Uma espécie está em extinção nas redações: o revisor. Por conta disso e de outros fatores, todos os dias, dezenas de erros escapam dos olhares atentos dos editores e chegam aos leitores nas páginas dos jornais. O Monitor de Mídia passou um pente-fino nas edições de um único dia para ver até que ponto os erros comprometem a qualidade dos jornais.
A exemplo do que fizemos na Edição nº 10, de 1º de março de 2002, analisamos criteriosamente a edição do dia 19 de setembro passado, uma segunda-feira. Os pesquisadores foram da primeira à última página do Diário Catarinense, de A Notícia e do Jornal de Santa Catarina, sinalizando possíveis erros. Todos os textos do conteúdo editorial foram lidos, e só foram desprezados anúncios e classificados porque esses fogem ao controle da Redação. É claro que a análise feita num único dia não tem a pretensão de esgotar o assunto nem um caráter científico determinista, de forma a sermos definitivos na questão da qualidade dos jornais. No entanto, esse procedimento traz pistas importantes para a compreensão do assunto. Note o leitor que a análise a seguir debruçou-se apenas na correção gramatical, deixando de lado erros de edição, equívocos de informação e outras derrapagens.
De maneira geral, e infelizmente, pouco ou quase nada mudou em três anos e meio nos jornais. Conforme apontamos em março de 2002, os produtos chegam aos leitores recheados de erros de pontuação, acentuação, ortografia e digitação, entre outros. Os erros gramaticais não são os únicos; há outros mais comprometedores, como os de informação – para um detalhamento maior, leia pesquisa sobre os erros nos jornais catarinenses –, mas a credibilidade de jornais e jornalistas é minada já na própria superfície do texto. Mas se o repórter grafa mal uma expressão, o que garantirá que sua apuração foi mais atenta?
As ocorrências em A Notícia
Os erros de concordância nominal estiveram em alta ao longo da edição do dia 19/09, começando na editoria de Opinião no artigo ‘Mulheres Cooperativistas’: ‘… nas 292 sociedade filiadas…’. Na editoria de Política, em ‘Catarinenses também foram às urnas’, identificamos o trecho ‘… os petista voltam às urnas no dia 9 de outubro’. Mais adiante, no caderno Anexo, a matéria que discorria sobre o ensino de uma segunda língua nas escolas citou que ‘… 34 escolas vai oferecer…’, esquecendo a flexão do verbo.
Na editoria de Segurança, na matéria ‘Quinze adolescentes fogem de centro educacional’, foram citadas ‘As câmaras de vigilância…’ do local; em um conflito no Paraná, ‘A calma só voltou no começo da manhã de ontem, com chegada de 60 homens do pelotão de choque…’ dispensando o artigo a antes de ‘chegada’; em nota sobre acidentes de trânsito, foi possível encontrar a denominação ‘camionete’ enquanto que em matéria anterior o substantivo estava escrito corretamente (caminhonete).
Na editoria Geral, a repetição de local em ‘O local do encontro ainda não tem local definido’ poderia ter sido evitada com a seguinte construção, por exemplo: o local do encontro ainda não foi definido.
No Anexo, a legenda de uma das fotos indicava como ‘mandades’ os atos cometidos pela personagem de Fernanda Machado na telenovela ‘Alma Gêmea’, por seu significado não estar presente em dicionários acredita-se que a legenda pretendia se referir às ‘maldades’ da moça na trama. Na mesma seção, um novo erro que pode ser visto como falha de digitação: no resumo de Malhação, onde um personagem disse que ‘merece uma mesa reservada no Giba’. Acontece que o nome da lanchonete da novelinha é Giga Byte.
A grande campeã de erros dessa edição foi a editoria Dinheiro, onde ocorreram falhas de digitação como: ‘… possível.:O problema’; ‘… trabalhadores desempregados estão receber os salários do seguro desemprego…’; ‘…ano. é grande a expectativa…’. Falhas na concordância nominal também ocorreram nas páginas de Economia, como em ‘… centenas de postos de trabalho fosse fechados…’ e ‘…próximas reunião do Copom’.
A coluna ‘Informal’ do ANEsporte enfatizou a utilização de pronomes oblíquos pós-postos ao verbo nem sempre em situações corretas e deixou a desejar com: ‘E não demorou a somar seu a abrir o placar’. Em ‘Grêmio convoca o torcedor’ na página 7, ‘o Dirigente revelou, ainda, que já está sendo projetando o retorno ao grupo principal’ assim, acredita-se que o retorno já está sendo projetado.
