Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Em defesa do ensino superior gratuito

É assustadora a forma como parte da imprensa do país tem conduzido o debate sobre a qualidade das universidades federais e estaduais. Impressiona ainda mais ver um verdadeiro lobby sendo orquestrado por vários setores da sociedade onde a meta é acabar com a gratuidade dos cursos de graduação e pós-graduação nessas instituições. O debate é complexo, mas a primeira questão a ser levantada é: a quem interessa o fim do ensino superior gratuito no Brasil?

A justificativa toma como ponto de partida a situação financeira em que se encontram várias instituições no país e usa como exemplo a Universidade de São Paulo (USP), conceituada internacionalmente. Entre as várias teorias levantadas pelos que se posicionam contra a universidade pública uma das principais é a de que a maior parte dos alunos teria condições financeiras de pagar uma mensalidade compatível com a qualidade do ensino. E é desse ponto onde começam os absurdos.

Em várias reportagens, colunas e artigos publicados nos jornais, essa conversa começa sempre do mesmo jeito – que as famílias ricas são as maiores beneficiadas. É verdade, sim, que muitos alunos matriculados nas federais, talvez até a maioria, poderiam pagar pelos estudos. Também é verdade que estudantes de baixa renda estão ocupando vagas nas faculdades particulares. Quando não têm a sorte de serem bancados por um Prouni, seguem endividados nos diversos programas de financiamento estudantil.

O exemplo das doações

Essa realidade é reflexo da baixa qualidade da escola pública de base, um fardo histórico que vem sendo enfrentado ano após ano por todos os municípios do país, mas ainda longe da equivalência com a qualidade do ensino particular. Ainda assim, com todas as disparidades, a universidade pública é uma das maiores conquistas do povo brasileiro. Acabar a gratuidade nas federais seria um retrocesso imenso, que só beneficiaria as elites – novamente – e quem ganha dinheiro com a educação superior.

Não há garantias para a suposta justiça social que seria promovida caso acabasse a gratuidade. “Quem pode, paga; quem não pode, recebe bolsa.” Perfeito, na teoria. Mas já que a ideia não parte do governo, será que seria assim mesmo? A moça de família pobre que hoje tem vaga em um curso de Medicina numa universidade federal teria mesmo acesso a uma bolsa de estudos?

Se as melhores universidades brasileiras não estão entre as cem mais conceituadas pelos rankings internacionais não é por baixa qualidade no ensino, pesquisa ou extensão. A verdade é que a maior parte dessas listas pontua bem instituições que oferecem aulas em inglês, o que não é nosso caso, ainda. Bom exemplo de fora? Que seja o das doações. Em muitos países, após a graduação os alunos costumam contribuir financeiramente, como forma de gratidão por sua formação profissional. E isso acontece até mesmo em instituições privadas. Se o costume pega por aqui, não seria má ideia.

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Felipe Gesteira é jornalista