Ensinar literatura no ensino médio e nos pré-vestibulares é seguramente mister dos mais difíceis. Além da caracterização e contextualização dos estilos, o profissional se defronta com a necessidade de analisar obras literárias previamente indicadas. Não poucas vezes convivem nas salas alunos que prestarão vestibulares diferentes, e os livros indicados não coincidem. Uma breve pesquisa na Internet mostra quão dissintonizadas, sob esse aspecto, são as universidades brasileiras.
Não seria difícil às instituições um intercâmbio que possibilitasse uma uniformidade das obras escolhidas, o que certamente favoreceria professores e alunos. Não bastasse a disparidade aludida, ocorre também que os programas não têm vida longa, pois, à conta da necessidade de formular novas provas, as universidades os alteram constantemente. O resultado é que o professor de Literatura tem sempre de renovar o material didático. Não se defende a manutenção de um programa indefinidamente, mas a sua permanência por alguns anos, minimizando o ônus pedagógico dos profissionais envolvidos.
É sabido que o brasileiro lê pouco, inclusive os que têm formação superior. Cabe indagar, portanto, se essa metodologia de indicação de obras tem contribuído significativamente para a formação do leitor de literatura. Há pesquisas nesse sentido?
O Exame Nacional de Ensino Médio, que também faculta ingresso nas universidades, adota procedimento diferenciado: não faz indicação de livros. O que teria levado os técnicos do governo a esse procedimento? Seria a ineficácia do procedimento convencional adotado pelas instituições federais de ensino superior?
Eloqüente recado
O governo tem fornecido livros didáticos de literatura ao ensino médio. Tais compêndios, por melhores que sejam, estão sempre em dissintonia com os programas das universidades públicas, porque não há como atendê-los, em razão da disparidade da indicação de livros.
Não parece um despropósito imaginar que, se houvesse uma programação comum no país inteiro, programação essa mantida por certo tempo, o próprio governo poderia exigir das editoras que submetem seus trabalhos didáticos à sua apreciação, que os mesmos enfocassem minuciosamente os livros do programa oficial.
É também indiscutível que a leitura dirigida represente profunda ingerência na atividade docente. A predeterminação bibliográfica não respeita a autonomia escolar e não leva em conta as opções de alunos e professores. Nesse sentido, o Enem – ao preterir qualquer indicação – parece ter deixado eloqüente recado de que o importante é ler muito e sempre, mas com extrema liberdade.
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Licenciado e pós-graduado em Letras, professor de Língua Portuguesa, autor de Português; teoria e prática (Ed. Ática)