Certa vez entrou uma paciente no consultório com um problema infeccioso que foi logo avisando: ‘Doutor, eu li um artigo de um jornalista que dizia que antibiótico faz mal para os ossos e, por favor, não me prescreva antibióticos. Eu só aceito tomar remédio quando eu estou doente.’
Eu perguntei por que ela não tinha ido procurar o tal jornalista, já que a sua situação necessitava ser encarado de forma séria.
‘Ora, doutor, ele não é médico!’
‘Bom, eu disse, então é melhor deixarmos este jornalista de lado.’
Este episódio me veio à mente ao ler no OI o texto do futuro doutor Enézio Eugênio de Almeida Filho, ‘O debate científico que ainda não ocorreu‘ em que o mesmo cita os três mosqueteiros nesta luta com seus artigos, a jornalista Ágatha Lemos, o pastor Douglas Reis e o jornalista Michelson Borges. Eu incluiria ainda a médica Dayse do Valle Oliveira, que participou dos comentários, do Comitê Executivo da ‘União Centro Oeste Brasileira da Igreja Adventista do Sétimo Dia’ (informa a mesma que passou o seu mandato de dois anos e não pode mais ser). Todos, sem sombra de dúvidas, interessados não inocentes em uma visão bíblica no assunto. Como ocorreu igualmente com o professor Silvio Motta Costa, em 10/2/2009.
Um ataque desesperado
Enézio Eugênio de Almeida Filho, já em 20/12/1998, na matéria ‘Desnudando Darwin: ciência ou ideologia? Ou A relação incestuosa da mídia brasileira com a Nomenklatura científica’, nos dava alguns dados interessantes sobre si mesmo. Pesquisador em Educação em Ciências usava a terminologia chula usada até hoje: ‘Grande Mídia Tupiniquim (GMT)’ ‘kulturkampf ‘ ‘Nomenklatura’, ‘KGB’, a se referir ao jornalismo e aos cientistas. Existe explicação para isto.
O engenheiro Ruy Carlos de Camargo Vieira, presidente da Sociedade Criacionista Brasileira e professor aposentado da Universidade de São Paulo, a USP, foi marxista e ateu na adolescência. Vieira converteu-se ao Evangelho quando cursava o quarto ano da faculdade. ‘Fui convidado por uma colega para uma conferência evangelística e aceitei por educação. Mas lá fiquei impressionado com a precisão das profecias bíblicas e pela coerência do cristianismo’, conta, sem explicar que tipo de ‘educação’ é esta que leva a ouvir proselitismo bíblico. O caminho é muito parecido com aquele percorrido por Enézio Eugênio de Almeida Filho, coordenador do Núcleo Brasileiro de Design Inteligente, sediado em Campinas (SP). Ex-ateu de carteirinha, e também ex-marxista-leninista. O biofísico molecular e também acadêmico de Oxford, Alister McGrath, também ele era ateu – pelo menos, até conhecer de fato a religião cristã, agora é teólogo. ‘Percebi que o cristianismo é muito mais complexo e intelectualmente desafiador do que supunha. O tempo passou e a religiosidade está mais viva do que nunca. Isso fez com que os principais defensores do ateísmo partissem para um ataque desesperado, um tudo ou nada’, diz ele em seu livro O delírio de Dawkins (Editor Mundo Cristão). Informações estas tiradas da Revista Eclésia – a revista evangélica do Brasil.
Um arremedo de debate científico
Interessante os aspectos psicanalíticos revelados por estas almas que vieram do marxismo ateu e hoje lutam para fazer a ‘reparação’ [foi a psicanalista Melanie Klein que introduziu a ‘reparação’ entre os conceitos da psicanálise. A idéia básica é a seguinte: um belo dia, o bebê se dá conta de que os objetos de seu amor são pessoas inteiras (por exemplo, ele descobre que não gosta apenas do seio que o alimenta, das mãos que cuidam dele etc., mas da mãe como um todo). Logo, nosso bebê começa a sentir a necessidade de ‘reparar’ os ‘danos’ que sua visão anterior do mundo teria causado – em suma, de reconstituir o corpo materno que ele havia consumido aos pedaços. Isso pode parecer bastante exótico aos olhos do leigo. Mas, para entender, basta considerar que nunca paramos de oscilar entre a vontade de despedaçar o outro e a vontade de reparar os estragos (reparação por Contardo Calligaris)] daqueles anos contra o pai. Os anos em que foram travessos. Certamente Ana Maria Rizzuto teria um material farto para o seu trabalho de psicanalista católica militante. Por que fanáticos pelo marxismo procuram nova forma de devoção cega? Uma tese para pesquisa em psicologia, psicanálise e psiquiatria.
Se junta ao grupo nos comentários agora outro jornalista que prega contra o conhecimento e a ciência, Moisés Viana, de Itapetinga, Bahia, autor no OI de ‘Extra scientia nulla salus‘, em 18/12/2007. Um ataque à revista pela forma livre como trata o tema, na qual rebati no OI em ‘Extra scientia nulla salus ou extra ecclesiam nulla salus‘, em 25/12/2007, demonstrando o espírito anticientífico essencial deste credo, que deseja ser a religião única e ditar as verdades científicas em um arremedo de ‘debate científico’. Aquilo que não fazem nem mesmo em religião.
