Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Tecnologia e ciência em pauta?

Em geral, os espaços da mídia brasileira são ocupados com escândalos, instabilidade da economia, corrupção dos políticos, seqüestros, roubos, assassinatos e futebol. Pouco sobra para assuntos fora da pauta de exceção, como a ciência e a tecnologia. Os principais periódicos de Santa Catarina não são diferentes – dispõem de pouquíssimo espaço para a divulgação de pesquisas e descobertas.

Com esse pressuposto, o Monitor de Mídia analisou as edições de 26 a 31/05 dos jornais A Notícia, Diário Catarinense e Jornal de Santa Catarina para constatar o quanto de Ciência e Tecnologia é publicado em suas páginas. Não deixe também de conferir as colunas Ciência e Tecnomídia, dedicadas para os assuntos por aquí.

Os jornais simplesmente acompanham os poucos incentivos que estas áreas encontram no país. Por outro lado, como parece não haver uma preocupação em aumentar a divulgação desse tipo de conhecimento, o cidadão comum torna-se cada vez menos informado ou então mal servido desse tipo de reportagem.

A Notícia divulga

Na edição de sábado, 26/05, A Notícia publicou a chamada de capa ‘População do País cresce quatro vezes em 60 anos’. Sob a cartola ‘Pesquisa IBGE’, o texto intitulado ‘População quatro vezes maior’ relatou o crescimento da população que passou de 41,2 mi em 1940 para 169,9 mi em 2000. A matéria apareceu na editoria Geral e não era assinada; a cidade de procedência era o Rio de Janeiro. Ainda nesta mesma editoria, com a mesma cidade de origem – e também sem assinatura – foi publicado o texto intitulado ‘Mais de 60% ligam câncer à morte’, sob a cartola ‘Saúde’.

No dia 27/05, domingo, o AN publicou no ‘Anexo D’, uma série de textos referentes ao tema Ciência e Tecnologia. A manchete do anexo já indicou uma matéria de cinco páginas, intitulada ‘Sonho em cápsulas’. O texto assinado por Betina Weber foi publicado na editoria ‘Bem-estar’. A reportagem apresentou entrevistas com cinco especialistas em remédios para emagrecer. Ainda neste mesmo caderno, na editoria ‘Saúde’, foi publicada a matéria não-assinada ‘Sem perder a pose’. O texto deu dicas de como mudar a postura e prevenir problemas na coluna.

Na seção ‘Games’, os leitores puderam encontrar informações sobre os jogos ‘Super Mario’, ‘Winning Eleven’ e ‘Starcraft 2’. Na editoria ‘Mil coisas’, várias notinhas sobre novas tecnologias foram publicadas (cosméticos, celulares, internet…). Neste caso, os produtos foram apresentados de forma comercial, bem como no ‘AN Economia’ com a matéria ‘O bloco de anotações que congela’. O texto descreveu a nova geladeira que agrega várias funções, além da refrigeração. No ‘AN Digital’, foi publicado o texto intitulado ‘A internet como segunda casa’, que apresentou serviços que permitem personalizar a porta de entrada na web. Nenhuma das matérias foi assinada.

Na edição de segunda-feira nada de ciência ou de tecnologia foi divulgado.

Na terça-feira, 29/05, foram publicadas na contracapa as matérias ‘Pesquisadores querem criar remédio e vacina mais baratos’ e ‘Experiências são testadas em macacos’ sob o título principal ‘Nova geração de transgênicos’. O texto foi retirado do jornal britânico ‘The Guardian’ e relatou que está sendo desenvolvido em Londres o uso de folhas de tabaco para criação de drogas contra o HIV.

Na quarta-feira, apenas uma foto-legenda foi publicada: ‘Ave rara’. A imagem era de um pica-pau branco descoberto em Incheon, Coréia do Sul. A ave é resultado de uma mutação que ocorre uma vez a cada milhão de anos.

Em 31/05, o AN publicou na editoria ‘Geral’ sob a cartola ‘Dia mundial sem tabaco’ a matéria ‘Dez razões para largar o cigarro’. Ela mostrou que especialistas na área estão adotando nova tática para que seus pacientes abandonem o vício. A retranca não possuía procedência.

Diário Catarinense restringe

O Diário Catarinense não possui uma editoria fixa dedicada aos temas de ciência e tecnologia. Normalmente, publica tais matérias na editoria ‘Geral’, como ocorreu na edição de 26/05 com a retranca ‘Florianopolitano conhece os riscos do câncer’, sob a cartola ‘Saúde’. O mesmo aconteceu em 27/05, com a matéria ‘Como enfrentar o efeito estufa’.

