“Quantos anos serão necessários para reconstruir o Brasil, para reflorestar a terra ardente, para reavivar os instrumentos institucionais que fazem uma democracia funcionar? Quanto trabalho teremos de empenhar em cada dia de estrago implementado intencionalmente por esse governo? Quantas vidas teremos de pagar?”
Eugênio Bucci escreveu este parágrafo no artigo do Estadão, “O Golpe em Gerúndio” (22/04/21). E o resto das manchetes e notícias só afundam as expectativas do brasileiro:
“O Brasil despenca no ranking global de felicidade e terminou 2020 no 41º lugar” (FSP,20/3/21).
“O Brasil sai da lista das dez maiores economias do mundo e vai despencar para 12ª posição” (FSP, 04/04/21)
“O Brasil cai para a zona vermelha do ranking de liberdade de imprensa junto com Bulgária, Indonésia, Benin, Zambia” (FSP, 20/04/21).
“Brasil cai oito posições em ranking do PIB per capita” (Valor, 11/04/21)
“Ibovespa está entre as piores Bolsas do mundo” (Valor,22/04/21)
“Fenômeno dos anos Lula, classe C afunda e cai na miséria” (FSP, 25/04/21)
Ninguém aguenta mais plágios nas teses de ministros nomeados para a área de Educação e a nova presidente do CAPES, Claudia Toledo desculpa-se: no seu caso houve cópia, sim, mas plágio…não. O ministro da Educação, Milton Ribeiro, também pediu desculpas por um erro de cálculo no repasse dos recursos do Fundeb. Deixou só milhares de estudantes de fora.
Bolsonaro continua tentando dar um jeitinho nos seus julgadores na CPI da Saúde no Congresso. Kajuru divulgou a conversa e o presidente quer “sair na porrada” com o senador.
O Centrão refaz lista de pedidos para cargos no Turismo, Educação, Minas e Energia, Economia, Infraestrutura -pelo jeito, ficou tão capenga que ninguém quer ir para a Cultura.
O ex-Secretário de Comunicação da Presidência, Fabio Wajngarten, declarou à última revista Veja que o rei está nu, o Brasil não comprou vacina por incompetência, e o general Eduardo Pazuello é o responsável, sim.
O discurso de Bolsonaro na Cúpula de Líderes sobre o Clima fala, no mínimo, de um Brasil imaginário, que não reflete os 39 decretos do governo passando a boiada nos últimos dois anos e omite os 240 milhões de reais do corte orçamentário no meio ambiente.
Este é o Brasil que temos. O Brasil que queremos ficou a cargo de uma entrevista realizada este sábado com Marcos Azambuja por integrantes do grupo formado pelo jornalista Armando Ourique. O embaixador trouxe de volta o Brasil que ficou para trás.
Azambuja não dá palpite sobre como resolver o problema hoje porque “não sou psiquiatra”. O Brasil deve se deitar no divã. Somos aprendizes de feiticeiros, inventamos o veneno mas não sabemos o antídoto. “Quem controla o controlador? Quem está no controle?”
Para o embaixador que serviu na Argentina (1992-1997), França (1997-2003) e coordenou a Conferência Rio 92, boa diplomacia começa com geografia, estabelecendo pontes com os vizinhos. Numa conversa que teve com um diplomata uruguaio, o colega explicou que, para os latinos, ser vizinho do Brasil é dormir com o elefante — basta virar de lado que incomoda. O que o Brasil fez agora foi não só incomodar mas se distanciar de todos os vizinhos, os próximos e os distantes, criando caso com seus fregueses maiores, China e Argentina, espicaçando a mulher do presidente francês, chamando a vacina de Vachina.
“O Brasil traiu-se a si mesmo, tem dado tiros no próprio pé e nem é mais caso de ser resolvido na diplomacia. Chamem o dr. Scholl”.
As palavras do presidente a Joe Biden, “o país está na vanguarda do enfrentamento do aquecimento global”, seguem a comum retórica triunfalista do tipo “somos uma democracia racial”, “o meio ambiente é nosso”, o que não poderia piorar mais nossa posição.
“O Brasil errou, passou a ser visto como desequilibrado. O Brasil está diminuído, perdemos dimensão, influência e estatura. Excluímos os melhores, valorizamos os piores. Perdemos o caminho.”
Sim, Ernesto Araújo foi para casa. “Nós permanecemos aqui, tínhamos uma previsibilidade, um fio condutor e agora é como se um doido surgisse dentro de casa. O Brasil não é escanteável, não é esquecível, dá para consertar, nós não tínhamos era que nos meter nessa encrenca. O Brasil tem de semear paz.”
Como todos nós, o embaixador julgava que o Brasil tinha um contrato histórico com ele. “Enquanto eu vivesse, o Brasil daria certo. Mas ele não cumpriu o contrato comigo. O diplomata é um camelô que vende seu produto e agora este produto está desvalorizado, não está bem cotado na praça.”
Se a função do futuro é ser perigoso, este é um momento verdadeiramente revolucionário, de mudanças das regras do jogo multiplicadas pela velocidade de disseminação das notícias pela Internet. É preciso mais despolitização, mais dessacralização — e o embaixador critica a vulnerabilidade do STF “pelo excesso de publicidade“. Azambuja gostou de ver Lula fora da prisão, mas quer renovação no poder.
O embaixador lamenta não haver mais nos discursos dos deputados e senadores a qualidade da oratória que ouvia por prazer na Câmara dos Deputados quando era estudante de Direito no Rio. Faltam bons modos, fórmulas de cortesia, respeito pelo outro — o “outro” que deixou de existir. “Parece que vivemos num saloon”. Lamenta: o Rio tem seis governadores presos em sequência. “Essa ́proeza, nem no Guiness”
“Mas ainda temos onde nos proteger pelos resíduos deixados da Segunda Guerra. O absurdo é tanto que leva à racionalidade. Exemplo, a queda de Trump.”
Para o Brasil ele pediria três desejos à lâmpada mágica:
“Outro governante — com a pessoa que está aí nada pode acontecer. Outro discurso para o Brasil — não era difícil ser diplomata, o Brasil só tem de ser decente. Outro remédio para a cura — não adianta só saber diagnosticar o mal se não se tem o remédio para a cura”.
Sim, o Brasil tem jeito, há correção para os rumos da história se houver reconhecimento da responsabilidade. É difícil fazer a pasta de dente voltar para o tubo? Sim, mas é possível consertar. Como? O embaixador Marcos Castrioto Azambuja, que foi chefe da delegação do Brasil para assuntos de Desarmamento e Direitos Humanos em Genebra (1989-1990), vivendo hoje num país que defende armar a população até os dentes, aos 86 anos deseja: “Boa sorte ao Brasil”.
PS: No dia em que o Globo e a Folha de S.Paulo resolverem qual é o jornal mais lido do país, avisem por favor ao leitor que lê diariamente em um e no outro páginas duplas pintadas de lilás no Globo, de azul na Folha, cada um se vangloriando de ser o mais vendido, o mais lido, o mais brasileiro do Brasil.
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Norma Couri é jornalista e Diretora de Inclusão Social, Mulher e Diversidade na Associação Brasileira de Imprensa (ABI).