Necessidades psiquiátricas?
Mas me parece demonstrado que a questão é principalmente com a visão fundamentalista cristã, que tenta mais uma vez dominar a cena pública e impor a sua visão de mundo como sempre fez na sua história. Como bem deveria saber um doutorando neste assunto. Apenas se abster de ter a mesma cegueira de outros tempos dos seus antecessores. Para isto que a história existe e se estuda a mesma: o filósofo George Santayna lembrava: ‘Aqueles que esquecem a História estão condenados a repeti-la.’
O sr. Enésio virá a ser um futuro doutor em História da Ciência, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. O que não se pode confundir com outra coisa. Exemplificando, não se pode considerar um doutor em História Militar como um general ou que possa ser um comandante militar de qualquer unidade. Assim, um doutor em história, deveria pesquisar história. Para isto que serve o curso. Dar aulas e trabalhar na área de pesquisa histórica. Centros e laboratórios de biologia, de astronomia, de astrofísica, e de biologia evolucionária não contratam bacharéis e nem professores de história. Não contratam jornalista, pastores, bíblicos ou professores do ensino médio. Não são eles que determinarão este conhecimento quando não lhes agrada o espírito.
Não é, portanto, de se estranhar que os zoólogos, botânicos, biólogos, bioquímicos, médicos e cientistas, que estudam, pesquisa, vivem a evolução em campo ou centros universitários não de bola para ele. Não perdem tempo num dialogo infrutífero com alguém que não tem qualificação alguma para isto. E não tem intenção alguma de chegar a algum lugar do que seja à volta a Bíblia. Aquelas pessoas não abriram uma porta e entraram nestes locais do nada. Não fizeram vestibulares e no outro dia assumiram posição em que estão há anos. Há décadas. Não baseiam seus estudos em curiosos, leigos, para saber o que fazer. São Doutores em ciência, PhD em ciência, e não doutores em história. Ficar discutindo com pessoas que ouviram falar de assuntos que acham que a bíblia esclarece mais é perda de tempo. Um historiador da história da ciência que se revolta com o ranço materialista, kulturkampf, epistêmica da teoria. Seria como um médico, e os há, que querem convencer que as doenças são conseqüências dos pecados, dos maus pensamentos, dos espíritos e não de causas naturais. Em médicos que afirmam aos seus pacientes que Deus conduz suas mãos na cirurgia, para se fazerem admirados pelo seu sacerdócio, quando na verdade está usando o conhecimento e a tecnologia desenvolvida por milhares de pessoas nos últimos anos. Ninguém antes Deus salvou a vida conduzindo a mão de ignorantes operando. Necessidades psiquiátricas do ‘testemunho’?
‘A terra é azul e eu não vi Deus’
Infelizmente, para o historiador, ciência é por essência materialista, baseada em fatos em juízos analíticos e sintéticos. Pertence ao campo sensível e acessível. Restringe-se a assuntos testáveis e não ao mundo do imaginário, do desejar, do querer. Deveria identificar através da história da ciência que Deus e deuses sempre acabaram sendo afastado para as explicações mais corriqueiras. A doença, o movimento do ar, do rio, dos corpos celestes, uma infinidade de alegações…. Até mesmo a orogênese, ainda no século 19, era atribuída à mão de Deus e a doença, para os cristão, originária da queda do homem pelo pecado original. Dois mil anos depois de Hipócrates. Assim, não existe nada de modernidade na proposta do historiador que quer determinar a ciência. Se imaginarmos que em 24 de novembro de 1859, quando publicado A Origem das Espécies, ainda se acreditava em geração espontânea, que Pasteur tentaria destruir esta crença em 1862 com a sua famosa experiência dos frascos. O russo Dmitri Ivanovich Mendeleyev publicou a tabela periódica em seu livro Princípios da Química, em 1869, época em que eram conhecidos apenas cerca de 60 elementos. Nesta época, em 1861, os cristãos promoviam o auto-de-fé de Barcelona no seqüestro e queima de livros espíritas por ordem do bispo.
Atos dos Apóstolos. Paulo de Tarso 19.19. Também muitos dos que seguiam artes mágicas trouxeram os seus livros e os queimaram na presença de todos, e, feita a conta do seu preço, acharam que montava a cinqüenta mil peças de prata.
