Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Fluxo de repertórios simbólicos

Na sociedade atual, o poder humano se maximizou com os sistemas de comunicação. O sujeito social na contemporaneidade está dependente desses sistemas para compreender a sociedade, e junto com seus semelhantes, re-elabora significações sobre sua realidade. Esses fluxos de significados, como destaca Mattelart (2000), são formas sistemáticas da comunicação e sua instantaneidade delineia as estruturas das organizações globais, combinando, segundo o autor, na “fluidez dos intercâmbios e fluxos imateriais transfronteiriços” (idem, p. 12.).

Tudo isso gera uma interrelação, desenvolvendo a circulação de sujeitos bem como de linguagens, culturas e identidades. Ou seja, a noção da realidade é potencializada pela comunicação social na vida cotidiana e não conhece limites, “pois ‘quanto maior for o organismo social, mais complexas e diversificadas serão as partes, mais indecifráveis e variados serão os jogos combinatórios da cultura e dos cruzamentos’” (idem, p. 64). No entanto, surgem as disparidades marcadas por níveis de vida variados, próximos fisicamente, mas que mantém uma profunda distância nos campos econômicos, sociais, políticos e culturais.

Um exemplo dessas disparidades é o acesso aos bens culturais (teatro, cinema, artes visuais, artes plásticas, belas artes, línguas estrangeras) para enfrentamento do contexto da globalização, ou mesmo contra a influência global em nível local por parte dos audiovisuais estrangeiros. Os bens culturais, nesse turno, tornam-se um mecanismo de separação econômica, dando características marginais a grupos e populações inteiras que não se adaptam à nova lógica de consumo e práticas culturais. Ou mesmo acabam por fortalecer a doutrinação das ideologias neoliberais e padronização cultural, predominando a lógica mercantil em detrimento das pluralidades econômicas.

A internet como fulcro das transformações atuais

Uma das características dessa globalização financeira a que se refere Mattelart (2000) é a divulgação rápida de informações: “decomposição/recomposição das identidades sociais e culturais” (idem, p. 160). Um dos meios mais abrangentes de comunicação é a internet que com suas linguagens apresenta pressupostos que, naturalmente, é um modelo eficiente de informação.

A internet já se transformou num veículo comunicacional com uma linguagem acessível à maior parte dos hiperleitores. Desse modo, há uma exploração de modelos de vida e padrões sociais, os quais são transferidos para o contexto local e divulgados como uma linguagem familiar e acessíveis.

Assim sendo, as mensagens veiculadas nos sites são destinadas a todo tipo de público. Diante desse excesso de meios e de informações, cada vez mais o sujeito social tem-se criando mecanismos para suprir suas necessidades e se comunicar, interagir com o mundo e ampliar os seus conhecimentos. Cada tipo de linguagem tem e apresenta a sua natureza, manifestando-se por diferentes tipos de elementos linguísticos e, através deles, os extralinguísticos, apontando suas características e especificidades.

O abandono das linguagens técnicas tem constituído, desse modo, um conjunto homogêneo da cultura, uma espécie de “onda” de pensamento que neutraliza quaisquer que sejam os pensamentos diferentes ou plurais dos consensos econômicos. No jornalismo isso é bem evidente nas produções da grande mídia no Brasil atual. Mesmo com ampliação horizontal dos acessos de repertório simbólico, vem-se utilizando cada sentidos que geram informações cada vez mais gerais e menos específicos (descontextualização, preconceito e desinformação). O repertório simbólico é circunscrito a um conjunto limitado do espaço ou e se desenvolve para a construção de identidades e narrativas identitárias cada vez mais superficiais e planas.

As redes sociais como limites do mundo

Essa circunstância dos repertórios simbólicos parece restrito ao universo ainda mais emblemático: as redes sociais, cuja produção simbólica se faz principalmente em um processo de terceirização. Reproduzem-se de sites ou plataformas originais. No caso do jornalismo brasileiro, tem-se algumas exceções, como Mídia Ninja, Jornalistas Livres e outros coletivos e plataformas colaborativas que acabam por produzir um conteúdo original diretamente no Facebook, por exemplo.

O grande público, por sua vez, reproduz ou compartilha muitos dos bens simbólicos já reproduzidos e compartilhados. Igualam valores e formas, conteúdos e estéticas. De uma maneira a nivelar por baixo a reprodução de uma reportagem da BBC ou do El País com um boato de um blog obscuro hospedado em provedores obscuros, sem respaldo ou reconhecimento com padrões técnicos responsáveis.

As redes sociais acabam se tornando em si mesmas retroalimentadoras. Em outros casos, para veículos tradicionais das velhas mídias oligárquicas, elas são fornecedoras de pauta e conteúdo informacional. Uma frase, uma informação, a ser checada ou não, são reproduzidas pelos jornalões de uma maneira corroborar com a decadência d imprensa atual. Em outras palavras, as plataformas online retroalimentam os repertórios simbólicos do sistema de comunicação. Cada vez mais esse círculo se faz cotidiano nas línguas, nas formas e nas técnicas de produção de bens simbólicos e informacionais (livro, artes visuais e música).

Além disso, as indústrias culturais se manifestam e se expressam por meio das redes sociais, antecipam movimentos de mercado, pautam seus interlocutores e consumidores culturais. No cinema por exemplo, os lançamentos são antecipados com pequenos vídeos nas redes sociais e cria-se um clima para contextualizar a produção. As linguagens se adequam ao universo das redes sociais, podendo, inclusive, modificar as obras produzidas, dependendo do contexto veiculado das informações.

Voltando ao que foi posto no início: as produções culturais, incluindo a comunicação, cada vez mais faz exposta a uma lógica mercantil internacional cuja linguagem se adequa ao repertório simbólico restrito, reelabora a realidade, desconstrói e reconstrói narrativas identitárias.

Referência bibliográfica

MATTELART, Armand. A globalização da comunicação. Bauru-SP: Edusc, 2000.

***

Moisés dos Santos Viana é jornalista e professor da UNEB