No Diário Catarinense…
O DC apresentou mais erros quanto à digitação, ‘engolindo’ palavras, ou esquecendo de colocá-las, equivocando-se com artigos, preposições e conjunções. Nada que uma boa revisão não resolvesse grande parte do problema. Por exemplo, em uma única frase, foram encontrados vários erros na matéria ‘PT faz balanço das eleições internas’. A segunda frase após o lead era: ‘Segundo os organizadores, mais de 825 mil militantes PT estavam aptos para votar na eleição para a escolher o novo diretório nacional do partido e s representantes…’
Na matéria de indicadores econômicos, p.16, o lead informa: ‘A decisão do Comitê de Política Monetária (COPOM) cortar os juros depois..’ a preposição de pode e deve ser repetida. Ainda na mesma matéria, o último parágrafo traz: ‘…os preços do petróleo continua preocupando o mercado’, onde o verbo não é flexionado. Na p. 23, a matéria sobre meio ambiente, veio com o trecho: ‘O maior temor dos especialistas é que o Ártico esteja a ponto de alcançar um ponto de não retorno…’. Sem comentários.
Sobre a apuração de votos no Afeganistão, na matéria da p.25, o trecho veio sem o verbo de ligação. Veja: ‘a previsão é de que os votos sejam enviados hoje aos centros de aprovação de cada província, onde começarão a contados’.
A campeã de erros foi a editoria de Esportes. Se nos apegarmos a cada detalhe, teríamos uma lista generosa de erros a citar. Frases como: ‘..que cumpriam suspensão, ficam novamente à disposiça.’ e ‘Já o goleiro Gilmar, que passou por uma cirurgia para na mão direita..’ são encontradas numa mesma matéria.
Algumas no Jornal de Santa Catarina
Na ‘Opinião da RBS’, o Santa trouxe o artigo ‘Sucessão da Câmara’, onde se leu ‘os aspectos deplorável’ da crise política. Encontramos ainda neologismos como ‘exacerbamento’ e trechos pouco claros, como o que se segue: ‘O país não pode estender por mais tempo que o necessário esse processo do qual precisa sair mais ético e com a democracia fortalecida’. Entendeu? Como não?!
Em ‘PF investiga os negócios da Natimar’, num depoimento do empresário Carlos Alberto Quaglia, há uma redundância na explicação do elo das denúncias com sua empresa de Florianópolis: ‘segundo ele próprio’ (!)
Esses títulos…
A Notícia, 15/09/2005, p. B1: ‘Bochófila do Oeste representa Brasil nos EUA’. A propósito: bochófila é alguém do sexo feminino que aprecia ou joga bocha.
A Notícia, 24/09/2005, p. A8: ‘Universidades aceita substituir Provão’. Não flexionam mais o verbo quando o sujeito é plural?
Cadê os acentos de crase em ‘Policiais matam homem que reage a prisão’ (A Notícia, 23/09/2005, p. A10) e em ’42 mil assistem a vitória de Cacá Bueno’ (A Notícia, 19/09/2005)?
Mínimos detalhes
Na edição de 17 de setembro, o Diário Catarinense mostrou a blitz do Grupo de Operações Especiais da Polícia Militar. Na ação, a polícia buscou vítimas e aliciadores de menores. Na matéria ‘Prostituição de adolescentes está no alvo’, histórias e números de jovens prostitutas estão juntos com o esquema da ação. A publicação contou com um infográfico expondo os equipamentos do grupo de operações. Um arsenal um tanto que exagerado para a situação, assim como uma informação que pouco acrescentou à matéria.
Musas
No meio de tantos escândalos envolvendo figuras de paletó e gravata, os jornais catarinenses também viram beleza na situação. Cotadas pelas principais revistas masculinas, não faltaram musas para as CPIs. A mulher do empresário Sebastião Buani, Diana, foi citada em meio a muitas matérias dos três jornais. No Jornal de Santa Catarina, no dia 16, ‘Beleza sem Crise’ trata da ‘beleza que desponta no meio da lama’, e a protagonista é a filha de Roberto Jefferson, Cristiane Brasil. Junto à matéria, uma foto da moça com a alça da blusa caída, displicentemente. Já o Diário Catarinense mostra, além da beleza, a opinião de Teresa Collor acerca dos fatos em Brasília. Nessa matéria também, uma foto de Teresa ‘bem à vontade’, digamos.
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