Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Exemplo corriqueiro

Em artigo para este Observatório comentei sobre a pouca responsabilidade da imprensa em relação à divulgação de informações de saúda para a população (‘Responsabilidade, uma raridade em divulgação em saúde‘). No domingo (9/11), colhemos mais um exemplo da pouca qualidade no mesmo portal Terra, seção de ‘Saúde‘:

OMS: medicina chinesa deve estar em plano de saúde

A Organização Mundial da Saúde (OMS) reivindicou que a medicina tradicional chinesa se integre nos planos nacionais de saúde, segundo informou hoje a agência oficial ‘Xinhua’.

No encerramento do congresso nacional de medicina tradicional chinesa realizado em Pequim, o organismo das Nações Unidas publicou uma declaração na qual pede seu estabelecimento como ‘um dos recursos para aumentar a disponibilidade e tornar mais acessível o serviço’.

‘O povo tem o direito e o dever de participar individual e coletivamente nas decisões de seu sistema de saúde, incluindo o acesso à medicina tradicional’, diz o documento.

No entanto, a OMS esclareceu que os Governos nacionais devem estabelecer mecanismos de licença e credenciamento destas práticas, como ‘medicina alternativa ou complementar’.

Atualmente, a medicina tradicional já está presente em vários sistemas nacionais, sobretudo entre os países em desenvolvimento, ‘embora pouco a pouco seu uso também vai crescendo entre os países mais ricos’, apontaram fontes da OMS.

Agência EFE

Papel da ONU

Como de hábito não existe referencia alguma de onde partiu tal informação a não ser genericamente ‘agência oficial `Xinhua´’. Deveria uma manifestação oficial da ONU ser emitida por seu órgão de comunicação da mesma, e assuntos de saúde deveriam ser tratados pela OMS. Mas o jornalista não se preocupa minimante com a veracidade e a coerência da informação. Por que a ONU estaria num Congresso Nacional de Medicina Tradicional Chinesa na China ou num Congresso de Médicos Espíritas no Brasil? É algo que foge completamente a sua função institucional.

Não cabe a ONU determinar o que deva ou não ser implementado nacionalmente dentro das diretrizes dos países na área da saúde, a não ser como órgão de acessória pela OMS.

‘O povo tem o direito e o dever de participar individual e coletivamente nas decisões de seu sistema de saúde, incluindo o acesso à medicina tradicional’, diz o documento. Que documento? Por que a ONU defenderia os interesses dos praticantes destas pseudociências contra as ações propostas pelo governo e não pedir a democratização total das decisões nacionais? Certamente não deve ser a ONU que está falando, mas quem quer que as decisões científicas sejam guiadas pela ‘democracia’ do gosto pessoas, iludidas pela propaganda dos praticantes, do que as evidências de resultados objetivos para serem implementadas por verbas escassas do governo. Antes a ONU deveria pedir o pluripartidarismo e a liberdade de imprensa, muito mais efetivos para a melhoria da saúde do que ações esotéricas e pensamento mágico.

Formas genéricas

Outro fato que passa despercebido pelo jornalista copiador de matéria e de pouca responsabilidade é que nem na China a Medicina Tradicional Chinesa possui credibilidade científica e médica. Não faz parte das especialidades médicas. Assim, não seria função da OMS, e muito menos da ONU, pedir que a mesma seja incluído entre as atividades financiadas pelo estado, como não seria aqui ela defender a introdução da iridologia, da pajelança, da medicina mediúnica no sistema de saúde pública. Foge dos objetivos destes órgãos este tipo de defesa do irracional, apesar de convencer ao jornalista que achou a matéria relevante sem maiores ponderações.

Cabe aos responsáveis pela administração da saúde do Estado baseado em evidências e prioridades nacionais o melhor emprego dos recursos em saúde guiados por orientação técnica e não por democracia ilusória de decidir se a terra é imóvel ou se a humanidade necessita de agulhadas para manter ou recuperar a sua saúde. Coisa que ilude o leigo, mas autoridades responsáveis devem ter responsabilidades pelo que incorporam nos gastos públicos.

‘Apontaram fontes da OMS.’ Novamente o jornalismo irresponsável que não determina as fontes reais. A comunidade científica, os cientistas, a ciência etc. – formas genéricas na hora de ‘chutar’ uma informação que quer ver respaldada, mas não passa da sua opinião ou a sua vontade de que seja verdade.

Foi a ONU ou foi um funcionário simpatizante e desqualificado para a função que se manifestou? Para isto a reserva?

******

Médico, Porto Alegre, RS