Thursday, 19 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

O trabalho acadêmico e o plágio

Algumas coisas chamam a atenção quando fogem da regularidade. Foi o que se pode perceber durante este mês de setembro de 2009. Por duas vezes, em uma mesma emissora e um mesmo programa jornalístico, enfatizou-se a questão das compras de monografias.

A monografia tem sido o ‘calcanhar de Aquiles’ de muitos estudantes, coisa percebida no ambiente acadêmico nas últimas décadas. Na verdade, ela sempre foi uma profunda dor de cabeça para muitos. Mas o que vem chamando a atenção para tal é o fator de que, atualmente, muitos desses trabalhos estão sendo acusados de plágio. Um fator interessante em todo esse contexto é que pouco se fala nas condições em que os alunos dos cursos de graduação estão envolvidos, no que diz respeito aos aspectos legais, educacionais, à compreensão da natureza do trabalho acadêmico, culturais e tecnológicos.

Em relação ao plágio, ele se caracteriza (conforme Lei nº 9.610 de 19/02/1998) consistentemente pelo uso não autorizado ou não referenciado pelo pesquisador. Quando a lei expressa ‘a proteção recairá sobre a forma literária ou artística, não abrangendo o seu conteúdo científico ou técnico, sem prejuízo dos direitos que protegem os demais campos da propriedade imaterial’. Com isso a materialização de uma obra científica é apoderada pelo autor a partir de sua configuração, ou seja, o texto em si. Apropriação desse texto (inciso I, Art. 7, Lei 9.610) configura a apropriação indébita. Porém, o Art. 108, quando trata das punições reza ‘Quem,[…] deixar de indicar ou de anunciar, como tal, o nome, pseudônimo ou sinal convencional do autor e do intérprete, além de responder por danos morais, está obrigado a divulgar-lhes a identidade […]’. Dentro desse aspecto, o trabalho acadêmico, seguindo os critérios da ABNT – NBR 6023, eximir-se-á do plágio pelo uso orientado dos textos fidedignos de pesquisa.

Consciência e importância

A produção do trabalho acadêmico tem por objetivo inserir o aluno à pesquisa. Ele advém dos ‘recortes’ (recortes aqui são aqueles que se apresentam nos trabalhos acadêmicos, em formato de citação, e aparecem devidamente referenciados) de pesquisas já efetivadas por pesquisadores já inseridos no processo pesquisa.

O que dá caráter científico a um trabalho é exatamente sua fundamentação, que faz uso de uma metodologia própria de pesquisa e se apodera de um objeto manipulável e com regularidades. A materialidade da pesquisa consiste na coleta de dados feita pelo pesquisador, seja pela observação laboratorial, com recursos às literaturas ou feita em campo.

O laboratório, a literatura e o campo nunca estiveram tão próximos aos pesquisadores como agora. De que forma? Pelos meios digitais, especificamente pela internet. Tempo e espaço estão reduzidos ao ‘click’. O aluno que está sendo inserido no campo da pesquisa deve ter construído em si a importância do trabalho acadêmico, principalmente a monografia. Sem a consciência da utilidade acontece a banalização e a desconsideração. Sendo assim, fica muito fácil, e até uma ‘tentação’ para o aluno, desassistido, buscar outros meios para efetivar ‘seu’ trabalho. A consciência e importância do trabalho acadêmico devem iniciar sua construção desde o primeiro momento que o aluno se insere no ambiente acadêmico e acompanhado até a sua saída.

Pertinência e metodologia

A monografia deve ser encarada como a primeira especialização do aluno, sabendo que é, a partir do tema proposto, ela que o orientará no que diz respeito às suas futuras investidas acadêmicas. Caso o aluno ignore essa condição, dificilmente terá sucesso após sua formação. Sem querer poetizar, o trabalho acadêmico deve produzir no aluno o sentimento de quem pintou um belo quadro, obra única (fazendo uso de tintas produzidas por outros, mas misturadas por criatividade única), ou escreveu uma poesia, sentimento único (fazendo usa de palavras utilizadas por outros, mas com articulações únicas), essa é a autenticidade do trabalho acadêmico. Para muitos o término da monografia e sua apresentação à banca examinadora já foi considerado um rito de passagem, mais significativa do que a colação de grau ou a recebimento do diploma.

Não se pode ignorar que as Instituições de Ensino Superior (algumas delas) deixam de assumir compromisso com o aluno, ou seja, não cumprem o papel educacional. Isso está claro, é só vermos as condições em que alguns alunos saem ‘formados’ de certas faculdades e universidades. É de toda compreensão que as responsabilidades são recíprocas. Mas a questão maior é que, mesmo o colegiado e o setor pedagógico vendo a situação de descaso em que certos alunos encaram a graduação, ignoram. Parece que o que mais importa para essas Instituições de ensino são as ‘mensalidades quitadas’. Mensalidade quitada está virando sinônimo de ‘formação continuada’.

Se há um acompanhamento do aluno da definição do tema para o projeto, questionamentos sobre a pertinência do tema, a proposição metodológica e o desenvolvimento seqüencial e assistido por um orientador, dificilmente ele se ocupará com a desonestidade de se apropriar indebitamente da produção intelectual de outro.

Regras e fiscalização

Ignorar a figura do orientador, para conter gastos também é imoral, assim como ir à internet e copiar alguma coisa para enxertar um trabalho (apesar da lei do mercado sustentar que a contenção de gastos é justa). A regra do mercado educacional é ‘quanto mais tempo o aluno gasta em sala de aula, ou sendo assistido, maior será o gasto, que é igual a prejuízo’. Mas as regras da educação e da pedagogia são ‘orientar e facilitar até que se consolide o processo ensino-aprendizagem’.

Retirar dos cursos de graduação o TCC ou os artigos periódicos, como meios de avaliação, também não será uma postura responsável, eles ainda são um meio possível, dentro de nosso contexto, de produzir um profissional ou pesquisador envolvido com as questões de imanência de sua formação.

Seria justo que o MEC fiscalizasse mais, tanto as IES, no que diz respeito à qualidade de serviços educacionais, não usando apenas como critério a instalação física e a titulação do corpo docente, mas tudo o que envolve o compromisso educacional; como também às produções acadêmicas de conclusão de curso. Pelo MEC seria o caminho que, imparcialmente, alcançaria tanto que o que explora a necessidade comercial do ensino como o que se serve dela. Existem regras? Sim. Uma porção delas, expressas nas portarias no MEC. Existe fiscalização? Não. O mercado educacional, no que diz respeito à seriedade que se deve dar à formação das pessoas e à fiscalização, é ‘terra de ninguém’.

******

Cientista da religião, especialista em docência para o Ensino Superior e Psicopedagogia – Bandeirantes, Cariacica, ES