Quinta-feira, 25 de junho de 2009. Embora, à primeira vista, a tarde daquele dia esteja associada somente à repentina morte de Michael Jackson provocada por uma parada cardíaca, a data sagra-se como histórica para a Comunicação Social ao reafirmar o poderio da indústria cultural. Nem mesmo a morte, solitário momento reservado ao luto, parece ser poupada pela indústria cultural, que lança, sem hesitar, seus holofotes sobre a dor e à tristeza.
Sem solidarizar-se com o falecimento do Rei do Pop, uma considerável parcela das emissoras de televisão explora, à exaustão, a imagem do ícone da música para elevar seus índices de audiência e, consequentemente, engordar suas contas bancárias através de altas cifras obtidas pelo merchandising negociado, às pressas, pelos departamentos comerciais das empresas de comunicação.
A curiosidade sobre os últimos instantes de vida de Michael Jackson desencadeia uma avalanche de notícias que culmina com a saturação sobre as referências que calcaram o vertiginoso sucesso do mito pop.
Embora Thriller tenha sido lançado em 1982, o clip no qual o cantor dança em meio a zumbis atingiu, novamente, neste final de semana, ‘o topo das paradas’, marca alcançada pelo turbilhão de referências feitas ao vídeo que bombardearam matérias biográficas.
Herói cede espaço à celebridade
Imagens do ídolo na década de 1970, ainda negro e com seu penteado black power até sua vinda ao Brasil, quando caminhou pelas ruas do Pelourinho, em Salvador, mesclavam-se à transferência de seu corpo em uma aeronave do governo norte-americano para a realização de autópsia, uma vez que as causas de sua morte ainda não foram esclarecidas.
A ausência de solidariedade com a dor alheia torna-se ainda mais evidente com a frieza que a maioria dos jornalistas sustentou aquele off restringindo à narrativa a mera descrição da cena que foi transmitida, ao vivo, para milhares de lares.
A espetacularização da morte de Michael Jackson comprova a perpetuação de uma das principais leis da presente pós-modernidade ditada pela indústria cultural: o culto às celebridades, promovido, especialmente, pelas emissoras de televisão.
No século 21, o herói, personagem que ‘redime a sociedade de seus pecados, vive para os outros’, cede espaço à celebridade, figura que ‘vive somente para si, mas representa heróis para manter um fascínio sobre si’ (PENA, Felipe).
‘Elementos simbólicos mediados’
Como as celebridades não mantêm comportamentos norteados pelo interesse público, elas necessitam de subsídios para manter-se em voga. Ao restringir o universo a si mesmas, elas arquitetam estratégias para projetar sua intimidade através da TV, janela mágica presente em milhares de lares, tornando-se, assim, popstars. ‘A exposição da intimidade é uma das principais estratégias de sobrevivência das celebridades’ (PENA, Felipe).
Ao vislumbrar tal premissa, as emissoras de televisão reconhecem uma grande oportunidade para a expansão de suas receitas, uma vez que se comprova, através dos elevados índices de audiência, o interesse pelo privado em detrimento ao interesse público.
‘É como se tudo o que fosse relacionado às personalidades, principalmente o que é íntimo, provocasse interesse e tivesse que ser dado a ver’ (TRINDADE, Vanessa Costa).
A partir desta nova lógica ditada pela indústria cultural, as celebridades transformam-se em referência na adoção de hábitos, comportamentos e estilos de vida.
‘Os indivíduos constroem a noção de self baseados cada vez mais em elementos simbólicos mediados. Antes do desenvolvimento dos meios de comunicação, os materiais simbólicos eram adquiridos exclusivamente nos contextos de interação face a face. Depois, o processo de formação do self passa a ser cada vez mais orientado pelo acesso às formas de comunicação mediada’ (TRINDADE, Vanessa Costa).
‘O Rei não morreu’
A geração Anos 80, década, inclusive, relembrada em vários livros, foi altamente influenciada pelas tendências inauguradas por Michael Jackson em seus videoclipes veiculados pelos canais de televisão, como Thriller, Beat It, Billie Jean e Black or White, que se transformaram em referência ao público jovem.
Não só o sucesso e a morte do Rei do Pop rendem lucros à indústria cultural. Ainda não satisfeita com os exorbitantes lucros obtidos através da exposição da vida de Michael Jackson, o ícone pop, mesmo após sua morte física, assim como Elvis Presley, será veiculada pela indústria cultural a falsa idéia de que ‘o Rei não morreu’ para que seus incontáveis fãs permaneçam grudados em frente à telinha para assistir clipes, documentários, filmes ou programas que façam referência ao ídolo, bem como para adquirir, literalmente, a qualquer custo, objetos que reverenciem a imagem de Michael Jackson.
Bibliografia:
DEJAVITE, Fábia Angélica. O jornalismo de celebridade e a propagação do boato: uma questão ética. Disponível aqui [Consultado em junho de 2009]
LANA, Lígia Campos de Cerqueira. Celebridades e seus públicos. Disponível aqui [Consultado em junho de 2009]
PENA, Felipe. A vida é um show: celebridades e heróis no espetáculo da mídia. Disponível aqui [Consultado em junho de 2009]
TRINDADE, Vanessa Costa. ‘Eu aumento, mas não invento’: interesse público x interesse do público no TV Fama. Disponível aqui [Consultado em junho de 2009]
ZOVIN, Cristiane de Rossi. A força da televisão na construção do imaginário: o papel cultural das máquinas de imagens na vida das pessoas. Disponível aqui [Consultado em junho de 2009]
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Jornalista, blogueira, assessora de comunicação freelance e colunista do jornal Aqui, Pedro Leopoldo, MG