‘31/1/08
Colunas e ruínas
Com todo o respeito aos três cavalheiros barrigudos à mostra, a fotografia publicada ontem na pág. E2, em 14 cm x 11,5 cm, é um despropósito, não tem relevância alguma.
Na ampliação da coluna Mônica Bergamo (reparei que a jornalista está de férias), os leitores da Folha perderam quatro colunistas –que escreviam no pé da pág. E2 ou na contracapa. A página inteira ficou para a coluna.
O que parecia uma boa iniciativa (o aumento da coluna de notas, não a dispensa dos articulistas) agora suscita dúvidas: para que gastar papel com foto (e a nota que a acompanhou) como a mencionada?
Fotografia
A coluna Mônica Bergamo tem um projeto gráfico que privilegia grandes fotos. O problema é que não dá para querer ´encaixar` no projeto imagens jornalisticamente fracas, como a de ontem.
A foto de Daniella Cicarelli publicada hoje tem alguma coisa estranha. Essa impressão é recorrente em imagens recortadas, tirando o personagem do ambiente original e privando o leitor de conhecer o contexto em que houve o registro.
Não se trata apenas de rejeição estética minha a fotografias recortadas. É uma questão jornalística, de informação.
Pancadaria longe da periferia
Leitores avisam que o palco das lutas em Osasco não fica na periferia da cidade, ao contrário do que informam a primeira página e Cotidiano.
Os ´lados` da notícia
Ao recuperar a informação de ontem do Valor sobre a interrupção de compra de carne bovina brasileira pela União Européia, a Folha abordou vários aspectos.
Esqueceu de um, por mais que não se possa antecipar com exatidão o que vai acontecer: que impacto a medida pode ter para os consumidores brasileiros?
Sei bem do prejuízo para os produtores, os trabalhadores, as contas nacionais etc.
Acontece que um fato tem vários ´lados´. Ontem entrei no carro, e o taxista disse: ´Que beleza, hein!´.
Ele contou a novidade e explicou: como haverá menor exportação de carne, os preços devem baixar nos supermercados…
Notícia antiga
Título da Folha hoje na pág. A14: ´Jobim diz que submarino nuclear não sofrerá cortes´.
A mesma informação foi publicada segunda-feira no ´Globo´.
Ambiente 1
É legítima a edição em Ciência da cobertura sobre desmatamento na Amazônia.
Mas seu melhor lugar, como sugerem alguns leitores, é Brasil.
Há um componente político tão claro que a editoria que cobre política (Brasil) deveria noticiar os fatos e o confronto no governo, independentemente de quem tenha razão (Lula ou Marina Silva e Sergio Rezende).
Assim como Brasil deve mesmo editar o caso dos cartões de crédito do governo, e não Dinheiro.
Ambiente 2
O fogo queima a reserva do Taim, no Rio Grande do Sul, e a Folha não dá atenção ao estrago. Pena.
Crise da PM
É curioso que até pouco tempo atrás parcela expressiva do jornalismo batia palmas à política de segurança do governador Sérgio Cabral –e às ações pouco transparentes de setores da Polícia Militar e da Polícia Civil do Rio.
A Folha, que quase sempre manteve o espírito crítico salutar, faz bem em mostrar que a crise grave provocada por oficiais da PM não é o único dos problemas da gestão de Cabral na área.
Números em questão
Manchete de ontem da Folha: ´Cai o número de homicídios no país´.
A pesquisa que apresentou os dados foi classificada hoje pela colunista Alba Zaluar (pág. C8) no rol das ´pouco cuidadosas´.
Pesquisite
A Folha noticiou ontem com certo destaque: ´Elite brasileira confia mais na mídia do que no governo, afirma estudo` (pág. A8).
Quantos entrevistados houve? Meros 150…
Duplo sentido
Título de ontem na pág. C8: ´20 são pisoteados em troca de ingressos para o Carnaval´.
Batalhas perdidas
Desde a década de 1980, edição após edição, o Manual da Redação apela para que se evitem regionalismos, como ´carta` no sentido de habilitação para dirigir.
Ontem, na pág. D1, nota informou que o jogador de futebol Deco está sujeito a perder sua ´carta de motorista´.
Grande tirada
O título do dia, ótimo, na pág. A7: ´Senado fica sem luz, e Lobão Filho assume´.
29/1/08
É mesmo a Folha?
A não-publicação de ´outros lados` às duras declarações do crítico de arte Paulo Herkenhoff, o entrevistado na capa e na contracapa da Ilustrada, agride os mais caros princípios do Projeto Folha, condensados no Manual da Redação e consagrados na tradição recente do jornal.
Não interessa se são justas ou não suas opiniões, certamente legítimas.
As pessoas e instituições atacadas por ele têm o direito de se defender.
E é um direito dos leitores da Folha conhecer a defesa delas.
Correções atrasadas e pela metade
Há checagens de erros apontados pelo ombudsman e, principalmente, pelos leitores que exigem mais do que algumas horas.
Não podem, portanto, ser corrigidas, se for mesmo o caso de corrigir, no dia seguinte.
Há erros, porém, incontestáveis.
Exemplo 1: na crítica de ontem, citei texto em Esporte que informava incorretamente quem foi a tenista campeã do aberto da Austrália em 2007.
Em poucos segundos, é possível checar a informação correta nas edições do ano passado.
