Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O Estado de S. Paulo

ENTREVISTA / JOSÉ PAULO CAVALCANTI
Pedro Doria

Um mundo mais fascista?

‘Na última quinta-feira, pela primeira vez nesta legislatura, a Câmara aprovou 57 pedidos de outorgas e renovação de concessão para emissoras de rádio e TV. É da praxe. Na Europa, concessões são exploradas pelo Estado. Nos EUA, por grupos particulares. É neste segundo o modelo que o Brasil se encaixa. E, teoricamente, a Venezuela também.

Feito presidente, Hugo Chávez desejou ter também o poder de suspender as concessões. Tanto que bateu em portas várias pelo continente afora, em busca de quem lhe escrevesse uma nova lei de teledifusão. Terminou produzindo uma legislação dentro de casa mesmo e, ainda assim, não deu certo. Quando decidiu pôr a RCTV para fora das ondas, foi obrigado a lançar mão de uma lei genérica mais antiga, para dar respaldo às suas pretensões.Tempos estranhos.

Quando o assunto é o cruzamento entre o Direito e a mídia, o advogado pernambucano José Paulo Cavalcanti Filho surge como grande especialista brasileiro. Foi secretário-executivo do ministério da Justiça no governo José Sarney – ministro, num curto período – e ocupou a presidência do Conselho Nacional de Comunicação Social.

Pergunte-se a Cavalcanti se Chávez é democrata e sua primeira reação será reclamar do charuto – ‘apagou, só um minuto para acendê-lo.’ Após uma baforada, responde assim: ‘Se democracia são três poderes que se contrapõem uns aos outros, então não há uma democracia formal.’ Mas, formalismos à parte, está de olho nas fricções que andam agitando o mundo da informação.

Críticas à imprensa têm recheado discursos oficiais. No Reino Unido, Tony Blair reclamou dos jornalistas. Bush também vem nessa toada. No Equador, o presidente Rafael Corrêa quer fechar um jornal porque editoriais têm sido escritos fazendo a crítica a medidas de seu governo. ‘Acho que mundo está ficando mais fascista’, pondera Cavalcanti. ‘Uma coisa que dá nobreza à imprensa é justamente questionar o poder, mas candidatos a ditador não gostam disso.’ Para o advogado, no entanto, situações como esta ainda não acontecem no Brasil, onde a mídia consegue cumprir seu papel.

O processo de perda da concessão da RCTV, na Venezuela, foi legal?

Há duas leis, aí, que são importantes para compreender o que se passou. A primeira é a Lei de Comunicações de 2000. Ela determina que o presidente da República pode decidir ou não outorgar uma concessão quando houver ameaças graves à segurança do Estado. A segunda é a Lei de Responsabilidade Social em Rádio e Televisão, de 2004, que determina quando uma TV pode ser punida: incitação à guerra, à desordem, discriminação. Neste caso, há penalidades que vão da suspensão da programação por até 72 horas até à revogação da habilitação por um período de cinco anos. Antes de cassar a concessão, é preciso ser reincidente, ter recebido pelo menos uma sanção.

Isso aconteceu no caso da RCTV?

Não. Ao invés de usar a lei mais recente e específica, o governo usou a de 2000, que deixa a decisão inteiramente nas mãos do presidente. E, como quase toda Suprema Corte foi indicada pelo presidente, mesmo quem quiser recorrer à Justiça enfrentará dificuldades.

A democracia pifou na Venezuela?

Se você definir democracia como um conjunto de poderes que se contrapõem uns aos outros, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, então não há democracia. Lá, o Congresso submeteu ao presidente o poder de legislar e o Judiciário foi indicado por ele. Se uma pessoa controla os três poderes, não há democracia formal.

Aconteceria isso no Brasil?

No Brasil, além de uma decisão do presidente, seria necessário apoio de dois quintos do Congresso. Nosso problema é outro: temos a pior Lei de Imprensa do mundo. Na lei atual, se você disser que o presidente roubou, e mesmo se provar que roubou, vai para a cadeia ainda assim, porque não pode enlamear a honra do chefe da Nação.

Isso parece fora de cogitação.

