A disciplina infraconstitucional do direito de resposta no direito brasileiro deve ser discutida no sentido da criação de condições para um debate público plural. Em duas recentes oportunidades, neste Observatório da Imprensa, alguns aspectos foram abordados (“O direito de réplica na ordem jurídica brasileira“, edição nº 758, e “Direito de resposta: propostas de parâmetros para a regulamentação“, edição 760). Neste artigo, pretende-se desenvolver alguns parâmetros mencionados, mas não desenvolvidos no artigo anteriormente publicado.
Nunca é demais salientar que o avanço mais significativo no sentido da promoção do acesso à informação seria a mudança do regime jurídico de modo a impedir a concentração da propriedade dos meios de comunicação social. Sem isso, ao se considerar o fato de o direito de resposta ser derivado de algo previamente veiculado, mesmo a criação de condições para o seu efetivo exercício não proporcionam a ampliação do debate público semelhante aos limites à concentração da propriedade do setor de comunicação social. As notícias não veiculadas, a muito criticada interdição do debate, não é enfrentada adequadamente por este direito derivado.
Neste texto, com consciência de suas limitações, são apresentadas propostas para eventual regulamentação do direito de resposta como forma de garantir a efetividade do direito do cidadão à informação. Vale dizer, mantém-se a questão anteriormente formulada: como ampliar o uso do direito de resposta?
Obrigação alternativa
No último artigo, abordou-se o uso do direito de resposta para a defesa de bens classificados como transindividuais e o problema do custo da resposta e da sua gratuidade. Nesta oportunidade, serão examinados três possibilidades de disciplina normativa mencionadas, mas não desenvolvidas: 1) obrigação alternativa ao direito de resposta; 2) o requisito de a resposta oferecer uma outra perspectiva de abordagem da matéria; 3) flexibilidade na apreciação da proporcionalidade entre resposta e agravo.
Com o propósito de atender ao interesse do requerente da resposta e ao interesse da coletividade na pluralidade de informações, revela-se salutar a possibilidade de obrigação alternativa ao direito de resposta. Para um programa jornalístico diário, por exemplo, no lugar de veicular a resposta a uma informação incorretamente divulgada, pode ser mais conveniente se comprometer a um programa inteiro, mais esclarecedor, com convidados, entrevistas externas e outros recursos técnicos, no qual se faça referência ao erro anterior e corrigir a informação (uma espécie de ajustamento de conduta).
Para o programa televisivo, fazer isso pode ser mais conveniente do que permitir que o público passe a duvidar da precisão de suas informações. Por outro lado, ao interessado na promoção dos esclarecimentos a respeito de determinado assunto, aceitar uma obrigação alternativa, sugerida pelo meio de comunicação social em sua defesa, pode ser mais vantajoso. Ao público uma obrigação alternativa também será positiva quando apresenta melhores condições de esclarecê-lo. Por isso, para a lei a ser elaborada, entende-se oportuna a inserção da possibilidade de obrigação alternativa ao direito de resposta sugerida pelo veículo de comunicação e aceita pelo requerente.
Outra perspectiva
A resposta, cumpre salientar, não é meio idôneo para a simples autopromoção do interessado em requerê-la. Mesmo adotando-se o ponto de vista de sua ampla possibilidade de utilização, não cabe ao meio de comunicação social ceder espaço para resposta que não corrija informação incorreta, não promova defesa contra acusação, não conteste ofensa ou juízo de valor difundido em informação jornalística.
Uma exigência a ser observada na apreciação dos pedidos é que a resposta seja potencialmente capaz de ampliar a compreensão do destinatário da mensagem jornalística acerca do assunto debatido com outra perspectiva de abordagem. A resposta é um direito derivado. Ela está vinculada a uma informação difundida por meio de comunicação social.
Por conseguinte, independentemente da existência de uma Lei de Imprensa, o julgamento do pedido depende da sua instrução com o texto da resposta a ser apreciado. De outro modo, nem o veículo de comunicação nem o magistrado terão condições de apreciar o requerimento criteriosamente. Ademais, sem o texto contendo a resposta nos autos, o magistrado não terá condições de aferir se o direito de terceiros não será violado pela divulgação da resposta em veículo de comunicação social.
Proporcionalidade entre a resposta e o agravo
No Brasil, o direito de resposta é expressamente previsto no art. 5º, V, da Constituição Federal de 1988: “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”.
A proporcionalidade entre a resposta e o agravo diz respeito à igualdade de armas (nesse sentido, leia-se Jónatas E. M. Machado). Quem exerce o direito de resposta deve ter condições de, por presunção, atingir os mesmos destinatários da informação jornalística que justificou o pedido de resposta.
Efetivamente, é improvável que os mesmos destinatários da informação tenham acesso à resposta. Na falta de critério melhor, a resposta deve se tornar pública no mesmo veículo no qual a informação foi originalmente divulgada, com mesmo tempo ou espaço, no mesmo contexto.
A despeito dessas afirmações, deve-se atentar para o fato de a proporcionalidade da resposta não ser o leito de Procusto. Na falta de uma Lei de Imprensa que estabeleça dimensões mínimas, o magistrado deve avaliar, por exemplo, se a gravidade da acusação não exige, por mais lacônico que seja o autor da resposta, dimensões maiores do que o texto original. Afinal, uma pequena acusação pode exigir longa explicação.
Intensificação do debate público
A resposta deve ser imediata, ela precisa ser atual. O debate público não pode ficar permanentemente atrelado a questões do passado. A realidade é dinâmica e a discussão de interesse público é igualmente cambiante. O exame da proporcionalidade entre a resposta e o agravo vincula-se, pois, à celeridade da resposta.
Caso a resposta seja divulgada muito tempo depois da informação jornalística que a ensejou, pode ser preciso contextualizar o seu destinatário. Nesse caso, o magistrado, para assegurar a efetividade da resposta, para garantir condições favoráveis à compreensão do público, pode deferir uma resposta que ultrapasse as dimensões da mensagem original.
Em uma futura norma a disciplinar o direito de resposta, a previsão explícita da possibilidade de obrigações alternativas sugeridas pelo veículo de comunicação e aceitas pelo requerente, a exigência de outra perspectiva da matéria apresentada em texto escrito e a flexibilidade no exame da proporcionalidade entre resposta e agravo feito pelo magistrado, salvo melhor juízo, representam avanços no sentido da intensificação do debate público com ganhos para o pluralismo social. Juntamente com as sugestões apresentadas nos textos anteriores, criam-se melhores condições para a efetividade do exercício deste direito.
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Pedro Augusto Lopes Sabino é professor de Direito Constitucional