Embora não tenha enviado soldados, o Brasil participa indiretamente da guerra no Iêmen com a venda de bombas de fragmentação, condenadas pela comunidade mundial, e fabricadas pela empresa Avibras, denunciou, em Genebra, o Observatório de Armas e Munições, órgão que verifica a aplicação da Convenção de Oslo da qual fazem parte 102 países. Na última Assembléia Mundial da ONU, 141 países declararam apoiar essa Convenção, exceto o Brasil.
O Brasil não está sozinho na exportação dessas bombas condenadas pela ONU e por todas as organizações de defesa dos direitos humanos, pois fazem mais vítimas entre a população civil. Seu principal concorrente são os Estados Unidos. Também vendem essas armas China, Israel, Coréia do Sul, Egito, Índia, Irã, Turquia, Coréia do Norte, Paquistão, Polônia, Romênia e Singapura.
Embora cresça a cada ano o número de países ratificando sua adesão à Convenção de Oslo, as bombas de fragmentação provocam um número crescente de vítimas nos conflitos envolvendo a Síria e o Iêmen. Rússia, Síria e os países do bloco da Arábia Saudita em guerra no Iémen.
As bombas de fragmentação são lançadas pela artilharia, foguetes ou avião se abrem no espaço e dispersam numerosas pequenas bombas que vão cair num espaço bem maior que um campo de futebol. Muitas dessas bombas não explodem e irão se tornar ativas mais tarde, como se fossem minas anti-pessoais matando inocentes dos quais 38% são crianças, segundo o Observatório das Armas e Munições. No ano passado, a Espanha, Eslováquia e a Suíça destruíram seus estoques de bombas de fragmentação.
A Avibras, depois da ditadura com Lula e Dilma
Além das informações da Anistia Internacional e Observatório das Armas e Munições sobre a empresa brasileira também fabricante dos canhões de suporte de lançamento das bombas de fragmentação, Astros II, pouca coisa se acha na imprensa brasileira sobre a Avibrás.
Mas, o jornalista mineiro Alex Bessas da revista Trendr publicou uma reportagem, dando a ficha completa da empresa. Surpreendente, mostrando como em matéria de exportação no mercado da morte, armas e munições, não há preferência política. Tanto a China como os EUA são exportadores das bombas de fragmentação.
A Avibras Aeroespacial tem sede em São José dos Campos, fundada em 1961, estaria entre as empresas privadas que colaboraram com a ditadura militar. Em 2009, quando Lula visitou a Arábia Saudita, a Avibras estava na comitiva.
Conta Alex Bessas que, em 2011, a empresa devia 150 milhões ao governo e um deputado do PT-SP, Carlinhos Almeida pediu ajuda à presidente Dilma. Nessa altura, a Avibras já tinha obtido de Lula a compra de 23% de suas ações pelo governo, como mostra um trecho do discurso do deputado em abril de 2011, citado na revista Trendr: “O Governo Federal, desde a gestão do Presidente Lula, vem apoiando a empresa. Inclusive, tornou-se acionista da Avibras. Hoje, o Governo Federal detém, aproximadamente, 23% das ações dessa empresa. Na reunião que tivemos ontem com o Secretário de Produtos de Defesa e com o assessor José Genoíno, mais uma vez o Ministério da Defesa demonstrou a sua disposição em contribuir para que essa empresa possa continuar atuando em uma área sensível, estratégica para o País, a área de defesa”.
O pedido foi atendido, pois em agosto o deputado agradecia Dilma: “Queria registrar aqui um agradecimento à nossa Presidente Dilma, que, no dia de ontem, segundo informações que nós recebemos, assinou decreto liberando recursos para que o Exército Brasileiro possa fazer um contrato com importante empresa sediada na região do Vale do Paraíba, a Avibras”.
Sorte da Avibras que recebeu o apoio pedido e a compra de material bélico foi incluído no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Com as finanças sanadas, a empresa passou a exportar mas de preferência — diz o jornalista Alex Bessas — para regimes totalitários, provocando protestos por parte das ONGs de direitos humanos.
Uma preferência antiga, pois em 1980 exportava para o Iraque de Sadam Hussein, que estava em guerra com o Irã. Foi a própria presidente Dilma que, em viagem ao Catar, falou das negociações de venda dos canhões Astros II, fabricados pela Avibras que, nessa altura, já havia se tornado uma das grandes empresas exportadoras de produtos bélicos, inclusive para os EUA.
Controle das exportações bélicas
A fim de obrigar as indústrias bélicas brasileiras se conformarem com a posição da ONU, contra bombas de fragmentação, o deputado Rubens Bueno apresentou um projeto de lei, que acabou sendo arquivado pelo relator Carlos Zarattini, do PT/SP, cuja campanha eleitoral, curiosamente, teve apoio da Avibras, conta a revista Trendr.
Existe também a demora na ratificação do Tratado sobre Comércio de Armas, assinado pelo Brasil em 2013. O tratado regulamenta o comércio de armamentos ao nível internacional e acaba com os abusos armamentistas em matéria de fabricação e exportação brasileira.
O projeto de ratificação, PDC 298/2015, está na Comissão de Segurança e Combate ao Crime Organizado, tem como relator o deputado Lincoln Portela do PRB-MG. Na Comissão de Constituição e Justiça, onde deve ser igualmente discutido, ainda não foi designado relator.
Sob pressões diversas há quatro anos na Câmara, tem como principal opositor o deputado populista da extrema-direita Jair Bolsonaro, conta Alex Bessas.
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Rui Martins é jornalista.