“(…) A vítima da crise, daquela vez, era o jornalismo impresso afrontado pelas novas tecnologias e autodestruído por gestores insensíveis e incompetentes”, escreveu Sérgio Augusto no caderno “Sabático” do Estado de S. Paulo (28/1) a respeito do jornal ficcional que é o cenário do recém-lançado Os Imperfeccionistas, de Tom Rachman.
O livro combina, portanto, duas ameaças aos impressos. Uma é específica, decorrente de mudanças tecnológicas. Outra é genérica: erros de gestão empresarial.
Talvez os jornais impressos enfrentem o paradoxo de ser obrigados a gastar recursos para melhorar o processo de entrega e atendimento aos assinantes, feito basicamente em moldes do início do século 20, enquanto gastam muito mais ainda para se colocar à altura da distribuição digital. Isso se os seus gestores não forem “insensíveis e incompetentes”.
E pode haver outro paradoxo mais adiante: o aumento do número de problemas e reclamações em ambiente telemático. Pelo que se conhece da internet, bastará que cresça o número de edições para tabuletas, smartphones etc.
Um dia cancelado?
Discuti com uma atendente da Folha de S. Paulo a respeito da entrega de uma edição.
Não muito tempo atrás, nem era preciso discutir: as empresas mandavam entregar o exemplar ao assinante, ou seja, se responsabilizavam pela falha. E ainda pediam desculpa. Não tentavam suprimir um dia de notícias em troca de outro, no final do prazo da assinatura.
A atendente do Estado de S. Paulo relutou de início, mas logo foi adiante.
A distribuição dos dois jornais é feita simultaneamente por empresa em que são sócias: a São Paulo Distribuição e Logística (SPDL).
A atendente da Folha também disse, como a do Estado, que se tratava de “um problema com a franqueada”, mas sentenciou a vítima, eu, a ficar sem jornal.
Talvez porque eu tenha avisado que estava gravando a ligação, a moça fez uma consulta e voltou atrás, disse que a edição seria entregue. Sua fala, possivelmente parte de um roteiro, continha uma série de ressalvas, como se a responsabilidade pela falha não fosse da empresa que edita a Folha. E como se eu fosse um adversário, não um parceiro. Não houve “carteirada”: dei apenas o meu CPF.
Como tratas teus assinantes?
O episódio sinaliza que, embora atrelados ao mesmo processo de distribuição, prática racionalizadora, os jornais podem se diferenciar na maneira como tratam seus assinantes. Ou seja, existe margem de manobra para competição também nesse território, não apenas no das promoções, ou das aberrações publicitárias como a que estampa na segunda-feira (30/1) o Estado de S. Paulo numa falsa capa em inglês, anúncio de uma escola.
E haverá mais espaço ainda quando predominar a distribuição pela internet. Um dos atributos da Amazon ou da Livraria Cultura – que combinam internet com distribuição física – é tratar bem os seus clientes (“consumidores”, no jargão da modernidade líquida).
Em tempo: Exemplares dos dois jornais foram entregues separadamente, mas ambos por volta de meio-dia de segunda-feira (30/1).