Pela primeira vez em 45 anos, a Universidade Federal Fluminense (30 mil alunos e 2,3 mil professores) concede o título de emérito a um professor de Jornalismo. O jornalista Antonio Theodoro de Magalhães Barros, que completa 70 anos em julho, receberá a homenagem na quarta-feira (15/6), às 19h, em reunião extraordinária do Conselho Universitário, no Teatro da UFF, em Niterói.
Ex-diretor da Última Hora do antigo estado do Rio de Janeiro, Theodoro Barros lecionou durante 30 anos no curso de Comunicação Social da UFF e aposentou-se em 2003 como professor-titular. Antes de ingressar no magistério superior, teve passagens como repórter, redator e editor pelo Diário Carioca, Correio da Manhã, O Jornal, O Globo e revista Manchete. Fora da redação, trabalhou como chefe da Divisão de Promoções e Publicidade e assessor especial da presidência da Telerj.
Pós-Graduado em Ciências Políticas, Econômicas e Sociais pelo Instituto de Altos Estudos da América Latina (Universidade Paris III) e livre-docente em Jornalismo pela Universidade Federal Fluminense, é também bacharel em Administração pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas.
Na UFF, Antonio Theodoro fez parte da equipe de professores que ajudaram a formar as primeiras turmas de Jornalismo – ao lado de Muniz Sodré, Nilson Lage, Érika Werneck e Rosental Calmon Alves, entre outros. Lecionou as disciplinas Redação e Edição, Administração de Empresa Jornalística, Jornalismo Internacional e Jornalismo Político. Dirigiu o Departamento de Comunicação Social e fez parte da Comissão de Especialistas em Comunicação Social da Secretaria de Ensino Superior (Sesu) do Ministério da Educação.
Quatro fases
Numa entrevista ainda inédita, feita para um zine Caroço, produzido por estudantes de Jornalismo da UFF, Theodoro abriu o verbo, mostrando por que sua ironia e bom humor conquistaram a simpatia dos alunos nesses 30 anos de magistério superior.
Carioca de nascimento, radicado em Niterói desde os 7 anos de idade, o nome Antonio revela a ascendência portuguesa. Seu pai era representante comercial e a mãe, dona-de-casa. Quando jovem, sonhava em se tornar arquiteto, mas aos 18 anos ingressou na Marinha Mercante, viajando pelo mundo afora durante quatro anos.
‘Sempre gostei de escrever’, diz. ‘O escrever tem duas raízes. Praticar muito, escrevendo sempre, e, a principal, que é ler. E eu li muito. Inclusive, nesse período da Marinha, uma coisa foi muito positiva: tive tempo pra ler. Dos clássicos aos grandes autores nacionais e estrangeiros.’
Theodoro gosta de citar a experiência da viagem, como aspirante, no navio-escola. Guanabara, da Marinha de Guerra: ‘Como futuros oficiais, éramos obrigados a bater ferrugem, raspar o chão com lona e areia. O conceito básico era: a gente não pode mandar ninguém fazer nada se não sabe fazer. Esse é também o meu conceito em jornal e como professor’.
‘Fui jogado no jornalismo em 1959 pelo Nelson [Pereira dos Santos], meu amigo de Icaraí, que era copidesque do Diário Carioca‘, lembra. ‘O jornal não pagava, mas eu rapidamente fui promovido a um monte de coisa. Depois fui para a Última Hora. Nessa época, havia no Rio 23 jornais. Era muito fácil ir de um para o outro. Só da UH fui cinco vezes. Do Diário fui duas, do Correio da Manhã, duas, além do Globo e da Manchete.’
Junto com Maurício Azêdo, atual presidente da ABI, Theodoro foi trabalhar, no início dos anos 1960, na sucursal do Diário Carioca, em Niterói, acumulando com a UH, onde era repórter. ‘O Samuel me chamou: ‘Você tá no DC ainda? Então larga, que nós vamos lançar a edição de UH do estado do Rio’. Como editor e diretor-responsável da UH fluminense fizemos um jornal popular mas principalmente político, apoiando as reformas pretendidas pelo governo João Goulart. O jornal também cobriu fatos dramáticos como a morte do Roberto Silveira [então governador do estado do Rio, morto em acidente de helicóptero] e o incêndio do Gran Circo Americano, com mais de 300 mortos’, conta Theodoro.
