Todos os cidadãos estão sujeitos a três tipos de julgamento. O julgamento leigo do público, o julgamento jornalístico da imprensa e o julgamento jurídico do Poder Judiciário.
Quando julga, o público leigo raramente acerta. Além da parcialidade, o julgamento leigo é feito com base em fragmentos de informação e, na maioria das vezes, influenciado por preconceitos dos mais diversos matizes.
A imprensa tem um poder fantástico. Não só alimenta o público leigo para que ele possa julgar, mas também efetua seu próprio julgamento das personalidades que coloca em evidência. Mas a imprensa nem sempre age de forma isenta e eqüitativa. Além disso, os jornalistas padecem de um vício intelectual terrível que foi apontado com precisão por Pierre Bourdieu em seu livro Sobre a televisão:
‘Para os jornalistas, a leitura dos jornais é uma atividade indispensável e o clipping, um instrumento de trabalho para saber o que os outros disseram. Esse é um dos mecanismos pelos quais se gera a homogeneidade dos produtos propostos.’
Elementos específicos
Ainda segundo o autor citado, nas ‘…equipes de redação, passa-se uma parte considerável do tempo falando de outros jornais e, em particular, do que ‘eles fizeram e nós não fizemos’ (‘deixamos escapar isso!’) e que deveríamos ter feito – sem discussão – porque eles fizeram.’ Esta atitude faria com que os jornalistas fiquem submetidos a um verdadeiro ‘…fechamento mental.’
O problema apontado pelo sociólogo francês é grave. Quando a questão envolve conhecimentos de outras áreas (como o Direito, por exemplo), o julgamento jornalístico tende a cometer e reproduzir erros. Foi o que ocorreu no caso daquela escola infantil, em que os suspeitos se transformaram em criminosos quando na verdade eram inocentes.
O julgamento jurídico realizado pelo Poder Judiciário deve ser sempre técnico. Uma conduta só é considerada passível de punição se houver lei anterior que a defina como sendo criminosa. Para que alguém seja considerado responsável por um delito deve existir provas de que ele foi o mandante, autor ou co-autor do mesmo. Sua conduta deve ter sido culposa ou dolosa, pois nos casos de legítima defesa, cumprimento do dever legal e estado de necessidade não há crime. O autor do delito deve ter consciência da natureza nociva de sua conduta, ou seja, não pode ser nem menor nem deficiente ou doente mental. Cada crime tem elementos específicos e alguns só podem ser praticados por pessoas que reúnam condições pessoais específicas etc…
Com a palavra, o STF
As observações acima dão uma vaga idéia de como é complicado julgar alguém do ponto de vista jurídico. Mais que isto, de como o julgamento jurídico é qualitativamente diferente do leigo e do jornalístico.
A missão do Poder Judiciário não é nem agradar ao público, nem atender aos apelos da imprensa. Cabe ao STF julgar os ‘mensaleiros’ do ponto de vista jurídico. Aos juízes é vedado fazer um juízo de reprovação político dos réus (isto só ocorre nas ditaduras). Além disso, o julgamento leigo e jornalístico já ocorreu. As carreiras políticas de todos envolvidos em ‘mensalices’ foram afetadas sem que o Judiciário tivesse se pronunciado sobre a natureza criminal de suas condutas. Espero que o STF possa exercer sua missão com a devida isenção.
No mais, como qualquer cidadão, vou aguardar a condenação dos réus. Mas se a condenação não ocorrer, paciência… Sei que o meu julgamento pessoal das condutas dos ‘mensaleiros’ não é jurídico.
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Advogado, Osasco, SP