Mas continua em vigor. As leis de imprensa são mais ou menos parecidas no mundo. A brasileira ainda oferece certas garantias no capítulo das indenizações. De acordo com a nova Lei de Imprensa espanhola, por exemplo, além do jornal, o proprietário também é responsável por danos praticados. No mundo todo, o responsável pela notícia é o veículo, não o jornalista, e o valor da indenização é o do dano.

Alguém poderia perguntar: se existe um Código Civil que prevê crimes por calúnia e difamação, para que uma Lei de Imprensa?

Todos os países do mundo têm Lei de Imprensa. Por que o Brasil não teria a sua? Há muita coisa que uma lei dessa natureza prevê. Por exemplo, quem pode ser proprietário dos meios de comunicação? Como funciona o direito de resposta? Em agosto, vai fazer 10 anos que não votamos a nossa nova lei. Já foi aprovada por unanimidade na Comissão de Constituição e Justiça, a presidência da Câmara passou por PMDB, por PP, por PSDB, PCdoB, PT, e ninguém a tira da gaveta. O que dá um certo desânimo é que a nova geração de leis de imprensa já está discutindo outras coisas.

Como o quê?

Preenchidas as necessidades físicas, a liberdade mais fundamental é a de consciência. Para isso, há duas exigências. A primeira é que não pode haver censura, porque, se for limitado o acesso à informação, não importa se sexual, religiosa ou seja lá de que matriz, não podemos garantir que a consciência se formará livremente. A segunda exigência é a liberdade de dizer o que pensamos. Se a consciência é livre, tenho o direito de dizer tudo o que quiser sem que nada me aconteça. Posso dizer que um político determinado é ladrão, por exemplo. A nova Lei de Imprensa que está sendo votada nos EUA estabelece a diferença entre opinião e fato. Ela liberta de qualquer responsabilidade a opinião, mas penaliza com maior rigor a notícia injuriosa.

Isso não gera incertezas?

A Primeira Emenda à Constituição dos EUA estabelece que o Congresso não produzirá leis que limitem a expressão. Mas a Suprema Corte, em 1914, estabeleceu que o direito de falar não é absoluto, reconhecendo que Estado tem segredos. Ninguém pode dizer tudo. Você publicaria com antecedência a hora e local do desembarque aliado na Normandia em 1945?

Mas aí entram exceções como a publicação dos Documentos do Pentágono, que eram secretos, mas provaram que o governo dos EUA estava mentindo durante a Guerra do Vietnã.

Não tem jeito. Cada país tem que decidir o que deve ser censurado. Efetivos de forças armadas, ninguém publica. Informações médicas? Ninguém publica. Segredos de governo, também não. E há situações limites que exigirão sempre muita reflexão.

Tecnologia está mudando o negócio da imprensa. No espaço do veículo, na internet, não é possível ter controle sobre tudo o que o leitor publica. Como agir?

Estou preparando uma conferência cujo título será ‘O futuro da civilização é a barbárie’. Barbárie é a ausência de controles sociais. E civilização é imposição progressiva de regras de convívio social. O cidadão que escreveu o livro sobre Roberto Carlos não receberá um tostão, porque todo mundo o lerá pela internet. Agora, a rigor, a decisão que tirou o livro de circulação não vale nada. Desse modo, voltamos ao estágio em que não há regra nenhuma. Demoramos 8 mil anos até ter a civilização absoluta com todos os limites demarcados, em meados do século 20. Em 10 anos, derrubamos muito disso. Em quanto tempo estabeleceremos novos rumos? Não sei.

Qual sua avaliação da TV pública?

No Brasil, não tem um estado que não tenha uma TV educativa. Junte todos estes canais, faça-os trabalhar em cadeia, e estará pronta a rede pública. Temos um país carente de recursos para educação e saúde. Por que torrar dinheiro fazendo uma nova televisão que ninguém vai ver? Isso é um escárnio.

O premiê Tony Blair, do Reino Unido, desceu o malho na imprensa britânica. Há uma crise entre o governo dos EUA e os jornais de lá. O presidente Hugo Chávez interrompeu a concessão da mais popular televisão da Venezuela. No Equador, o presidente cogita fechar um jornal. Afinal, o que está acontecendo?

