hoje. Com a figura do Vlado ativo, jornalista, fotógrafo, cineasta, ligado a rádio e TV, professor da ECA. Um homem multimídia, como tantos de hoje, mas bem à frente de seu tempo. E também ligado à defesa dos direitos humanos’, diz ele.

O ministro Paulo Vanucchi e autoridades ligadas à causa devem comparecer à cerimônia de fundação, na Cinemateca. O programa incluirá homenagens a dom Paulo Evaristo Arns, ao rabino Henri Sobel e, in memoriam, ao pastor James Wright – as figuras que deram apoio à família e enfrentaram a ditadura quando Vlado foi morto.

A ideia, que já existe como site, surgiu há um ano. Ivo, sua mãe Clarice, o irmão André e muitos amigos estavam insatisfeitos com a imagem que ia ficando de Vlado – morto, pendurado numa janela, numa montagem grosseira para simular seu suicídio. Queriam, além disso, retomar uma participação mais direta no prêmio Vladimir Herzog.

Além disso, antecipa Clarice, o plano é criar um espaço físico em que se reúna a documentação – textos, fotos, filmes – para que seja usada por estudantes, principalmente. ‘Somos sempre procurados para falar dele, contar como tudo aconteceu naquele ano, reviver a história. Isso tem de ser organizado’, avisa a empresária. Daí a missão do instituto: ‘Contribuir para a reflexão e produção de informação voltada ao direito, à justiça e ao direito à vida.’

Mas há um longo caminho pela frente. Com apoio de várias instituições, como OAB, ABI, Sindicato de Jornalistas e Comissão de Justiça e Paz, o grupo tem de correr atrás de recursos. Uma das saídas é aLei Rouanet. Fisicamente, ficarão de início em um prédio da Bela Vista. E a nova entidade chega com mudanças no prêmio: agora estudantes poderão inscrever seus projetos de matérias e as melhores ideias serão patrocinadas.

O jornalista Sérgio Gomes, velho amigo dos Herzog, é um dos entusiastas da causa. ‘O Vlado era um multimídia já naquela época. Mas por que lembrar só dele? E os outros, suas esperanças e lições? E como viver na prática, hoje, o que todos eles sonhavam?’

Outra das ideias é valorizar o que chamam de ‘direitos humanos intangíveis’ – temas como corrupção ou atentados ao meio ambiente, cujo estudo vão valorizar.

E para sua luta Ivo traz à memória um episódio recente com dom Paulo. ‘Foi ele quem primeiro nos acendeu a chama, em um encontro no qual me passou um pequeno pedaço de papel. Pedia que, pela memória de meu pai, fizéssemos alguma coisa na direção de paz, solidariedade e vida’, recorda. Ele espera que o instituto seja a resposta.”