Dilma ganhou, Cunha perdeu, Renan assume protagonismo, Temer recua, Fachin derrotado por Barroso – a preliminar do julgamento do impeachment & afins no plenário do STF foi narrada pela mídia nesta sexta de forma singularíssima, como se tratasse do primeiro tempo de uma partida de futebol iniciada nas vésperas do Natal com desfecho marcado para depois do Carnaval pelo árbitro Teori Zavascki.
Nem jornais nem jornalistas preocuparam-se com a frustração do distinto público pagante, aquele que vive o inferno da economia real — vencimentos minguantes, meses cada vez maiores – indignado com tantas delongas, procrastinações, troca-trocas, blablablás e nhenhenhéns.
Como se fora questão secundária e complementar, o meritíssimo magistrado da suprema corte transferiu o julgamento da inédita denúncia do Procurador Geral da República contra o Presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha, pedindo a cassação do seu mandato e a perda do cargo.
Ao longo de dois dias, o STF discutiu exaustivamente e aprovou ritos e procedimentos que comandarão a votação do pedido de impeachment de Dilma Rousseff — inclusive a invalidade do voto secreto para a escolha da Comissão Especial que decidirá a sua sorte — mas deixou para depois a avaliação do fato gerador: o comportamento irresponsável, truculento e indecoroso do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, justamente o insuflador do pedido de impedimento da presidente, protagonista de um dos episódios mais sórdidos da nossa história parlamentar.
Qual a lógica deste ordenamento? A consulta encaminhada ao STF pelo atual ministro da Defesa, Aldo Rebelo, precedeu a denúncia do PGR, Rodrigo Janot. Mesmo que posteriormente venha sobrepor-se e invalidar decisões tomadas nesta quinta-feira o devido processo na instância máxima do judiciário impõe prazos e trâmites que não podem ser sumários.
O problema, obviamente, é o recesso do judiciário. Ou melhor, os recessos da máquina estatal já que o legislativo também faz jus às férias coletivas. Mas o executivo com seus vices e subs foi estruturado de forma a funcionar plena e continuamente. A administração de um estado não admite pausas. A proteção e o bem-estar de uma nação são atividades de tempo integral. Um país não pode parar.
Não pode, mas para. Muitas vezes diante de situações ameaçadoras e perigosas. Como os julgamentos simultâneos da presidente da República, seu principal detrator e um dos seus sucessores, o presidente da Câmara Federal. Somados compõem uma emergência raras vezes vivida em períodos de paz.
Recesso é um local remoto, afastado, resguardado. Etimologicamente pode ser entendido como retrocesso. Depois de julgar, juízes lavam as mãos. Nestes intervalos é que os jornalistas com seus questionamentos são mais necessários.
Em meio a zoeira bacharelesca que se seguiu ao julgamento do STF, o único observador que parece ter percebido o vazio provocado pelo duplo adiamento foi o cartunista e satirista Chico Caruso na capa da edição de sexta de O Globo. Despencando no espaço Cunha e Dilma comentam: “Se entendi bem, ficaremos no ar até fevereiro, é isso ?
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Alberto Dines é jornalista, escritor e fundador do Observatório da Imprensa