A situação da Inglaterra é diferente, porque lá o Direito funciona com outras bases e as regras para lidar com a imprensa são frouxas. Os tablóides mais sensacionalistas de todo o planeta estão em Londres. Agora, creio que o mundo está ficando mais fascista. O papel da imprensa é questionar o poder, sempre foi, e sempre vai ser. É o que dá nobreza a este ofício, que é também uma arte. As pessoas não gostam de ouvir críticas, ainda mais quando têm poder. Mas é preciso ter um contraponto a este poder. E os candidatos a ditador não gostam de falar nisso.’

MÍDIA & POLÍTICA
Sérgio Augusto

Mistérios gozosos

‘No auge da ditadura militar, envergonhado com não sei mais que medida ou fala autoritária, Otto Lara Resende ameaçou trancar sua matrícula de brasileiro. Aposto como ele teria repetido a boutade mais de uma vez, na semana passada. Se é que outras, tão ou mais espirituosas, sua indignada verve não teria inventado depois de ouvir as últimas gafes do presidente e sua ministra do Turismo. Para não falar do ‘laissez faire-laissez voler’ defendido pelo senador Epitácio Cafeteira (se saiu Epitáfio, tudo bem) para manter no trono senatorial o pecuarista Renan Calheiros (se saiu pecuniarista, não mudem).

Fiquemos, por alguns segundos, nas gafes. O último lambari verbal do presidente foi mais lamentável do que a recomendação da ministra para que relaxássemos quando vitimados pelo caos aéreo. Afinal de contas, ela é sexóloga de formação. Natural que tudo veja pela perspectiva do sexo, inclusive o turismo, até porque o nosso forte é, mesmo, o turismo sexual. E, como o que se padece atualmente nos aeroportos brasileiros configura uma violação dos direitos mais elementares do cidadão, seu conselho (‘Relaxem e aproveitem’) faz sentido. Ou vocês já se esqueceram da frase original? Se o estupro é inevitável, relaxe e aproveite.

‘Você não vê um suíço falar mal da Suíça’, lambariou o presidente, aos pés do Cristo Redentor, com a intenção de nos coagir a aceitar como normais todas as anomalias que aqui se avolumam. Só falamos mal do Brasil para o bem do Brasil. E que exemplo mais infeliz ele escolheu. Por que nos contrapor a um país que é o terceiro do mundo em desenvolvimento humano, com renda per capita de US$ 30,5 mil e expectativa de vida em torno dos 80 anos – sem contar os relógios e o chocolate?

Se o presidente quiser ler um suíço que fala mal da Suíça, empresto-lhe dois livros de Jean Ziegler. Na próxima chiadeira, presidente, tente Ruanda, Zâmbia, Etiópia, por aí.

Está difícil relaxar e incutir otimismo num país corroído por uma avacalhação aparentemente incurável, terminal. Temos um ‘rei’ que optou pela censura; um presidente que optou pela gafe; um Congresso inclinado a dar mais um golpe na vontade popular (desta vez impondo a ditadura do caciquismo partidário, mediante a adoção do voto em lista fechada); e um candidato às Sete Maravilhas do Mundo entregue às baratas pela prefeitura carioca.

Pobre Cristo. Do jeito como andam as coisas por lá, seu lugar justo talvez seja entre as sete maiores armadilhas turísticas do mundo. Deu azar o Redentor de ficar no alto de um morro. E logo de um morro do Rio. Resultado: as favelas vicejam que nem capim nas suas encostas. Com o crescimento descontrolado de três delas (Ascurra, Cerro-Corá, Guararapes), o mais vistoso cartão-postal da cidade poderá em breve estar dominado pelo tráfico. Vans sem credenciais, taxistas irregulares, flanelinhas que cobram R$ 20 por um espaço que não lhes pertence e guias extorsionários já o dominam, à vista de PMs e guardas municipais que não movem uma palha.

Não digam que só falta agora uma bem-sucedida campanha contra a proverbial preferência nacional, pois ela já está em andamento, açulada, é claro, pelas desbundadas do mundo fashion. Popozudas de todo o Brasil, uni-vos! Retidão moral, sim; retidão glútea, nem em passarela.