 Já na publicação de 28/05, o DC divulgou o caderno ‘Eureka!’, como o faz em todas as segundas-feiras, especializado em matérias sobre ciência e sobre tecnologia. Na mesma edição havia uma seção inteira dedicada ao tema saúde, a única contabilizada durante o período de análise. Outro fato a ser destacado é que nem a matéria principal ‘Futuro sem insulina’, nem as notas publicadas nessa editoria, eram assinadas ou apresentavam procedência.

Na edição de 29/05, o jornal apresentou o caderno ‘Especial’, de uma página, que teve como tema a ciência, ao apresentar toda obra do botânico sueco Carl Linnaeus.

As publicações de 30 e 31/05 não apresentaram conteúdo acerca dos temas analisados.

O DC proporcionou um número maior de matérias a respeito de saúde do que tecnologia, apesar desse espaço ser ainda muito pequeno. Isto é uma pena, pois os leitores que se interessam por essa área ficam praticamente sem subsídios ao lerem o jornal.

Jornal de Santa Catarina assume tom comercial

Na edição conjunta do final de semana (26 e 27/05), todos os textos relacionados a Ciência e Tecnologia foram publicados no ‘Classi Santa’. A pequena matéria ‘Pastilhas podem oferecer perigo’ foi publicada na editoria ‘Veículos’, sob a cartola ‘Mecânica veicular’. Na editoria ‘Produtos e Serviços’, as matérias ‘TV na internet é a aposta da vez’ e ‘No novo serviço, quem comanda a cena é o usuário’ saíram sob a cartola ‘Revolução digital’. Neste mesmo encarte, outra matéria ainda foi publicada: ‘Novos projetos acendem polêmica sobre privacidade’ – sob a cartola ‘Tecnologia da informação’. A cidade de procedência era Londres e a retranca não era assinada. Ou seja, os lançamentos tecnológicos foram apresentados como complemento ao conteúdo comercial. Os produtos são tratados como objetos de um catálogo de compras.

No dia 28/05, a cartola ‘Pesquisa Médica’ deu introdução à matéria ‘Alimentos que protegem’, que descreveu como o consumo de peixe e maçã durante a gravidez contribui para que o bebê fique protegido contra asmas e alergias. A matéria era assinada por Gisele Kakuta e foi publicada no anexo ‘Vida’. Ainda neste mesmo encarte, o artigo ‘Formigamento nas mãos’, do neurologista Cezar Zillig, explicou a STC – Síndrome do Túnel do Carpo.

Nas edições dos dias 29 e 30/05, nada foi divulgado sobre este tema.

No dia 31/05, mais uma vez a tecnologia veio em forma de catálogo de compras no anexo ‘Sobre rodas’. As matérias ‘Agora bicombustível’ e ‘Mais bala na agulha’ apresentaram as novas tecnologias incorporadas ao Corolla e Fielder e o novo modelo do cupê alemão Audi TT, respectivamente. Sob a cartola ‘Duas rodas’, a matéria ‘Tecnologia em seu mais alto nível’ apresentou a Honda GL 1800 Gold Wing.

E com a soma dos fatores…

Os jornais diários teriam um grande impacto sobre a sociedade se conferissem maior visibilidade aos temas de divulgação científica e tecnológica. É evidente que há uma distância entre os jornalistas e a academia e isso inibe os pesquisadores de se aproximarem dos jornais. Por outro lado, parece haver também um receio dos jornalistas em relação aos pesquisadores e a outros setores que produzem conhecimento.
A divulgação científica é extremamente importante. O caso dos produtos transgênicos no Brasil e no mundo, por exemplo, tornaram-se mais conhecidos e criaram uma discussão sobre seus benefícios ou malefícios em virtude da ampla divulgação.

Os jornais deveriam analisar e debater temas de Ciência e Tecnologia e sua relação com o desenvolvimento econômico, social e cultural. Questões como inovação científica, relação entre universidade e empresa e a situação da pesquisa (e dos institutos de pesquisa) em Santa Catarina e no Brasil são pautas relevantes mas se mantêm distantes do dia-a-dia dos periódicos. Além do interesse público que cerca o tema, a tecnologia é a base da vida no mundo atual. Novidades sobre computadores, celulares, máquinas digitais, jogos, MP4, etc são atrativos de primeira para conquistar o público distante dos jornais impressos e cativar os que já se arriscam em suas páginas.

Espaço de autocrítica nos jornais

O Conselho do Leitor é um instrumento de controle de qualidade nos jornais. Ele é a projeção da voz dos leitores, repercutidas nas rotinas da redação. Dos três jornais catarinenses, o Diário Catarinense e o Jornal de Santa Catarina dedicam espaço para a discussão das idéias. O Monitor de Mídia, a exemplo de ‘Um balanço do Conselho do Leitor‘ e do diagnóstico nº 80, conferiu como a opinião deste conselho repercute em cada jornal.

