Este trabalho apresenta uma análise de 15 reportagens do jornal online Correio, no período de 1 de fevereiro a 3 de fevereiro de 2012. O artigo em questão tem por objetivo fazer uma análise sobre a cobertura do veículo durante o processo de greve da Polícia Militar da Bahia. O trabalho é embasado na reportagem da revista Veja onlinede Leonardo Coutinho “Pânico em Salvador – a polícia promove a anarquia nas ruas e a bandidagem aproveita enquanto o governador viaja para fazer política”, e no artigo do pesquisador Antônio Oliveira intitulado “Uma Polícia Militar em uma sociedade democrática”. A metodologia empregada dividiu-se entre a análise das 15 reportagens do jornal online e nas leituras dos autores acima para o embasamento teórico. Espera-se com o artigo contribuir com novos estudos sobre a atuação dos meios de comunicação na cobertura da greve da Polícia Militar da Bahia.
Ação tipicamente preventiva
Foi feita uma análise de 15 reportagens do jornal onlineCorreio, de Salvador, Bahia, entre os dias 1º fevereiro e 3 de fevereiro de 2012 sobre a greve da Polícia Militar da Bahia. Na Bahia, assim como em todos os estados da República Federativa do Brasil, cabe ao poder executivo estadual fornecer a segurança pública para os cidadãos. A secretaria responsável, a de Segurança Pública da Bahia, comanda a Polícia Civil e Militar do estado. De acordo com o artigo 11 da Constituição do Estado da Bahia , promulgada em 5 de outubro de 1989: “compete ao Estado, além de todos os poderes que não lhe sejam vedados pela Constituição Federal: Manter a ordem jurídica democrática e a segurança pública” (2012).
Mas, esta mesma Constituição, na seção V, artigo 40, afirma que, “os servidores públicos civis e militares tem o direito de promover reunião ou manifestação pacífica, no local de trabalho, preservado o interesse publico” (idem).
A priori, o que se quer discutir neste artigo é o controle sobre o caráter militar de uma parte dessa instituição na Bahia. Entre os dias 01 e 03 de fevereiro de 2012, soteropolitanos e baianos viram uma parte da Policia Militar baiana entrar em greve e com isso provocar o caos na segurança pública do estado.
A instituição foi criada com o objetivo: aela compete a execução, com exclusividade, do policiamento ostensivo fardado com vistas à preservação da ordem pública. Sua ação é tipicamente preventiva, ou seja, atua no sentido de evitar que ocorra o delito. Para tanto, sua ostensividade caracteriza-se por ações de fiscalização de polícia sobre matéria de ordem pública, onde o policial é de imediato identificado, quer pela farda, armamento, equipamento ou viatura(ver aqui, 2012).
Incitação ao terror
Esta missão da Polícia Militar, no início do mês de fevereiro, foi completamente desrespeitada. A população baiana ficou a mercê de vandalismo, homicídios e pânicos devido à greve de parte da instituição. Antonio Oliveira, em seu artigo “Uma Polícia Militar em uma sociedade democrática”, traz uma passagem de Hannah Arendt sobre o papel opressor da policia.
Hannah Arendt já chamara atenção de que o instrumento mais adequando para oprimir os concidadãos é a policia e não o exercito, devido ao fato de este enxergar com dificuldade o cidadão de seu próprio país como ameaça à soberania do Estado, enquanto o policial é treinado para desenvolver este tipo de percepção (2005, p. 282).
A cobertura do jornal Correio, objeto de estudo deste artigo, trouxe os motivos para que a Polícia Militar entrasse em estado de greve. Na reportagem intitulada “Em assembleia, associação da Polícia Militar decreta greve por tempo indeterminado”, de 1º de fevereiro de 2012, afirma que os policiais reivindicam o cumprimento da lei 7.145 de 1997, com pagamento imediato da GAP V, incorporação da GAP V ao soldo, regulamentação do pagamento de auxílio acidente, periculosidade e insalubridade, cumprimento da lei da anistia e a criação do código de ética, além da criação de uma comissão para discutir um plano de carreira para a categoria.
O motivo de a categoria decretar greve é válido e está de acordo com a Constituição. Porém, a decretação desta greve pela Aspra, Associação de Policiais e Bombeiros do estado da Bahia, incitou o terror em todo o estado e com isso a polícia deixou de praticar a sua principal função que é de trazer ordem para a sociedade.
O pior ainda estava por vir
Com a falta de parte de policiamento o governo do estado recorreu ao governo federal que cedeu a Guarda Nacional e as Forças Armadas. O pesquisador Antonio Oliveira explica essa troca de policiamento.
Quando os militares assumem o poder de Estado e passam a perseguir os concidadãos que a eles se opõem, o exercito torna-se polícia, e não o contrário. A distinguível linha dividindo o nós e o eles, que orienta a prática do policial e a do militar é basicamente distinta na representação social desses dois profissionais gerenciam o uso da violência. Para o militar, o nós é, comumente a nação, com a qual ele se identifica e, o eles, o mundo exterior; para o policial, o nós é, sobretudo, o grupo profissional, e o eles, o resto da sociedade (idem).
No momento da decretação da greve, representantes do executivo estadual chegaram a dizer que não era para pânico. Na reportagem de Kivia Souza e Rafaele Rego, de 1º de fevereiro de 2012, a assessoria de comunicação da Polícia Militar informava que tudo estava normal na cidade.
