A abertura total do mercado de televisão paga para as operadoras de telefonia, o fim das restrições ao capital estrangeiro e a unificação das regras para todas as modalidades de serviços de TV por assinatura são alguns dos pontos importantes da nova lei para o setor aprovada pelo Congresso e que agora aguarda sanção da presidente Dilma Rousseff. São mudanças que, por estimularem a competição no setor, podem resultar em mais opções, melhores serviços e preços mais baixos para os usuários.
Estas são as novidades mais positivas da nova legislação para a TV paga, resultante da aprovação do Projeto de Lei complementar n.º 116, que, por seu caráter polêmico, tramitou durante quatro anos no Congresso. Há outras que, por representarem risco de reintrodução da censura prévia e de aumento da ingerência governamental na programação das emissoras, poderão ser contestadas na Justiça – parlamentares da oposição já anunciam que farão isso. Sejam ou não derrubados pelo Judiciário, esses pontos, e especialmente suas consequências práticas, precisarão ser observados com atenção pela sociedade.
A lei amplia o poder regulador – e, teme-se, controlador – da Agência Nacional do Cinema (Ancine) sobre a programação das emissoras e sobre o conteúdo dos programas. Além disso, impõe um sistema de cotas para proteger a produção nacional. Desse modo, a Ancine “ficará com a faca e o queijo na mão para decidir o que o consumidor vai assistir”, advertiu o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP).
“Preço e qualidade”
O Brasil dispõe de três modalidades de TV por assinatura – a cabo, por satélite (DTH, da sigla em inglês Direct-to-Home) e por micro-ondas (MMDS, de Microwave Multipoint Distribution Services) –, cada uma com regras próprias. As empresas telefônicas já podiam oferecer serviços por satélite ou por micro-ondas, mas estavam impedidas de usar cabo.
O congelamento das regras para a TV a cabo praticamente limitou a expansão desse serviço, que hoje atende apenas 262 dos 5.564 municípios brasileiros. Como a demanda por serviços de TV por assinatura não parou de crescer, a lacuna foi preenchida pela TV por satélite, cujo número de assinantes superou o de TV a cabo em abril deste ano. Mesmo assim, a TV paga atende hoje apenas 36,6 milhões de pessoas, ou menos de 20% da população brasileira, de acordo com dados de junho da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), o que dá ideia do imenso potencial de crescimento do setor.
A entrada das telefônicas no serviço de TV a cabo ampliará muito a área que poderá ser atendida rapidamente com esse serviço, que será oferecido com outros dois – o de telefonia fixa e o de internet de alta velocidade, o que atende ao interesse do governo em ampliar rapidamente o alcance do Plano Nacional de Banda Larga. “Com certeza haverá disputas por clientes, e isso reverterá em preço e qualidade”, prevê o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo. A Associação Brasileira de Telecomunicações calcula que as novas regras permitirão investimentos de até R$ 144 bilhões até 2020 para universalizar o acesso à internet de alta velocidade.
Imposição de cotas semanais
Já a fixação de um número mínimo de horas por semana para a apresentação – em horário nobre, por todas as emissoras, inclusive os canais estrangeiros – de programa de conteúdo nacional produzido no país representa forte ingerência na programação das emissoras. A atribuição à Ancine da tarefa de fiscalizar o cumprimento dessas regras dá ao órgão poder para definir o que é horário nobre e conteúdo nacional. Ela terá poderes para punir canais que não obedecerem suas definições e decisões. Daí pode surgir um monstro regulatório com grande poder de censura.
Não se trata de condenar o estímulo à produção nacional – que poderá receber até R$ 300 milhões anuais, correspondentes a 10% da arrecadação do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações –, mas de alertar para o risco de a imposição de cotas semanais para a exibição dessa produção resultar em perda de qualidade e relevância, com danos para o assinante que paga por esse tipo de serviço.