O ministro da Educação Fernando Haddad não respondeu à pergunta do título, como queriam os jornalistas da Associação de Correspondentes Estrangeiros de São Paulo que o entrevistaram na segunda-feira (15/9). ‘Se eu respondesse, anularia a discussão que vai definir este ponto básico, identificar o núcleo duro do jornalista, e esse é um debate que vale a pena’, disse Haddad.
Quando o ministério decifrar a pedra fundamental do jornalista, e o que permite a um profissional ostentar o título, a intenção é oferecer, por meio de um mestrado, o exercício da profissão a graduados de outras áreas. Todos terão de apresentar a qualidade básica fundamental, necessária à sua formação.
A inclusão já acontece em alguns países. A conceituada Faculdade de Jornalismo da Universidade Columbia, em Nova York, única integrante do seleto grupo de universidades da Ivy League que forma jornalistas e oferece um dos melhores mestrados do mundo, abre os braços para médicos, engenheiros, psicólogos e o resto, e aguarda serena a chegada dos poucos à reta final.
O esforço compensa. Provas duríssimas e aulas extenuantes permitirão ao candidato ostentar o mesmo título concedido a estrelas do rádio, TV, internet e imprensa escrita, e eles nem sempre exibiram na entrada o diploma de Jornalismo que a lei brasileira exige.
‘Mas vai valer a pena? Jornalistas ganham tão pouco no Brasil…’, argumentou um colega. O ministro riu: ‘Pode ser que depois a coisa mude’, disse.
Qualidade da profissão
O que desvalorizou a profissão e fez despencar os salários foi a esquizofrenia das universidades. Expelem todos os anos jornalistas em escala crescente para um mercado minguante. É o inverso do que acontece com a formação tecnológica.
O ministro insinuou: ‘Mas podemos induzir a procura para uma ou outra área, através de financiamentos educacionais mais ou menos atraentes’. O que pode conter em parte a enxurrada de profissionais de faculdades públicas, mas não das particulares.
Uma proposta que valerá a pena se ficar comprovada a qualidade primordial que faz um jornalista um profissional distinto. A aposta para alguns é a cultura; para outros, a curiosidade; para terceiros, o espírito comunitário; para muitos, o dom para a investigação, a qualidade de não desistir, como a que levou o repórter Tim Lopes até o fim; para a maioria, o desprendimento de abrir mão da vida pessoal em favor da informação ao público.
São características que podem caber na Saúde e na Lei, em qualquer profissão. Mas a pergunta vai mais a fundo, e por isso os sindicatos insistem no diploma. A essência é aquela fibra que não permite ao engenheiro escapar da culpa pelo prédio que ruiu. É a ética do jornalista, o compromisso único e direto com a verdade. Uma qualidade que não se aprende em banco de escola, mas se não constar do DNA do profissional é motivo suficiente para expulsá-lo do time.
Como medir essa fina característica antes de testá-la no dia a dia? E até que ponto a abertura vai apurar a qualidade da profissão?
Isso só será avaliado depois da discussão proposta pelo ministro, da qual todo jornalista adoraria fazer parte. Para saber, afinal, se é ou não é jornalista.
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MEC estuda autorizar outros diplomados a exercer o jornalismo
Reproduzido da Folha de S.Paulo, 17/9/2008
O MEC (Ministério da Educação) estuda autorizar profissionais que tenham formação universitária em qualquer área a exercer a profissão de jornalista. O ministro Fernando Haddad (Educação) também quer discutir as diretrizes dos cursos oferecidos na área que passarão por uma supervisão, a exemplo do que ocorreu com direito, medicina e pedagogia.
Ainda neste mês, o ministro disse que vai constituir um grupo de trabalho para apresentar, em 90 dias, uma proposta nesse sentido. ‘A comissão fará uma análise das diretrizes curriculares do jornalismo e, sobretudo, das perspectivas de graduados em outras áreas, mediante formação complementar, poderem fazer jus ao diploma.’
Ele disse à Folha que seu objetivo não é entrar na discussão travada no STF (Supremo Tribunal Federal) e no Ministério do Trabalho sobre a obrigatoriedade do diploma, mas tratar da formação do jornalista. Do ponto de vista prático, se o STF -que deve julgar ação neste semestre- entender que o diploma de jornalista é obrigatório, a discussão se tornará inócua.
‘No mundo inteiro as pessoas se formam nessa área, mesmo onde não há obrigatoriedade. Sou favorável à boa formação. Não discuto a questão do exercício profissional.’
Para um profissional formado em outra área ser habilitado ao diploma de jornalista, ele precisaria cursar disciplinas essenciais para a formação na área, como técnica de reportagem, ética e redação, disse ele.
Para Max Monjardim, chefe da comunicação do Trabalho, a discussão poderia se dar no grupo que discute a regulamentação da profissão, do qual participa: ‘Seria bom se o ministro indicasse algum representante da Educação para participar do grupo que já está funcionando [no Trabalho]’.
O presidente da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), Sérgio Murillo de Andrade, considerou a proposta de Haddad ‘inoportuna’. Ele também participa do grupo criado pelo Trabalho. ‘É uma proposta feita por alguém que está distante da realidade da profissão.’ A ANJ (Associação Nacional de Jornais) disse que não comentaria a idéia por ser só uma proposta e porque o assunto está sob o exame do STF.
No Supremo, o relator é Gilmar Mendes, que já autorizou profissionais da área a se registrarem sem possuir o diploma.
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Jornalista