A pandemia causada pelo novo coronavírus impactou inúmeros setores de atividades profissionais no ramo do entretenimento, varejo, moda, aviação etc. Em meio a esse cenário, com o advento do isolamento social ou mesmo lockdown em algumas capitais, a cobertura jornalística, definida pelo Governo Federal como atividade essencial no enfrentamento à pandemia da covid-19, ganhou novos olhares frente à crise sanitária que se instaurou no país.
Há alguns meses, quando vivíamos vidas normais, as mídias sociais da internet eram a principal fonte de informação para o cidadão médio brasileiro. Acesso fácil na ponta dos dedos, textos curtos e a não necessidade de checar informações são opções tentadoras para quem vive a vida frenética das megalópoles.
O curioso é que as mídias tradicionais (rádio, tevê e jornais impressos ou suas versões digitais) ganharam, novamente, o protagonismo na divulgação de notícias tidas como ‘confiáveis’ em razão de grande parte da população, em condição de isolamento social, perceber que redes como Facebook, Instagram e WhatsApp potencializaram a disseminação de fake news durante a crise do novo coronavírus. Diversas empresas de comunicação, rádio, jornais e portais da internet registraram um aumento significativo no acesso a seus produtos, como mostra pesquisa da Kantar IBOPE Media, que revelou um crescimento exponencial na audiência do telejornalismo durante a quarentena, por exemplo.
Assim como os profissionais de saúde e segurança, jornalistas também estão na linha de frente de batalha. Com altos riscos envolvidos, equipes reduzidas e possibilidade de demissão ou morte, podemos dizer que a cobertura jornalística na pandemia se assemelha a cobertura em uma guerra, com profissionais trabalhando incansavelmente nas redações, ruas ou hospitais. Em meio a potencialização da polarização política e com a mesma sendo exercida como gincana por grupos opostos e apaixonados, muitos profissionais da imprensa vêm sofrendo ataques e hostilizações no cumprimento de seu dever. Tanto quanto opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à opressão, o papel social do jornalismo contemporâneo é o de combater a silenciosa rede de notícias falsas que se prolifera e confunde o púbico num momento tão delicado em que vivemos. Além de ir fundo na busca da verdade, vale ressaltar a importância do trabalho intelectual na conscientização da população para que todos tenham acesso a informações claras, concisas e de qualidade. É justamente a palavra ‘qualidade’ que difere o trabalho jornalístico sério da superficialidade de publicações instantâneas.
Com a dificuldade em se obter dados confiáveis, muitas vezes dependendo de fontes exclusivamente oficiais, podemos observar equívocos na publicação de determinados fatos. É importante observar que a cobertura jornalística sobre a pandemia do novo coronavírus obriga o jornalista a cobrir duas crises: política e sanitária; e atravessar diversos campos, como o jurídico, o econômico e o ambiental. Isso reforça a necessidade em redobrar os cuidados na apuração dos fatos e de ter um bom leque de fontes para assegurar a confiabilidade das informações.
Para fins de entretenimento, muitas matérias de televisão ou portais de notícias focaram na publicação do isolamento de celebridades midiáticas abastadas, mostrando seu dia-a-dia e modus operandi de confinamento. Tal prática nos fez lembrar que no Brasil, de acordo com dados da Síntese de Indicadores Sociais – SIS, cerca 13,8 milhões de pessoas vivem em estado de extrema pobreza e em espaços de apenas um cômodo.
Paralela a crise do novo coronavírus, existe uma legião de cientistas de vários países realizando pesquisas e estudos para encontrar uma vacina que impeça a contaminação pelo vírus ou se empenhando na fabricação de remédios que atuem de maneira eficaz nos efeitos da Covid-19. Porém, na maioria dos grandes veículos de comunicação esses assuntos são simplesmente ignorados e o que é apresentado ao público confinado são números sistemáticos de contaminação e mortes. Até números quantitativos relacionados a pessoas que venceram a doença e estão recuperados são “esquecidos”. Esses posicionamentos por parte de algumas empresas de comunicação levantaram questões sobre qual seria de fato o papel da Imprensa e se esta não estaria atuando deliberadamente na difusão do medo.
Apesar dos pesares, a prática jornalística sairá da pandemia com mais credibilidade. Seja pelo fato do aprofundamento e tradução de matérias relacionadas ao conhecimento científico ou abordagens humanizadas em reportagens, o trabalho do profissional jornalista sairá ganhando. A utilização de meios digitais para realizar entrevistas e manter comunicação com as fontes virarão regra e o profissional avesso a determinadas tecnologias terá de se atualizar. A familiarização com ferramentas de publicação em podcasts, vlogs e gerenciadores de conteúdo (como WordPress, por exemplo) entrará na cartilha do novo normal da atuação do jornalista.
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Michel Ribeiro é jornalista, radialista e produtor musical em Belém/PA.