Nesta época engatinhava a anatomia, a histologia e a citologia era sonhada. Quando mais pensar em biologia molecular (DNA-RNA) ou genética: a fronteira da ‘complexidade irredutível’, em outras palavras. Só se conseguiu conquistar o pólo Norte, em 1909, pelo norte-americano Robert Peary. A Conquista do pólo sul há apenas 95 anos. Época que nem se imaginava a existência de proteínas, nem se sabia porque se formava o vinho. Lá estavam os religiosos alegando a ‘complexidade irredutível’. Os mecanismos moleculares era um desafio. Terapias antibióticas ou genéticas das doenças de Deus (ou do inventado diabo) eram inexistentes. O astronauta russo Yuri Gagarin (primeiro homem a viajar pelo espaço) chegou à terra, testemunhou naquela fronteira: ‘A terra é azul e eu não vi Deus.’ (Não relatou na época, mas também não havia sinal do corpo de carne e osso com que profetas e Jesus teria subido aos céus, para fazer o que com ele, não se sabe.) Os americanos na Lua também desvendaram esta fronteira sem acharem evidência deste desenhista por lá. Também temos os negadores do pouso na lua.
Vida superior e inteligente
Extremófilos, organismos unicelulares (bactérias e arqueobactérias) a recém estão sendo descobertos. Arqueologia era tarefa para curiosos e hoje é uma profissão acadêmica. A complexidade da natureza que era necessária ainda descobrir que hoje acham divinamente intransponíveis ir além desta nova fronteira da ‘complexidade irredutível’. O conhecimento se expande há séculos, mas o argumento se mantém o mesmo. A derradeira fronteira, a montanha definitiva em que se esconde realmente Deus e deuses. O desenhista da verdadeira ‘complexidade irredutível’. Aquela época a vida existia do nada, da geração espontânea… Hoje, que a vida só Deus é capaz de criá-la com as mãos. A fronteira ‘atual’ que Deus escolheu se esconder, depois de tantos milênios a nos decepcionar. Esta é a mente do leigo. De que hoje a ciência sabe menos do que no século 19. E que deva se socorrer da Bíblia (apenas para fundamentalistas) para descobrir novidades. O único livro de passo certo na humanidade. A única mitologia que não é igual às outras de igual criação. Mesmo quando a mesma mente, erra, estimula a intolerância e o ódio, fantasia incomensuravelmente. Normal para uma criação mitológica de um povo, mas falsa como base de realidade e verdade. Dois dos mosqueteiros, o pastor Douglas Reis e o jornalista Michelson Borges escrevem loas aos genocídios gozosos de Deus para convencer as crianças esta necessidade, que usam para sua catequese fazendo lavagem cerebral para os futuros fundamentalistas. Ensinando que matar infiéis é bem visto pelo Deus judeu, agora dos cristãos. Que se cuidem, crianças. ‘Um Deus sanguinário?’ e ‘A destruição dos cananeus‘. Está ali. Ensinando crianças que existem genocídios necessários! Crianças da oitava série! E atribuem a Darwin o holocausto, de 1939-1945, ocorrido na Alemanha cristã.
O astrônomo Camille Flamarion, o professor Hippolyte Léon Denizard Rivail, Alfred Russel Wallace, o evolucionista, Sir William Crookes, químico e físico, Pierre e Marie Curie, Conan Doyle e tantos outros afirmavam a existência da comunicação espiritual com os mortos e vivos, nesta época. A existência de vida superior e inteligente nos planetas solares, a pluralidade dos mundos habitados no sistema solar, previsões que nunca se confirmaram. Cientistas igualmente cegados pela religião e pela fé não é novidade na história da ciência.
As provas da existência de Deus
Assim como aconteceu com Galileu Galilei (1564-1642), o governante mongol Ulugh Beg (1394-1449), criador do observatório astronômico e a Madrasa em Samarcanda em 1420, foi destituído, perseguido e morto pelo Islã ortodoxo fundamentalista.
Seus pecados imperdoáveis foram aceitar tanto moças como rapazes na escola (uma blasfêmia contra Alá ensinar mulheres), investigar a natureza e descobrir seus ‘segredos’ e mecanismos.
Tudo o que um muçulmano precisava conhecer já era conhecido e já estava escrito no Alcorão e no Hadith (Tradições). Quem queria saber mais estava tentando se apoderar dos segredos de Alá.
Assim os espíritas, homeopatas, esotéricos, propositores de alternativas ao conhecimento científico e médico, também clamam pela falta de dialogo, a perseguição pela academia, a ciência ‘tradicional’, a ciência ‘oficial’, a busca da discussão pela propaganda fora das universidades, como Samuel Hahnemann, o Marquês de Puységur, Barão Du Potet, diretor do Journal du Magnétisme, e o sábio Joseph Philippe François Deleuze, por exemplo. Até hoje continuam vivos pela fé, mesmo tendo as suas afirmações não confirmadas.
Pelo menos Allan Kardec nunca pregou o genocídio gozoso e advertiu seus seguidores, se entre o espiritismo e a ciência houvesse divergência, que se aceitasse a última.
Para não colocar uma visão sobre o conhecimento desenvolvido por David Hume (1711-1776), em 1748 – publicou Investigação sobre o Entendimento Humano. E Immanuel Kant, (1724-1804), com Crítica da Razão Pura (Kritik der reinen Vernunft), publicada inicialmente em 1781. Sugiro ao leitor este texto resumido da essência do conhecimento destes autores. Kant desmontou as cinco provas da existência de Deus de Sto. Thomas de Aquino.
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Médico, Porto Alegre, RS