Como ser minimamente ufanista se nem os dois maiores orgulhos nacionais – o carnaval e o futebol – inspiram mais respeito e confiança? Dia desses, o cronista esportivo de O Globo Fernando Calazans lamentou o distanciamento, cada vez maior, da seleção brasileira de seu público número um. De fato, ela só tem jogado lá fora ultimamente. E, o que é pior, jogado muito abaixo de sua reputação. A Fifa acaba de rebaixá-la para o terceiro lugar no ranking mundial. Três de seus mais renomados craques (Kaká, Zé Roberto e Ronaldinho Gaúcho) pediram dispensa. Ainda não superaram a traumática experiência da última Copa do Mundo. O que deixa Robinho como nossa última esperança de redenção, se é que não terão desdobramentos negativos as desavenças entre a CBF e o Real Madrid sobre a presença do jogador na última partida do campeonato espanhol.

Se fosse hábil e generosa, a presidência da CBF não teria criado dificuldades para a participação de Robinho no jogo de logo mais, contra o Mallorca. Seria uma maneira de compensar o injusto e desastroso chá de banco que Parreira lhe impôs na Alemanha, para manter em campo uma dupla de área pesadona e inócua. E o Dunga lá precisa de 14 dias para entrosar Robinho na equipe? Aliás, que equipe?

Se já era um absurdo a prefeitura do Rio repassar recursos públicos para a Liga das Escolas de Samba, há anos dirigida por notórios contraventores, a suspeita de que os resultados do último desfile no Sambódromo, vencido pela Beija-Flor, foram manipulados na base do suborno e da coação física nos aproxima do escárnio total e absoluto. A última coisa que faltava ao desacreditado carnaval chapa-branca do Rio era o contágio com a roubalheira, a corrupção dita sistêmica. Não foi para lavar dinheiro de bicheiros e achacar jurados que Cartola e Carlos Cachaça fundaram a Estação Primeira da Mangueira.

Caso fique provado que jurados do desfile deste ano receberam propina e foram ameaçados por um pistoleiro ligado ao bicheiro Aniz Abrahão David, o Anísio da Beija-Flor, das duas, uma: ou entregamos a Liga das Escolas a rédeas idôneas ou elegemos Anísio deputado. Se nada acontecer, o tão desgastado bordão ‘acabou em pizza’ poderá ser finalmente coberto de naftalina, cedendo a vez à expressão ‘acabar em samba’- com ‘acabar em Cafeteira’ correndo por fora. Enriqueceremos nosso vocabulário, sem dúvida alguma, mas à custa de prejuízos que receio irrecuperáveis.’

TELEVISÃO
Renata Gallo

‘Ainda sou um aprendiz’

‘Ser ator é, antes de tudo, um exercício de paciência. Decorar calhamaços de texto, ter de fazer e refazer a cena quantas vezes preciso, almoçar e jantar sem glamour e escutar inúmeros ‘só mais uma vez’. ‘Não é ‘meu cartão de crédito está estourado’, é ‘meu talão de cheques’. Mais uma vez’, ecoa a voz do diretor numa rua da Vila Mariana fake montada no Projac, no Rio. E lá se vão algumas repetições. ‘Pára, pára, o figurante passou na hora errada. De novo!’, vem a ordem novamente. ‘Agora, só mais uma vez, com brilho no olho, quero ver brilho no olho!’. ‘Giane, fica um pouco mais à esquerda, por favor?’; ‘Você tem que chegar pelo lado de cá do poste, ok?’. E assim por toda a manhã, incontáveis ‘só mais uma vez’.

Pausa. Reynaldo Gianecchini pede pelo celular que entreguem no camarim seu almoço: salada, suco e filé de frango. Sim, galã também pede delivery, come correndo, tem pressa. E tem de estar sempre à disposição da direção – e à mercê de todo e qualquer julgamento. O ator, que estreou em Laços de Família (2000) e foi achincalhado pela crítica, deu a volta por cima e foi elogiado como o mecânico Pascoal, em Belíssima. Agora, viverá em Sete Pecados – novela das 7 que estréia amanhã na Globo – o taxista classe média Dante, casado com Clarice (Giovanna Antonelli), mas que se encantará por Beatriz (Priscila Fantin). No Projac, o ator falou ao Estado sobre assédio feminino, assédio da imprensa, paparazzi… Também, bonito, inteligente, com cara de bom moço. Peraí?! Tudo fácil para esta pessoa? Não pode.