Hoje, contudo, não houve correção.
Exemplo 2: também na crítica de ontem, enumerei uma série de erros na edição dominical sobre a morte de João Goulart. Hoje só um deles foi corrigido.
Por que o jornal não corrigiu a informação de que Jango governou de 1961 a 64, se ele só assumiu a chefia de governo depois do plebiscito do começo de 1963?
A correção saiu pela metade (a rigor, nem metade). Quando for completada, se for, será com um atraso dispensável.
A Folha poderia corrigir seus erros com muito mais rapidez.
(Salvo mudança de plano, no primeiro domingo depois do Carnaval publicarei a estatística sobre as correções da Folha em 2007.)
Esqueceram de Huckabee
Abertura da chamada de primeira página ´Republicanos disputam voto de latinos nas primárias hoje´: ´John McCain, Mitt Romney e Rudolph Giuliani, os três primeiros colocados nas pesquisas entre os pré-candidatos republicanos à Presidência, utilizam as primárias de hoje, na Flórida, para cortejar o eleitorado latino´.
De acordo com quadro na pág. A10, Giuliani é o quarto colocado na pesquisa nacional entre os pretendentes republicanos.
Jornalismo pirandelliano 1 (Assim é se lhe parece)
Em dia de divulgação de números da economia, três olhares distintos.
Folha: ´Remessa de lucros atinge recorde e chega a US$ 21 bi´.
´Estado´: ´Investimento estrangeiro aumenta, apesar da crise´.
´Globo` (combinando as duas informações): ´Dinheiro externo é recorde mas crise já provoca fuga de capital´.
Jornalismo pirandelliano 2
Na Folha: ´Hoje com menor peso eleitoral, reduto da velha geração cubana vai de Giuliani´.
No ´Valor´: ´Eleição divide eleitorado de origem cubana na Flórida´.
No ´Estado´: ´Republicanos lutam pelo apoio de cubanos´.
No ´Globo´: ´Divisão entre cubanos e brasileiros´.
Todas as reportagens foram escritas por enviados especiais.
Jornalismo pirandelliano 3
Com base na mesma entrevista, três títulos.
Folha: ´União pode investigar caso Jango, diz Tarso´.
´Globo´: ´Tarso: não há provas de crime contra Jango´.
´Estado´: ´Tarso cobra algo concreto para apurar caso Jango´.
Rasgando a fantasia
Um leitor atento apontou outro problema no material do domingo sobre a morte de João Goulart.
O entrevistado, autoproclamado ex-agente de segurança da ditadura do Uruguai, não foi indagado sobre uma questão elementar: se ele trabalhava para o governo do seu país, e não para o brasileiro, qual foi a participação das autoridades uruguaias no alegado assassinato?
Os agentes do Uruguai recebiam ordens da ditadura brasileira? De Geisel e Fleury?
Quem deu a ordem?
Na Operação Condor, havia colaboração das ditaduras. Mas, como regra, uma não mandava nos funcionários da outra.
Jogando a toalha
E-mail de leitor hoje sobre o dito Painel do Leitor: ´Há dias em que a coluna mais parece o diário oficial do que uma seção da Folha. […] Isto desvirtua completamente a razão de ser da coluna. Afinal de contas, será que uma alma lúcida neste jornal poderia se perguntar POR QUE o painel foi criado? Qual a motivação? Qual a intenção?´.
Prioridades da Folha
Na cobertura do Carnaval, eis os títulos do alto da pág. C6: ´Escola leva mais de mil japoneses ao sambódromo´; ´No Rio, Porto da Pedra também homenageará a imigração nipônica´.
No pé da página: ´Promotoria nega pedido da Igreja para barrar distribuição da pílula do dia seguinte` (em Pernambuco).
Defendo que a Folha cubra com ambição jornalística os 100 anos da imigração japonesa.
Mas as reportagens de hoje sobre japoneses (ou seus descendentes) no samba poderiam ter saído ontem ou sair amanhã ou depois.
Hoje, ´brigou-se` com a notícia. A mais relevante sumiu na edição.
Fotojornalismo
O ´Estado` traduziu a reportagem dominical do ´New York Times` sobre a descoberta de um acervo perdido do fotógrafo Robert Capa (milhares de negativos).
No jornal americano e no brasileiro, houve chamada na primeira página e amplo espaço interno.
Fizeram muito bem.
A Folha fez pouco da novidade: noticiou-a em um pequeno texto de uma coluna.
Tradução 1
´Linha-fina` do quadro ´Embate republicano´, na pág. A10: ´McCain é considerado o mais ´liberal` dos conservadores´.
As aspas em torno de liberal nada esclarecem.
Sugiro a leitura do verbete ´liberal` na lista de tradução recém-elaborada pelo jornal.
Tradução 2
Um jornalista americano radicado no Brasil escreveu dizendo que o melhor a fazer em relação ao ´college` britânico é não traduzir.
Acrescento: quando possível, é bom explicar o que são essas instituições.
Duplo sentido
Chamada na pág. A4: ´Kátia Rebelo atribui crimes a mortos´.
Esse Banco Rural…
O título grafa ´Rebelo´. A reportagem na pág. A9, ´Rabello´.
Qual é a forma correta?
Forfait
Participo amanhã da reunião do júri do Prêmio Folha que decidirá os vencedores de 2007.
Por esse motivo, esta crítica não circulará.’