O golpe militar de 1964 acabou com a Rede UH, então com 11 edições em sete estados e cerca de 500 mil exemplares diários. Juntamente com oito edições regionais, a UH fluminense foi proibida de circular. Sobraram apenas a UH Rio e a UH São Paulo. ‘Restou-me ir para o Correio da Manhã, como copidesque, então batizado ironicamente de ‘os derrotados de abril’, por abrigar jornalistas perseguidos pelo regime militar’, recorda o professor aposentado da UFF.
Uma bolsa de estudos concedida pelo governo francês, para fazer pós-graduação em Ciências Políticas na Universidade de Paris, levou Theodoro para aquele país no final de 1964. No início do ano seguinte, ele reencontrou em Paris Samuel Wainer, que trocara seu exílio no Chile pela França.
‘Como minha bolsa era de apenas 500 dólares, aceitei traduzir e adaptar matérias do jornal Le Monde e da revista L’Express para serem publicadas na coluna Europa Moderna, que aproveitava as matérias originais francesas, cedidas a UH por acordo obtido por Samuel. Na verdade, a coluna era um balão de ensaio para uma futura publicação, que seria impressa na França e circularia no Brasil. Após sondagens feitas no Rio por Moacir Werneck de Castro, ficou claro que os militares não permitiriam tal projeto. Continuei fazendo a coluna, mais tarde transformada em uma página inteira, dentro da editoria internacional de UH, quando regressei ao Brasil no ano seguinte. Graças ao material do Monde e da Express, fizemos a melhor cobertura brasileira da revolta estudantil iniciada em maio de 1968, em Paris, e que nos meses seguintes alastrou-se por praticamente todo o mundo, inclusive em nosso país.’
Outra cobertura internacional de que Theodoro Barros se orgulha é a da conquista da Lua. A partir da viagem de ida e volta à Lua pela Apolo 8, a UH passou a editar também uma página batizada de Jornal da Lua, que noticiava tudo sobre as expedições seguintes.
‘Na ida da Apolo 11, que levou os astronautas [pela primeira vez] à superfície da Lua, em julho de 1969, planejamos tudo com antecedência: decidimos que uma única edição extra não bastaria, pois estaria superada rapidamente. Fizemos quatro edições, narrando as várias etapas da conquista do satélite, que complementavam o título ‘O Homem está na Lua. A Terra está em festa’ e eram valorizadas com manchetes curtas e de impacto como ‘Andaram’ (1ª extra), ‘Lua Conquistada’ (2ª), ‘Pularam e dançaram’ (3ª) e ‘Eles estão Voltando’ (4ª). Na última das quatro extras ainda tripudiamos sobre os concorrentes, publicando em rodapé com oito colunas as reproduções das capas das edições com o título ‘As quatro fases lunares de UH’’.
Na ativa
As pressões políticas e também financeiras sobre a Última Hora obrigaram Samuel Wainer a vender o título do jornal. Primeiro foi a UH São Paulo, negociada com o grupo Folha da Manhã, e, em 1971, a UH Rio, vendida para o grupo de empreiteiros que arrendara o Correio da Manhã.
‘Fui trabalhar então na Internacional do Globo e, paralelamente, como administrador na Telerj, então ainda Companhia Telefônica Brasileira (CTB). A pedido de Nilson Lage, passei para o copidesque. Mas a censura era brava. Não podíamos publicar quase nada. Joguei, então, a toalha: pedi demissão. Para piorar, sofri um acidente de carro que me deixou afastado da Telerj por cerca de um ano. Já estava quase desesperado quando o mesmo Nilson Lage, que era professor da UFF, convidou-me para ser contratado temporariamente para dar aula.’
Aceito o convite, em pouco tempo Theodoro descobriu sua paixão pelo magistério. ‘Fiz os concursos públicos e me doutorei com uma tese, mostrando como as grandes empresas jornalísticas eram as que tinham sabido organizar-se administrativamente. Para me tornar professor-titular, fiz outra tese, mostrando como a Última Hora renovou a imprensa brasileira. Voltei à França, como bolsista do MEC, para fazer pós-doutorado no Instituto de Imprensa da Universidade de Paris, em 1979-80, além de pesquisas sobre as novas tecnologias da informação.’
Hoje, aposentado, Theodoro ainda orienta monografias de conclusão de curso, participando de bancas examinadoras e fazendo palestras e conferências em seminários e congressos promovidos por diversas universidades da rede pública e particular.
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Realizaram a entrevista para o Caroço, editado por alunos do IACS, os estudantes – hoje jornalistas – Andressa Camargo, Cláudia Lamego, Gustavo Monteiro, Luciana Gondim, Monique Oliveira e Olívia Bandeira de Melo.
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Professor-adjunto do curso de Jornalismo da UFF e ex-aluno de Theodoro de Barros