Na quarta-feira (5/11), depois da emocionante eleição nos EUA, ficou novamente evidente o binômio que preside a imprensa diária: atualidade + qualidade da informação. De nada adianta oferecer textos bem escritos, bem apurados, desligados da atualidade. O corolário também é válido: pouco ou nada servirá uma notícia de última hora sem um lastro mínimo de informações. No entanto, todos os veículos impressos são limitados por horários rígidos – se não sã impressos até uma determinada hora correm o risco de não chegar às mãos dos leitores.
No Brasil sabia-se de antemão que os resultados finais no Colégio Eleitoral americano seriam conhecidos de madrugada. Como de hábito, os grandes jornais organizaram-se de modo a oferecer resultados parciais em edições sucessivas, deixando o resultado final para o maior número possível de leitores.
A ‘corrida’ aparentemente foi ganha pelo Estado de S. Paulo, que conseguiu chegar aos assinantes e às bancas com a notícia do triunfo de Barack Obama. Mesmo o Globo (impresso no Rio) chegou a São Paulo com a vitória de Obama obtida com base nas pesquisas. A Folha de S.Paulo, com mais chances graças à tiragem maior, contentou-se em oferecer aos leitores uma manchete inconclusa sobre a maciça presença de eleitores. A manchete histórica ficou para o dia seguinte, quinta-feira (6).
O Valor Econômico, o mais completo no seu segmento, conscientemente abriu mão de concorrer com os gigantes: não publicou uma linha sequer sobre as eleições. Na realidade inseriu um comentário de duas linhas assinado por Fidel Castro (pág. A-15). Preferiu não publicar notícia alguma a oferecer uma informação incompleta.
O exemplo do Christian Science Monitor
A estratégia de Valor nos remete ao centenário jornal americano Christian Science Monitor, que acaba de anunciar o fim da sua edição impressa [ver, neste OI, ‘Jornal centenário quer sobreviver online‘]. Trata-se de um dos melhores jornais dos EUA, com visual primoroso, denso, bem escrito, com elevado padrão cultural e nenhum compromisso com a atualidade, tanto assim que era distribuído aos assinantes pelo correio. Desafiou ostensivamente o binômio vital: qualidade e atualidade.
O Christian Science Monitor merece ser examinado com mais atenção e menos pressa. Foi fundado por Mary Baker Eddy, a criadora da ‘Ciência Cristã’, em 1879, combinação de crença religiosa, auto-ajuda e medicina. Violentamente atacada pelo New York World de propriedade do ícone da imprensa Joseph Pulitzer, Baker Eddy resolveu fundar o seu próprio jornal. Por meio dele daria seqüência às doutrinas da cura pelo espírito sobre as quais escrevia ininterruptamente.
Contratou os melhores jornalistas para criar um jornal limpo, sem sensacionalismo, sem crimes, fixado na elevação espiritual dos leitores. Pretendia vencer as enfermidades e os males do mundo através da educação. Novidade em matéria jornalística, anomalia sob o ponto de vista empresarial, o CSM era editado por uma fundação não-lucrativa onde os princípios deveriam impor-se aos dividendos.
O jornal completará 100 anos no próximo dia 25 de novembro. Um milagre de sobrevivência. O único obtido pela estranha figura de Mary Baker Eddy.