O Dante é mais um mocinho no seu currículo?

Ele é um mocinho, mas estou tentando não fazer ele babaca, sabe? E ele é diferente porque tem essa possibilidade de ir se sujando. Ele vai se defrontar com esta possibilidade do pecado. Mas ele é um homem simples, não é de trejeitos, não fala errado. E é difícil fazer o simples. Quando você tem um monte de elementos para colocar você consegue dar uma cor. O duro é dar uma cor fazendo o simples.

Formado em Direito, modelo, quando se apropriou da carreira de ator?

Meu primeiro trabalho foi com o Zé Celso. Neste momento, que entrei no Teatro Oficina, com toda aquela história carregada nas paredes, vi que queria ser ator. Mas não sei te dizer o momento que me senti ator porque ainda sou um aprendiz. Sou ator porque é a profissão que abracei e que quero fazer para o resto da vida, mas me sinto ‘mesmo’ um aprendiz.

Há algum arrependimento por ter estreado tão verde em ‘Laços de Família’?

Olha, hoje em dia, se tivesse que dar conselho a alguém, o que nunca presta, falaria: ‘Procura estudar porque é uma exposição enorme e aí você vai colher as conseqüências disso’. Mas não me arrependo. Topei o desafio. E, pra mim, deu certo no sentido que minha carreira deu uma continuidade. Acho que alguma coisa eu pude oferecer porque as pessoas continuaram me chamando. Na verdade, a novela foi um alerta enorme para eu estudar cada vez mais.

O maior problema foi a crítica?

Não. A minha própria crítica talvez seja a pior. Via que era insuficiente meu trabalho, que não estava do jeito que queria. TV é uma fábrica, que tem pressa, e você não ter experiência e não poder contar muito a não ser com você mesmo, com a sua coragem, é muito difícil.

Não acha que a imprensa pegou pesado?

Tem uma coisa no Brasil que é horrível, as pessoas nunca enaltecem nada. Uma pessoa cai matando e todo mundo compra a idéia. Lembro que teve uma crítica ruim e todo mundo comprou. E aí fui tachado de péssimo ator. Mas não brigo, não acho que fui perseguido porque realmente estreei verde. Agora, não se ouve isso no Brasil: ‘Olha, ele ainda é verde, mas existe uma chama de talento ali que, se ele trabalhar, vai dar’. As pessoas gostam de malhar, mas não tenho a menor mágoa da imprensa.

E de perseguição de fotógrafo?

Olha, esta cultura de paparazzi é gravíssima aqui no Rio. Outro dia estava vendo uma notinha sobre um colega: ‘Ele saiu do restaurante puto e nem olhou para a câmera’. A gente tem que sair dando tchauzinho para a câmera agora, como assim? Tem que ficar dando de palhaço? Primeiro: não dá para entender porque o fotógrafo está lá. Segundo: você tem que ser simpático ‘até’ com o fotógrafo? ‘Oi, tudo bem?, obrigado por estar aqui, beijo para a mulher, para as crianças’. Não existe isso.

Você deixa de fazer alguma coisa por isso?

Já tive vários momentos com fotógrafo de plantão na frente de casa. Isso me incomoda pra caramba, mas vivo minha vida. Não gosto da superexposição, de ter todos os meus passos medidos. Você abre uma revista e está lá onde você foi. Parece aquela coisa de dar satisfação para a mãe, sabe? Você está com um amigo e tem que se justificar: ‘Olha, é ‘só’ amigo, tá? Não é namorada, não é nada’.

O Serjão Loroza, de ‘A Diarista’, deu uma entrevista para o ‘Estado’ dizendo que ninguém chega perto de galã, já dele… Concorda?

