Talvez não haja no Brasil uma grande repercussão, mas as acusações contra a agência da ONU pelos refugiados palestinos, UNRWA (do inglês United Nations Relief and Works Agency for Palestine Refugees in the Near East), fizeram e ainda são manchetes na mídia europeia, como o jornal francês Libération e o suíço Le Temps. O grande espaço no Le Temps, deve-se também ao fato de ser um suíço-italiano, Philippe Lazzarini, o responsável por esse comissariado da ONU pelos refugiados.
Nos últimos dias, as acusações forçaram Lazzarini a demitir uma dezena dos funcionários sob sua direção, acusados de estarem implicados direta ou indiretamente no massacre de civis israelenses em 7 de outubro de 2023. Alguns desses funcionários teriam mesmo participado dos assassinatos, demonstrando com isso terem sabido previamente dos ataques e agido como cúmplices. Pior, teria a agência UNRWA participado dos planejamentos do Hamas?
Na dúvida, mas sob forte suspeita, já são 15 os países que suspenderam sua ajuda ao órgão da ONU de ajuda aos palestinos, temendo ter havido desvio dessas contribuições para a criação do arsenal e forte armamento do Hamas na Faixa de Gaza, onde resistem há quatro meses às represálias israelenses.
Essa suspeita cresceu nestes últimos dias, tanto que a União Europeia pediu uma auditoria dentro da UNRWA, enquanto o conselho nacional do governo suíço convidou Philippe Lazzarini, o responsável pela UNRWA, para fazer uma análise da situação aos parlamentares suíços. Logo nos primeiros dias depois dos ataques do Hamas, corriam denúncias de ter havido comemorações em algumas escolas de Gaza, dirigidas por professores pertencentes à agência onusiana.
Embora se fale num próximo cessar-fogo em Gaza, de 45 dias com a libertação de apenas 35 dos reféns israelenses, um acordo não parece muito próximo. Apesar da pressão dos familiares dos reféns sobre o dirigente israelense, Benjamin Netanyahu rejeita uma trégua pela qual o Hamas possa explorar a imagem de ter saído vencedor sobre Israel.
O escritor, sociólogo e professor Gilles Kepel, especialista do Islã e do mundo árabe contemporâneo, numa entrevista à revista L ́Express, lembra ter sido também num 7 de outubro a Guerra do Kippur, há 50 anos, que Anuar el Sadate e Hafez al-Assad, atacaram Israel, mudando a situação no Oriente Médio. Entretanto, enfatiza Kepel, tanto o Egito como a Síria não tinham por objetivo destruir Israel, como deseja o Hamas, mas para criar uma relação de equilíbrio de força com Israel e dar um legitimidade aos regimes de Sadate e al-Assad.
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Rui Martins é jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu Dinheiro sujo da corrupção, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, A rebelião romântica da Jovem Guarda, em 1966. Foi colaborador do Pasquim. Estudou no IRFED, l’Institut International de Recherche et de Formation Éducation et Développement, fez mestrado no Institut Français de Presse, em Paris, e Direito na USP. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.