Diário Catarinense apresenta novo conselho

O Diário Catarinense não divulgou neste mês a coluna ‘Conselho do Leitor’. Foi publicada apenas a matéria ‘Mais perto das notícias’, em 13/05 na editoria ‘Geral’. Ela apresentou a nova equipe de conselheiros do periódico, que é composta por oito homens e uma mulher, os quais foram escolhidos de acordo com os seus currículos, participação no debates promovidos pelo periódico e envio de cartas ao DC. O primeiro encontro da 4° formação ocorreu no dia 07/05 e foi presidido por Cláudio Thomas, editor-chefe do jornal. Os conselheiros terão a oportunidade de aprender como ocorre o processo de produção da notícia e conhecer os colunistas, repórteres e editores do jornal. O objetivo do conselho é fazer uma análise crítica do periódico, apontando seus acertos e falhas, sempre com o intuito de que este melhore a cada edição. Resta agora esperar que essas impressões sejam publicadas.

Conselheiros não dão trégua ao Santa

O ‘Conselho do Leitor’ do Jornal de Santa Catarina atualmente é formado por nove integrantes, que se reúnem com profissionais do jornal a cada três semanas para discutir melhorias, fazer críticas e sugestões.

Formam o grupo: Célio Luiz Waldrich, empresário; Célio Roberto Standke, analista de informática; Juanes Alves de Campos, representante comercial; Klaus Rehfeldt, economista aposentado; Mariana Florêncio, designer gráfico; Mário Sérgio de Oliveira, motorista; Ricardo Pimenta, bacharel em Turismo; Sueli Sprung, secretária; e Susete Santos de Novaes, microempresária aposentada. Eles têm mandato de nove meses.

O Santa ainda disponibiliza um e-mail (conselhodoleitor@santa.com.br) para contribuições do público.

Neste mês, a coluna foi publicada na edição conjunta do final de semana (26 e 27/05) sob o título ‘Conselho debate com o editor-chefe’. Questões como ‘Internacional’, ‘Esporte’, ‘Opinião’ e ‘Política’ estiveram em pauta.

Os conselheiros questionaram o pequeno espaço dedicado costumeiramente à editoria ‘Mundo’ e o porquê de a cobertura da viagem do prefeito João Paulo Kleinübing à Alemanha ter sido menor do que a da viagem do governador Luiz Henrique da Silveira. Além disso, pediram mais atenção ao esporte amador nas páginas da editoria ‘Esportes’, pois, segundo eles, o periódico privilegia o futebol.

O pequeno espaço dedicado ao editorial ‘Opinião do Santa’ também foi criticado, bem como a coluna de Moacir Pereira – que foi considerada ‘não muito interessante para os leitores do Vale do Itajaí’.

De acordo com o editor-chefe Edgar Gonçalves Jr., todos os temas discutidos estão sendo estudados. Ao que parece, o conselho do Santa realmente critica o jornal quando necessário. O grupo não ‘rasga seda’ e está preocupado com a satisfação dos leitores.

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Cultura popular não é cultura

Valquíria Michela John (*)

Gustavo Cortês, em seu livro Dança Brasil! explica que a Festa do Divino é uma comemoração européia. Sua origem, conforme o autor, foi instituída pela rainha Isabel, casada com o rei Dom Dinis, o lavrador, na cidade de Alenquer (Portugal), onde foi construída uma igreja em homenagem ao Divino Espírito Santo, no início do século XIV.

A Festa do Divino chegou ao Brasil com os imigrantes europeus, espalhando-se pelo país, principalmente no litoral, por meio dos imigrantes açorianos. Está mais presente nos estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Santa Catarina; é realizada no período de pentecostes (entre maio e junho).

Em Santa Catarina, a Festa do Divino está mais presente no litoral, com destaque para as cidades de Penha e Florianópolis, esta última, a mais antiga do estado, com mais de 200 anos de celebração.

No período que variou entre 20 e 28 de maio, as festividades do divino estiveram novamente presentes no estado, mas, infelizmente, não estiveram presentes nos diários catarinenses. Apesar de demonstrarem a importância do legado religioso nas cidades com maior influência da cultura açoriana, o jornal A Notícia sequer mencionou as festas nos dias do auge da comemoração (26, 27 e 28/05), quando chegava ao final mais uma celebração. Nem mesmo a festa no Balneário de Penha, com 171 anos de tradição, na área de abrangência do AN, mereceu destaque.

No Jornal de Santa Catarina a situação não foi muito diferente. Com uma única matéria, publicada na edição de 26 e 27/05, o jornal apenas descreveu a programação das festas em Blumenau, Penha e Camboriú. Embora o título da matéria prometesse ir além do agendamento, ‘Festas do divino reúnem tradição e fé’, o enfoque ficou para: ‘(…) os cantores de Deus, que acompanham o padre Zezinho, se apresentarão em Blumenau’.