A assessoria de comunicação da Policia Militar voltou a negar nesta quarta-feira (01/02), que os policiais militares baianos estejam em greve e informou que está com o policiamento normal na cidade “Esses policiais estão tentando causar pânico na população, mas até o momento não houve adesão de greve”. A assessoria informa ainda que todos os policiais se apresentaram ao serviço nesta quarta-feira. Não havendo motivo de pânico da população (Correio, 2012).
Mal sabia o governo do estado que o pior ainda estava por vir. Em 02 de fevereiro, dia da tradicional festa de Iemanjá, a criminalidade atingiu diversos bairros da cidade. Ônibus ficaram atravessados nas principais avenidas da capital o que fez bloquear o direito de ir e vir dos cidadãos. Bancos foram alvos da marginalidade além do alto índice de homicídios. A repórter Louise Lobato, na reportagem “Bancos são alvos de atentados durante a madrugada em Salvador”, de 3 de fevereiro de 2012, noticia:
Quatro agências do Banco do Brasil foram alvos de atentados durante a madrugada desta quinta-feira (2/02), segundo informações de um agente da Delegacia de Repressão a Furtos e Roubos (DRFR). As agencias do Largo do Tanque do Tamirineiro, Liberdade, Barros Reis e Porto Seco Pirajá foram alvejadas por diversos disparos de arma de fogo enquanto as unidades estavam fechadas (Correio, 2012).
Surpreendido com a greve
Outra reportagem intitulada“Lojas na Avenida Paulo VI também fecharam as portas mais cedo”retrata o clima de pânico do comércio soteropolitano causado pela greve.
Lojas na Avenida Paulo VI, na Pituba, também fecharam as portas mais cedo nesta quinta-feira (2). Uma farmácia que fica na via foi assaltada no início da tarde de hoje e reforço a segurança posteriormente. (…) Durante o período nesta tarde, os ônibus reduziram na avenida (Correio, 2012).
Em julho 2001, uma greve semelhante aconteceu em Salvador. O cenário é praticamente o mesmo. O governador do estado à época, Cesar Borges (PFL, atual Dem) e os senadores Paulo Souto (PFL) e Waldeck Ornelas (PFL), estavam em Ilhéus para o pré-lançamento de um programa agrícola do Governo Federal. Já Jaques Wagner, atual governador, estava em Cuba com a presidenta Dilma Roussef, para vistoriar obras de um porto que está sendo construído na ilha com recursos brasileiros. Em relação a 2001, depois do pré-lançamento é que o governador Cesar Borges resolveu começar a política de combate a criminalidade que já assolava a cidade. A reportagem de Luciano Coutinho da revista Veja intitulada “Pânico em Salvador”, de 18 de julho de 2001, ilustra esta passagem:
Foi só depois dessa cerimônia que o governador e sua trupe trataram da segurança dos baianos. De lá o grupo partiu para Brasília, para tornar oficial um pedido de ajuda ao Exército para a contenção da baderna e do pânico em Salvador. Àquela altura, já havia moradores da cidade pedindo socorro até em telefonemas para o escritório local de Veja (Correio, 2012).
Em 2012, o secretário de segurança pública Maurício Barbosa disse ter sido surpreendido com o movimento grevista. Em entrevista à TV Bahia e reportagem publicada no jornal Correio, o secretário explicou as medidas tomadas pelo governo.
A população alarmada
“Fomos surpreendidos por essa medida radical”, disse o secretário Maurício Barbosa na manhã desta sexta-feira (3) sobre a greve dos policiais militares em Salvador e em pelo menos seis municípios baianos. Em entrevista à TV Bahia, o secretário falou sobre a chegada da Força Nacional de Segurança. ‘Tentaremos definir a forma de atuação das tropas e das Forças Armadas fazendo um trabalho coordenado. Precisamos saber o limite de cada uma delas e como poderemos distribuir esses agentes, não só em Salvador, mas também no interior’ (Correio, 2012).
Em 2001, não bastando à greve dos policiais, outras classes como professores, fiscais de trânsito, funcionários da Justiça e motoristas de ônibus também estavam em greve o que alarmou ainda mais a população.
Mesmo com a greve de parte dos policiais, agora em 2012, nem os rodoviários, nem a Transalvador (fiscalização de trânsito) deixaram de funcionar.
Conclusão
Até sexta-feira (3/02) já haviam acontecido 29 mortes em Salvador devido à greve da Polícia Militar da Bahia. A análise do fato acontecido acabou por abalar toda uma sociedade desprevenidamente, ao contrário do governo, que mesmo dizendo ter sido surpreendido, é função do Executivo estadual promover segurança pública.
É inadmissível que em um país que se orgulha por ter uma democracia plena, que tenha uma economia consolidada não consiga discutir com suas instituições os direitos e deveres de cada um, deixando a sociedade a mercê da marginalidade e do terror. A terceira maior capital do Brasil parou para assistir, ouvir e ler nos noticiários a onda de terror que assolava a cidade. Tudo isso devido a falta de diálogo de governo com o próprio governo.
A Polícia Militar é dirigida pelo próprio governo do estado e cabe ao seu gestor saber o que acontece com os seus subordinados, suas deficiências, necessidades e prioridades. O que não pode é a população civil, que não é armada, ser alvo de policiais e da marginalidade.
Referências
Correio– www.correio24horas.com.br
COUTINHO, Luciano. “Pânico em Salvador – a polícia promove a anarquia nas ruas e a bandidagem aproveita enquanto o governador viaja para fazer política”.Veja. 18 de julho de 2001.
OLIVEIRA. Antonio. Uma Polícia Militar em uma sociedade democrática. Salvador: CRH, 2005
***
[Fagner Abreu é jornalista, Salvador, BA]