É patético verificar como se portam alguns veículos de comunicação de renome nacional diante da aprovação em primeiro turno no Senado da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) referente à retomada da obrigatoriedade do diploma universitário para o exercício da profissão de jornalista.
A votação ocorreu hoje (30/11) e teve o placar de 65 a favor e sete contra. Numericamente, um contraste que, contudo, por regimento, precisa passar por mais um turno no Senado e dois na Câmara dos Deputados, conforme se observa no endereço http://www.senado.gov.br/noticias/senado-aprova-em-primeiro-turno-pec-que-exige-diploma-a-jornalista.aspx.
Como era de se esperar, veículos de renome nacional editorializaram a notícia. Deram peso igual aos dois lados, destacaram a versão de que a mesa diretora do Senado desrespeitou acordo entre bancadas e ressaltaram a hipótese de que o Supremo Tribunal Federal (STF) impedirá a restituição do diploma mesmo que a PEC passe também pela apreciação da Câmara. Matéria veiculada pelo portal G1 (Globo) trouxe quatro “falas” a respeito da votação, sendo duas a favor (Inácio Arruda-PCdoB-CE e Humberto Costa-PT-PE) e duas contra (Aloysio Nunes-PSDB-SP e Fernando Collor-PTB-AL), dando a entender que o placar foi acirrado. Os defensores da PEC ressaltaram que a exigência de diploma tem a ver com a competência técnica e questão trabalhista e que não proíbe colaborações opinativas. Os contrários ressaltaram que condicionar a prática do jornalismo ao término de ensino superior representa afronta à liberdade de expressão.
65 a 7
Outras duas pessoas ouvidas pelo meio midiático foram o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) e o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP). O primeiro criticou o segundo apontando que a votação da matéria precisava de uma discussão prévia entre colégios de líderes. Sarney disse que o assunto está em debate há mais de um mês e que a presidência tem a prerrogativa de “fazer a agenda”. Confira o texto aqui.
O jornal O Estado de S. Paulo agiu bem pior. Conseguiu ouvir três (dos sete) senadores contrários à aprovação da retomada do diploma para o exercício do jornalismo e só um (dos 65) a favor. Calheiros, Demóstenes Torres (DEM-GO) e Nunes foram as vedetes da matéria “informativa”. O único que despontou a favor do diploma no texto, Magno Malta (PR-ES), ainda teve a posição meticulosamente minimizada por mencionar a filha, estudante de Jornalismo, em seu discurso. Além disso, o jornal acolheu a ideia de que Sarney “deu um golpe”, pondo o assunto em votação em desrespeito a acordo anterior com líderes partidários. O veículo também reforçou a versão de que, ainda que Senado e Câmara aprovem em dois turnos a PEC, a mesma será derrubada pelo STF. Veja aqui o texto do jornal.
O impresso Folha de S.Paulo expôs que a “PEC dividiu senadores”, como se 65 a 7 representasse um placar 50% a 50%. E mencionou seis parlamentares, três a favor e três contra, novamente dando a errônea impressão de que a votação foi acirrada. O autor da proposta, Antônio Carlos Valadares (PSB-SE), Malta e Wellington Dias (PT-PI) apareceram como defensores do diploma. Nunes, Torres e Collor foram colocados do lado contrário.
Contra o marco regulatório
O “temor” de que o Supremo derrube um possível resultado favorável teve destaque na matéria do jornal, assim como o de que a exigência do diploma contribua para uma espécie de “controle dos meios de comunicação”. Leia o texto aqui. Portanto, é inocência achar que esse assunto será tratado de modo isento, imparcial, estritamente informativo pelos veículos midiáticos, sobretudo os de maior porte. O conteúdo será ideologizado, editorializado, como se pôde perceber, conforme se expôs acima.
Isso significa que os que são a favor da restituição da obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo devem expor tal posicionamento abertamente e apontar a deturpação do noticiário. E ainda tem gente expressiva no meio jornalístico que se posiciona contra um marco regulatório nas comunicações alegando que vivemos hoje a mais pura e plena democracia dentro dos veículos midiáticos.
Sigamos em frente, desconstruindo discursos.
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[Gibran Lachowski é jornalista e professor, Rondonópolis, MT]