Arrasta-se desde 2007 a discussão na Câmara dos Deputados em torno de um projeto de lei, conhecido como PL 29, destinado a regulamentar o funcionamento da TV por assinatura no Brasil. Um setor que é, ao mesmo tempo, oligopolista e campeão de reclamações nos serviços de defesa do consumidor. Além de cobrar tarifas elevadas por seus serviços, muito superiores às praticadas em outros países.
As reclamações têm fundamento. As operadoras desse sistema, além da tarifa mensal, obtêm receita de publicidade e do aluguel de espaço para canais de vendas e religiosos. Ou seja, o consumidor compra um produto televisivo e é obrigado a assistir o que não lhe interessa. Na verdade ele paga duas vezes: a assinatura e o percentual destinado à propaganda embutido nos produtos que consome e que são anunciados por esses canais. Há algo errado aí.
Ao plenário
A TV por assinatura chega aos domicílios basicamente por três caminhos: através do cabo que detêm 61% do mercado e onde o domínio é da Net; via satélite com 34%, reduto da Sky; e por microondas com 5%. Com isso, as operadoras impõem regras e preços a seu critério.
No projeto de lei apresentado à Câmara, o propósito inicial era o de regulamentar a entrada das empresas de telefonia no setor. Para evitar a ocupação total das grades de programação por filmes e programas estrangeiros, surgiu a proposta do estabelecimento de cotas destinadas a garantir espaço à produção nacional. Foi o que bastou para despertar a ira dos radiodifusores. Eles não admitem nenhuma limitação social ao seu negócio. E, a partir daí, a tramitação do PL-29 empacou.
Segundo a revista TeleTime, para ajudar a esvaziar o projeto, ‘a Sky teria procurado a bancada evangélica da Câmara dos Deputados, uma das de maior peso nas negociações parlamentares, e ponderado que, se aprovado o regime de cotas previsto no PL 29, os canais religiosos corriam o risco de ser retirados de sua programação’.
A ameaça pode fazer com que o projeto seja remetido para o plenário, ao invés de terminar na Comissão, como estava previsto. E lá, diante de tanta celeuma, dificilmente seria aprovado.
Sem regulação
Na verdade, esse caso é apenas uma pequena amostra das dificuldades em se legislar sobre a radiodifusão no Brasil. E serve para encobrir uma questão que é escamoteada há muito mais tempo: a elaboração de uma nova lei geral para o setor no país. Promulgada em 1962, a lei é do tempo da TV em preto e branco, de uma época em que o videotape era uma grande novidade – permitindo, por exemplo, ao humorista Chico Anísio dialogar com ele mesmo, no ar, para deslumbramento da platéia. Hoje, quase 50 anos depois, com a TV digital já implantada, a lei permanece a mesma.
A consequência é que vivemos a política do vale-tudo. E nesse esporte ganham os mais fortes – no caso, as grandes empresas de rádio e de televisão.
Para não mexer no geral, trata-se do particular. Como nesse caso da TV por assinatura. Enquanto esse serviço atinge menos de 8 milhões de domicílios, a TV aberta cobre todo o país mas escapa de qualquer regulação. Uma legislação que coíba os abusos da TV fechada será sempre bem-vinda, mas o ideal é que ela seja parte de um todo muito maior. De uma lei que ponha a TV brasileira nos eixos.
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Sociólogo e jornalista, professor de Jornalismo da ECA-USP, autor, entre outros, de A TV sob controle – A resposta da sociedade ao poder da televisão (Summus Editorial)