Neste momento em que nosso país tem enfrentado uma pandemia não só do novo coronavírus, suas variantes, falta de leitos, mas também da desinformação em que as esferas dos poderes não falam a mesma língua, o desafio da comunicação é ainda maior.
Neste caso, a comunicação de risco é uma das medidas mais eficazes para o controle de um surto.
Além de compartilhar e repercutir constantemente a importância dos protocolos sanitários para prevenir o contágio, a importância da vacinação as autoridades deveriam se atentar na abordagem de questões relevantes no âmbito de saúde mental como, por exemplo, lidar com sentimentos que surgem diante do cenário. Entre elas teorias conspiratórias, pânico e desconfiança nas declarações e ações dos representantes políticos.
Para isso, estabelecer uma comunicação honesta e clara torna-se primordial. Porém, o que temos observado é que, apesar de a História nos mostrar que a comunicação em tempos como este está no centro do controle epidêmico, o profissional para elaborar estratégias de comunicação de risco é lembrado, na maioria das vezes, apenas posteriormente, quando a pandemia da contrainformação já se depara em níveis lamentavelmente inadequados.
Em 2018, a Organização Mundial de Saúde (OMS) lançou um guia voltado à comunicação de riscos em emergências de saúde pública, deixando claro que a comunicação de risco deve estar ligada a serviços funcionais e acessíveis. Ser transparente, oportuna, de fácil compreensão, reconhecer as incertezas, dirigir-se e envolver as populações afetadas e divulgar as informações usando várias plataformas de comunicação são algumas das recomendações.
Cinco diretrizes que constam no material são básicas, porém, não são observadas em alguns âmbitos políticos em nosso país:
1 – Anunciar o surto precocemente, mesmo com informações incompletas, de modo a minimizar a disseminação de boatos, portanto, de desinformação;
2 – Fornecer informações sobre as medidas que a população pode fazer para sua segurança pessoal;
3 – Manter transparência nos atos para garantir a confiança da população;
4 – Demonstrar que estão sendo feitos esforços para compreender as opiniões e preocupações do público sobre o surto.
5 – Avaliar o impacto dos programas de comunicação para garantir que as mensagens estejam sendo corretamente compreendidas e que os conselhos estejam sendo seguidos.
A dissonância de comportamento entre os governos municipais, estaduais e federal, fato que tem ocorrido no Brasil, tem causado um ruído na comunicação e, por consequência, comportamentos indesejados da população, o que afeta o sucesso para o controle da pandemia.
Porém, esse comportamento, em que governos tentam negar a presença do vírus na tentativa de evitar os efeitos nocivos que os surtos causam na economia, não é de hoje.
De acordo com o psicólogo Steven Taylor, da Universidade da Colúmbia Britânica, em seu livro “Psicologia da Pandemia”, há exemplos de vários países em que o negacionismo de uma doença pandêmica ocorreu. Desde a peste bubônica, em 1770, passando pela gripe espanhola em 1918 e pelo surto da SARS em 2003.
Através de relatos e documentos históricos, ele cita que há evidências de que, ao longo da história, autoridades governamentais tentaram amenizar a prevalência e a gravidade da infecção na tentativa de suprimir tanto a ansiedade pública quanto as perdas na economia provocadas pelo distanciamento social necessário para o controle de um surto pandêmico.
Hoje, além do negacionismo de algumas autoridades, há de se observar o fato de que a sociedade tem acesso às redes sociais e blogs, responsáveis em disseminar notícias, tanto transparentes quanto falsas, o que torna a missão de informar ainda mais desafiante.
Em momentos de pandemia, os boatos ganham proporções nas redes sociais, justamente porque em tempos de incertezas, a demanda por informações excede a oferta de notícias.
Uma campanha eficaz sobre a importância da lavagem das mãos, o uso de máscaras, distanciamento social e vacinação podem contribuir para diminuição da propagação de uma doença. Porém, as redes sociais tendem a se movimentar por meio de fake news, teorias conspiratórias, receitas milagrosas para cura da doença, entre tantas outras.
Por outro lado, os jornais televisivos, impressos e sites jornalísticos possuem um papel importante para trazer números, dados atualizados sobre os fatos. No entanto, alguns jornais, sensacionalistas, podem minar os esforços da saúde em conter a propagação de uma doença.
O exagero da notícia, sem dados concretos nas informações, pode causar uma diminuição quanto às respostas emocionais que a comunicação de risco pretende atingir, fazendo com que as pessoas se tornem imunes a elas ao longo do tempo.
Já a reportagem jornalística responsável traz informações úteis ao público, ora alertando sobre os perigos, ora trazendo dados atualizados e elementos que reduzem a ansiedade.
Diante de toda análise, para que uma comunicação de risco seja eficaz ela deve conter informações sobre métodos de enfrentamento, estratégias para lidar com o estigma da doença, orientações sobre o gerenciamento do estresse causado pela pandemia, seja pelos novos comportamentos que surgem, como pessoas que passam a ter que assumir novos papéis na família, diminuição de renda de outras, desemprego, distância de familiares, luto, ansiedade, depressão, desamparo, apatia ou mesmo raiva.
Para isso, as informações devem ser percebidas de forma a incentivar a adesão às recomendações que constam na mensagem.
Pesquisas sugerem que as pessoas são mais propensas a aderir às recomendações se as seguintes condições forem atendidas:
1 – Se ela acredita que a doença é grave e que os comportamentos recomendados são eficazes na redução do risco da infecção;
2 – A pessoa está preocupada em contrair a doença e acredita estar suscetível à doença;
3 – As autoridades de saúde são percebidas como confiáveis e fornecem informações claras o suficiente;
4 – Há poucas barreiras para implementação dos comportamentos de saúde recomendados.
Para implantar uma comunicação que traga estas observações e alcance o objetivo desejado, é necessário levar em conta que a mensagem pode conter duas linhas de narrativas. Uma que contenha apelos lógicos ou apelos emocionais, sendo que apelos lógicos são compostos por fatos e estatísticas, e os apelos emocionais, quando as emoções são evocadas.
As pessoas são mais propensas a serem influenciadas em suas opiniões se forem defrontadas com narrativas vívidas ou exemplos de casos, em comparação com estatísticas brandas.
Pesquisas indicam que os apelos emocionais são mais memoráveis e mais propensos a estimular pessoas a buscar informações relacionadas à saúde.
A comunicação com apelo emocional, que provoca medo, tende a aumentar o risco percebido pela pessoa, mas, por outro lado, pode induzir à ansiedade generalizada. Isso significa o aumento no número de consultas médicas, desnecessárias, sobrecarregando o sistema de saúde.
O sucesso está no equilíbrio de ambos.
Artigo baseado na leitura do livro: A psicologia da pandemia, de Steven Taylor.
***
Rennata Bianco é jornalista e coordenadora de Comunicação Social da prefeitura de Ribeirão Preto. Atuou como redatora, repórter e apresentadora em veículos impressos e emissoras de televisão. Especialista em comunicação com foco em gestão de crises.