Numas, né? O assédio feminino no Brasil é uma loucura. As pessoas querem que você pare ‘tudo’ para dar atenção para elas: para dar beijinho, autógrafo e tirar foto. E, de preferência, tocar em você, invadir o seu espaço físico. Tem hora que você tem que se posicionar e dizer: ‘Peraí, meu amor, você vai até um certo limite’. Olha, é um exercício diário. É a mesma coisa que eu por uma pessoa para ficar todo dia te cutucando. Você não vai ver um advogado que toda hora alguém fala: ‘Pára de assinar esse contrato aí e tira uma foto comigo? Pára um pouquinho, me dá um beijinho?’ Cansa.

Acha que há uma cobrança maior de competência para atores bonitos?

Acho que sim. A beleza sempre abre portas, mas as pessoas são sempre muito cobradas. Você quase tem que pagar um pedágio por ser bonito. Como se você fosse bonito você não pudesse ser talentoso nem inteligente. Sei lá. Você desperta amor e ódio na mesma proporção – e de graça. As pessoas falam qualquer coisa a seu respeito, te julgam sem te conhecer achando que te conhecem e falam barbaridades. Às vezes irrita, às vezes acho engraçado mas, no final, o que importa é o trabalho.

Mas é mais difícil provar competência?

Acho que tem mais cobrança sim. Não só bonito. Às vezes tem uma pessoa que veio da pobreza: ‘Ahhh, ele veio da pobreza’. Essa já ganha crédito. Você ser classe média, que nunca passou por dificuldade, ser bonito… Peraí?! Tudo fácil para esta pessoa? Se você veio do morro e faz uma coisinha: ‘Que beleza’. Não tirando o valor. Vim de uma família de classe média, nunca passei fome, não tenho uma história triste para contar. Mas, ao mesmo tempo, é a história de todo mundo, né? Só a gente sabe o esforço que tem cada um no seu dia-a-dia. Essa coisa de gravar, enfrentar essa rotina, a cobrança…

Você acha que seu biótipo limita seus papéis?

Quero acreditar que não. Acho que cabe a gente também quebrar essa pré-concepção. Acredito que posso fazer tudo. Até porque este ‘bonitããão’, esse negócio de beleza… Não sei, não acho que sou um padrão de beleza.

Você passa sempre uma imagem correta. Tem alguém que cuida da sua imagem?

Não. Na verdade, não sou tão correto assim. Mas as pessoas falam que tenho cara de bom moço e acho bom, passa uma credibilidade. É também da minha natureza. Imagina eu querer bancar o bad boy? Não sou bad boy, não vou sair por aí apavorando, quebrando tudo. Sou tranqüilo, mas também faço minhas besteiras.

Parte desta credibilidade se deve ao fato de você ter sido casado com a Marília Gabriela?

A Marília me fez ser um homem melhor, em todos os aspectos. Aprendi muito com ela, ela é uma mulher realmente incrível… chique, elegante, enfim, me ajudou muito na minha vida e também, claro, talvez tenha ajudado a dar credibilidade à minha imagem. Acho que sim.

Está agora sendo reprisada ‘Da Cor do Pecado’. Você assiste? E se critica?

Hoje em dia é mais fácil assistir, a gente se cobra mais quando a novela está no ar porque está muito envolvido. Tento assistir à novela que estou fazendo para corrigir os erros, mas é doloroso porque novela é a arte que dá para fazer naquele momento e nem sempre o que dá para fazer naquele momento é o que você acha que é o melhor. De tudo: da luz, câmera, uma entonação a mais, a menos… Mas dentro daquela correria foi o que deu para fazer. Eu me cobro, mas passa. Tenho mó orgulho de Cor do Pecado. Vejo erros, acertos, me critico, mas é meio sem dor, passou.’

***

O Gianecchini da vida real

‘Antônio Rogério Crisóstomo sempre foi conhecido como Negão, mas, ultimamente, é também chamado de Gianecchini Negão. É dele o Santana – ‘bem conservado e limpinho’ – que Reynaldo Gianecchini usa nas gravações de Sete Pecados. Quando grava em São Paulo, a Globo paga uma diária de R$ 200,00 a Crisóstomo. E já foram mais de 10 vezes, para sua alegria.

Como foi o encontro com o Gianecchini?

