Quais as chaves para entendermos o mundo em que vivemos? Na maior parte dos casos, parte desse entendimento surge do conhecimento derivado das notícias que recebemos dos jornais. Por conta disso, a investigação sobre as notícias e por que elas são como são constitui a grande questão com que se preocupam as teorias do jornalismo.
No mar de possibilidades sobre as notícias, gênese da atividade da imprensa, as teorias do jornalismo são uma trilha fértil para reflexões que dão margem a uma série de proposições ricas e estimulantes. No processo de formação de jornalistas, a sala de aula é um espaço em que se pode unir teoria e prática, levando o aluno a refletir sobre a sua própria prática e a experienciar a sua própria reflexão.
Um primeiro momento dessa atividade diz respeito a desafiar o estudante sobre o jornalismo e a sua função na vida das pessoas. E mais que isso: fazer o estudante pensar sobre a influência que a mídia e a informação têm, hoje em dia, na qualidade da cidadania.
Esse tipo de questão dá margem a discutir e reforçar o jornalismo como um braço vinculado ao interesse público. Daí emergem questões como a pauta, a reportagem e a redação da informação como inerentes a uma tomada de partido: o do cidadão.
Se o jornalismo toma partido, emergem outras questões: até que ponto e de que forma ele constitui um espelho ou uma construção da realidade? Se essas parecem questões de fácil resposta para jornalistas e professores da área, elas ainda tiram do sério e fazem muitos estudantes dos primeiros anos do curso parar para pensar. Embora muitos deles estejam o tempo todo imersos na produção de entrevistas e textos, nem sempre se dão conta da construção, dos processos e interesses que subjazem a notícia.
A prática do metajornalismo
Gatekeeper, Agendamento e Etnoconstrução – Reflexões e explicações para se saber porque as notícias são como são não faltam. Entretanto, o que as teorias do jornalismo terminam por comprovar é que o fazer jornalístico, embora em grande parte esteja nas mãos do jornalista, não fecha seu ciclo nele. Antes de tudo, essas teorias mostram que o jornalismo não é consenso.
O emaranhado de reflexões sobre a natureza da notícia termina por deixar claro que a gênese do jornalismo é a própria contradição. Especialmente nos tempos de hoje, de mutações no jornalismo, o trabalho da imprensa deixa de ser imputado a um modelo de jornalismo para ser produto de jornalismos, no plural.
Dessa forma, as teorias gestadas no século 20 sobre a comunicação e sobre a construção da informação jornalística, bem como teorias mais recentes que germinam entre autores estrangeiros e nacionais, podem servir de combustível para os novos jornalistas, para os jornalistas em formação.
Aprender conceitos como Gatewatching, Nova História e Fractais Biográficos pode render desafios curiosos na formação dos profissionais da imprensa. As teorias podem ser um alimento importante para estimular o estudante à prática do metajornalismo, seja em pingue-pongues ou em reportagens.
Novas descobertas
Além disso, em outras disciplinas ou momentos do curso, essa teorização pode ajudar a criar pautas com perguntas mais audaciosas para as fontes, incentivar a redação de reportagens com mais pertinência e até elaborar projetos de conclusão de curso, os TCC, mais seguros e mais propositivos.
É importante saber fazer reportagens a partir de uma boa pauta e com boa apuração, mas também pode ser desafiador repensar esses processos a partir das mutações que o jornalismo vive hoje; a partir da possibilidade do gatewatching em revisão ao gatekeeper, por exemplo.
Fora da faculdade, no mercado de trabalho, a conhecimento oriundo das teorias pode trazer novos ares para a construção de identidades profissionais. Além disso, poder pensar a profissão abre espaço para atuações jornalísticas menos conservadoras e para o desenvolvimento de atitudes empreendedoras dentro de organizações que existem no mercado ou mesmo em organizações que ainda sequer pensamos que possam existir.
Uma das poucas coisas na vida que nunca faz mal se for feita em excesso é embarcar no estudo daquilo que se gosta. E nessa viagem, que deve ser prazerosa, professores, estudantes e profissionais de jornalismo devem embarcar com uma certeza: toda viagem leva a novas descobertas. Nesse sentido, refletir sobre o próprio objeto de formação pode ser uma trilha para novos caminhos para cada um e para a própria profissão.
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Enio Moraes Júnior é professor universitário, jornalista e doutor em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA / USP), supervisor pedagógico e professor do curso de Jornalismo da ESPM e autor do livro Formação de Jornalistas: elementos para uma pedagogia de ensino do interesse público (Editora Annablume, 2013)