Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Ousadia ao extremo

Um bombardeio atinge a capital do Iraque, Bagdá. Em 16 de janeiro de 1991, os Estados Unidos entraram em guerra com o país. Dentro de um dos apartamentos do hotel Al-Rasheed, na zona oeste da maior cidade iraquiana, somente uma equipe de jornalistas conseguiu transmitir, ao vivo, todo o ataque. Este é o ponto alto do filme Ao vivo de Bagdá (Live From Baghdad, 109 minutos, direção de Mick Jackson, , 2002).

Para que a rede de televisão norte-americana CNN conseguisse tal feito, os produtores Robert Wiener (Michael Keaton) e Ingrid Formanek (Helena Bonham Carter) aterrissaram seis meses antes em solo iraquiano. Juntamente com o cinegrafista Mark Biello, a técnica de áudio Judy Parker e o correspondente Tom Murphy, mais tarde substituído por Richard Roth, o grupo investigou as ações do presidente Saddam Hussein. A intenção era dar o maior furo jornalístico da emissora: uma entrevista exclusiva com o líder iraquiano.

Wiener fez contato com o diretor do Ministério da Informação do Iraque, Naji Al-Hadithi, e criou um laço de amizade com ele. Por conta disso, o jornalista conseguiu a liberação para o uso de um four-wire, um sistema de telefonia que permitia contato direto e ao vivo com Atlanta, a sede da CNN.

Prêmios Emmy

Em outubro de 1990, a rede transmite uma entrevista com o presidente. Entretanto, a briga entre norte-americanos e iraquianos se torna mais acirrada. Os Estados Unidos exigem que o Iraque se retire do Kuwait, mas este se recusa, alegando roubo de petróleo. Quinze de janeiro de 1991 foi o prazo dado pelos ianques para que o Iraque recuasse. Como isso não aconteceu, o ataque se iniciou.

Grande parte das outras emissoras já havia se retirado do país. E como só a CNN possuía o four-wire, foi a única a transmitir os bombardeios no mesmo instante em que aconteciam. Robert e sua equipe conseguiram um furo ainda maior. A cobertura impactante atraiu a atenção do mundo por causa dos relatos precisos dos âncoras Bernard Shaw, Peter Arnett e John Holliman, que também estavam no local.

Ao vivo de Bagdá ganhou três prêmios Emmy, nas categorias de Melhor Elenco, Melhor Edição e Melhor Mixagem de Som. Recebeu ainda sete outras indicações: Melhor Diretor, Melhor Atriz (Helena Bonham Carter), Melhor Direção de Arte, Melhor Fotografia, Melhor Roteiro e Melhor Edição de Som. No Globo de Ouro, também foi indicado em três categorias: Melhor Filme para TV/Mini-série, Melhor Ator – Filme para TV/Mini-série (Michael Keaton) e Melhor Atriz – Filme para TV/Mini-série (Helena Bonham Carter).

‘Não resolvemos problemas…’

O filme retrata dois fatos importantes no jornalismo: a ousadia e a determinação de levar a informação à sociedade. Antes de partir para Bagdá, Robert disse aos seus superiores a seguinte frase: ‘Estar lá, em meio a uma guerra, transmitindo ao vivo atrás das linhas do inimigo, é o equivalente jornalístico a pisar na lua.’

Em outras palavras, a satisfação de um profissional de comunicação ao conseguir tal façanha não tem valor estimado. Mas, para que isto seja possível, é preciso ter coragem e a mesma ousadia desses jornalistas.

O segundo ponto está relacionado à decisão de levar informações significativas para a população. Num diálogo entre os produtores Ingrid e Robert, eles discutem sobre a real função das reportagens que estavam realizando. A produtora afirma:

– Estão falando por meio de nós agora, ambos os lados. Estão falando pela CNN.

– Sim, estão falando, mas não estão ouvindo. O que estamos fazendo aqui?

– É o nosso trabalho.

– É mesmo? Pegar declarações? Pegamos uma declaração do Saddam, pegamos uma declaração do Bush. Não é o suficiente.

– Não confia mais no público?

– Precisamos dar as ferramentas para que entendam, é o nosso papel.

– Não resolvemos os problemas do mundo, nós os relatamos.

– Então tudo se resume a isto? Manter as câmeras gravando enquanto as bombas caem? Belo trabalho.

Se o jornalista decidir cumprir a sua função, não irá apenas descrever os acontecimentos. Ele vai mostrar ao público a verdade e fazer com que ela seja refletida. Será ousado ao extremo. Ousado por estar à frente na guerra, ousado por estar à frente da concorrência dos outros veículos de comunicação e ousado por prezar o direito à informação de qualidade.

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Estudante de Jornalismo no Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp), editora-assistente do Canal da Imprensa