Achava que ele era daqueles ‘não me toque, não me rele’, mas foi muito simpático. É um ser humano igual a mim. Foi bom porque, enquanto eles trabalhavam, fiquei olhando as gravações, fiquei tomando um cafezinho, ganhando sem trabalhar.

E tem escutado muita brincadeira?

Ah, gozação tem bastante. Falam que deito no chão para ele passar, que ando no colo dele, que sou o Gianecchini Negão…

O que você tem de Gianecchini?

Tenho 42 anos, mas estou bem conservado. Sou boa pinta. Quem vê o gato aqui fica admirado.

A categoria pergunta ao ator

Percorremos a Rua Oscar Freire, onde teoricamente será o ponto de táxi de Dante, personagem de Reynaldo Gianecchini, e levamos a ele três perguntas de taxistas da vida real. Confira as respostas:

‘Você se sente um galã?’, de Gilberto Buzo

Não, nada. Na minha vida eu não tenho essa coisa de glamour. Sou tão desglamourizado, gosto dos hábitos mais simples. Não sou afetado, nem deslumbrado e não gosto de estar com gente afetada. Tento fazer a minha vida simples, de ser humano como nós todos somos, sem acreditar nesta história de ser astro, galã. Encaro isso como um personagem.

‘Você acha que teria mais passageiros se trabalhasse com táxi?’, de Adalberto José da Silva (risos) Ai, não sei. Às vezes tem um frentista que é lindo e as pessoas nem olham, mas se ele estivesse na TV… Quando não estava na TV nunca fui um cara que saiu na rua e as pessoas: ‘Nossa, pára tudo’. Então, provavelmente se eu não tivesse feito TV eu ia trabalhar de taxista e as pessoas não iam olhar.

‘Sendo tão boa pinta o que está fazendo solteiro?’, de Antônio Rogério Crisóstomo, o Negão

Olha, é bom estar solteiro. Mas não significa que estou morto, né? Estou solteiro porque quero curtir essa vida, de poder fazer minhas coisas sem ter que dar um telefonema antes, sabe? Estou curtindo as relações mais leves, digamos assim. E é muito bom.’

Cristina Padiglione

Os gols da discórdia

‘Entre as reformas realizadas pelo Fantástico, há coisa de um mês, pelo menos uma bateu na trave por razões que prezam a tradição da revista dominical da Globo. Na redação do Estado, foi consenso entre os boleiros mais fiéis que o programa saiu perdendo ao trocar o veterano Léo Batista e seus Gols da Rodada por Tadeu Schmidt e uma nova edição de gols. Já a versão de Tadeu agrada a outras torcidas: sua missão é tentar atender à pluralidade da platéia do Fantástico, com adereços de edição capazes de atrair os olhares menos fanáticos, mas que nem sempre privilegiam o ângulo mais aguardado de cada gol.

Bola dividida, o TV & Lazer resolveu meter sua colher nesse campo e enviou a Tadeu e a Léo, por meio da Central Globo de Comunicação (CGCom), cinco perguntas, via e-mail.

Esta jornalista ainda tentou, por mais de três semanas, estender essa prosa com o craque Léo Batista por meio de um telefonema que fosse, mas a CGCom alegou que a agenda dele é muito complexa. Pena.

Enquanto o novo Fantástico não alcança no Ibope o reflexo de suas mudanças – o programa tem caminhado na trilha dos 30 pontos em São Paulo – aguardamos novidades sobre o veterano. A Globo garante que ele fará parte da cobertura do Pan, no Rio, e argumenta que ele tem narrado os gols nos intervalos dos jogos de quarta, feito que nem sempre chega aos espectadores de São Paulo, de acordo com a partida em exibição em cada praça.

E enquanto Léo Batista não vem, ficamos com o bate-bola entre o veterano e o novato, para contemplar as controvérsias dos Gols da Rodada – se é que se pode esperar consenso nesse território de boleiros.

Perguntar não ofende:

1) Exibir rodada de gols no meio de uma revista de variedades como o Fantástico não configura sempre um risco de afastar as mulheres da sala? Como se foge dessa cilada?

2) Qual a maior queixa que você já ouviu de um torcedor na rua, em relação a alguma narração ou apresentação feita por você?

3) Qual a maior saia justa já enfrentada por você durante uma apresentação esportiva?

4) Acredita que a TV digital mudará algo no impacto causado por cenas esportivas sobre o telespectador?

5) Tadeu Schmidt por Léo Batista e Léo Batista por Tadeu Schmidt:

‘Ninguém é eterno’

1) Sim, o público masculino é a maioria, mas a cada dia os estádios estão mais enfeitados pelas moças, famílias e crianças. Os gols da rodada do Fantástico têm seu sucesso com o público, eu sei porque sou um ibope ambulante: vou à padaria, ao supermercado, e as pessoas sempre comentam comigo sobre seus times.

2) Uma vez, atendi uma ligação de um senhor reclamando por eu ter dito que o filho dele tinha tomado um frango. Eu confirmei, o gol que ele sofreu foi um frango, mas aí ele revelou que o filho estava com o braço quebrado e não agarrava há três meses. Foi quando percebi que citamos o goleiro errado e me desculpei com ele.

3) Durante a Olimpíada de Montreal, em 1976, quebrei o dedo indicador faltando dez segundos para entrar no ar. Meu dedo virou um ‘L’ e a dor era insuportável, mas tive que voltar ao ar sorrindo. Quando deu o intervalo, improvisaram uma tala. Usei a tala improvisada durante a Olimpíada inteira, tanto que hoje meu dedo ainda é um pouco curvado.

4) Completei 60 anos de profissão. Sou de uma época em que não havia gravador, satélite, rádio de pilha, nada. Quando a TV em cores surgiu, as pessoas ficavam chateadas porque não pegava, mas logo virou uma febre. Quem não tinha colocava papel celofane. Uma vez o Boni pediu para que nós evitássemos citar algum time pela cor da camisa, porque as pessoas que tinham TV em preto-e-branco se sentiriam frustradas.

5) Quando o Tadeu estava se preparando para apresentar, eu dei algumas dicas para ele e acredito que isso tenha contribuído de alguma forma para o seu crescimento. Mas o que mais me agrada é que ele tem um estilo próprio e não precisa imitar ninguém. Eu pretendo continuar pela frente, mas é evidente que ninguém é eterno. Fico muito contente de termos uma safra de novos apresentadores muito talentosos. O Tadeu já achou a sua identidade e tem os meus aplausos.

‘Léo é insubstituível’

1) O elogio que eu mais gosto de receber é daquela mulher que não gosta de futebol. Ela se aproxima e diz: ‘olha, eu não gosto de futebol, não entendo nada, mas gosto do jeito como você descreve os lances. E, por isso, acompanho os gols’. É um empolgante desafio: buscar formas de atrair os telespectadores que não se interessam pelo assunto. Acredito que esse telespectador será cativado pela forma como apresentamos os gols, com uma linguagem simples e de fácil entendimento (até para quem não sabe o que é um impedimento), pela edição caprichada, pela música, pela curiosidade cuidadosamente garimpada dentro de um jogo, pela imagem bonita, pelo lance engraçado, pelo fato dramático, pelo inusitado.

2) Felizmente, eu sempre sou tratado com muito carinho na rua. As pessoas sempre vêm para elogiar, comentar, tirar dúvidas.

3) Já enfrentei problemas técnicos, já tive que improvisar quando tudo que estava previsto acabou mudando na última hora. Mas foram problemas corriqueiros.

4) O esporte é muito rico em imagens. Com a maior resolução da TV digital, acredito que o telespectador vai se encantar ainda mais com a beleza do esporte.

5) Quando eu nasci, Léo Batista já era um grande nome. Eu cresci ouvindo Léo Batista. Quem, no Brasil, ouviria aquela voz e não reconheceria? Fazendo uma pequena adaptação no bordão do Luiz Roberto, eu diria que Léo Batista é ‘a voz mais marcante’ da história do jornalismo esportivo.

Por isso, eu digo que o que estamos fazendo no Fantástico, agora, é uma nova proposta, um novo olhar sobre os gols da rodada. Não é uma substituição. Léo Batista é insubstituível.’

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