Pois bem, mas pelo menos o jornal sediado na capital do estado haveria de trazer textos referentes a, senão todas as celebrações realizadas, pelo menos à festa em Florianópolis, com seus mais de 200 anos de tradição, certo? Sim, o Diário Catarinense destacou a Festa do Divino de Florianópolis no final de semana de seu encerramento. Ponto para o DC? Pela visibilidade sim, mas no que se refere ao enfoque, a cultura popular foi esmagada pelo caráter ‘consumista’ da festa. Embora tenha trazido como chamada de texto nos três dias em que abordou a festa o termo ‘tradição’, este aspecto foi o que menos apareceu nos textos do DC. No dia 26/05, na editoria de Geral, o título até promete, ‘Festa do Divino é a atração do fim de semana na capital’, mas a linha de apoio entrega o conteúdo: ‘A Divina festa do Divino animou a noite de ontem, com música, muita gastronomia, além de diversão para as crianças’. Destaque para a foto de uma menina na pescaria, o enfoque ficou nas ‘barraquinhas’.

O que se perde?

No dia 27/05, também na editoria de Geral, um breve mergulho na cultura popular. Com o título ‘Festa do Divino, tradição na capital’, destaca os 231 anos da celebração e revela ao leitor alguns dados históricos, fornecidos pela entrevista com a professora Lélia Pereira Nunes. Infelizmente, não fala de nenhuma outra festa, como a do município de Penha, nem aprofunda o histórico da festa na capital. No domingo (28/05), a Festa do Divino esteve na Geral e na Coluna de Sérgio Costa Ramos (Caderno Variedades). Na matéria da editoria de Geral, o texto vem sob o título ‘Tradição’, mas enfoca, novamente, o aspecto econômico, a diversão e não a tradição, como se percebe no trecho ‘(…) proporcionar um domingo diferente às filhas era o desejo do casal Cristiane e HaLey Pires ao leva-las à Festa do Divino Espírito Santo, que terminou ontem, no Centro de Capital’. Ou ainda ‘Para a família de Cristiane, no entanto, as barraquinhas de maçã do amor e de pescaria já seriam suficientes para garantir o sucesso do passeio do fim de semana’. A seguir, enfatiza a renda dos quatro dias de festa com as 30 barraquinhas, responsáveis por 70% do orçamento anual da Irmandade do Divino Espírito Santo – entidade que organiza a festa e explica que a renda será revertida para projetos sociais que beneficiarão 1,2 mil crianças carentes. Sérgio Costa Ramos fala da festa em sua coluna, que está ao lado de matéria sobre o filme Nossa Senhora de Caravaggio (Fábio Barreto). Menciona o livro de Lélia Pereira Nunes – Caminhos do Divino, sem mencionar nenhuma das outras celebrações no estado.

O que mais chama a atenção na cobertura (ou na inexistência dela) da Festa do Divino nos diários catarinenses? Nem tanto o fato de ter sido pouco mencionada, afinal, ela se repete todos os anos e é mesmo difícil para qualquer jornalista buscar um novo enfoque, um novo aspecto. Nem tanto por ter destacado apenas a festa da capital e ter simplesmente ‘esquecido’ a tradição de 171 anos da cidade da Penha, por exemplo. O que mais incomoda é que a cultura popular, que é o que a Festa do Divino representa, decididamente não seja vista como cultura nos diários catarinenses. A escolha do título deste texto não é por acaso, é síntese de uma constatação. Veja, caro leitor, a Festa do Divino só teve uma menção em apenas um dos cadernos culturais dos três jornais. No mais, ela foi para a ‘Geral’. Esta reflexão não é isolada uma vez que num estudo recém concluído sobre a inserção da cultura popular nos diários catarinenses, realizado com a colaboração das estudantes de jornalismo Caroline Leal e Gabriela Forlin, identificamos exatamente esse aspecto: NÃO HÁ CULTURA POPULAR NOS DIÁRIOS CATARINENSES!

Por isso, caro leitor, a partir do levantamento de enfoques aqui apresentado quanto à Festa do Divino em seu último final de semana de realização, somado ao estudo de seis meses de publicação dos cadernos Variedades, Lazer e Anexo podemos afirmar que, para os principais jornais diário catarinenses, cultura popular não é cultura. O que se perde? Em curto prazo, a possibilidade de realizar um jornalismo cultural mais consistente, atrativo e significativo. Em longo prazo, nossa memória e identidade local.

(*) Professora e pesquisadora do Monitor de Mídia

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E se fosse aqui?

Na semana que passou, o presidente Hugo Chávez não renovou a concessão da RCTV, a emissora mais popular da Venezuela. Com isso, o canal fechou, gerando protestos não apenas naquele país, mas em outros lugares. O episódio traz à tona questões que sempre precisam ser lembradas quando se fala em comunicação, democracia, hegemonia e poder. É preciso voltar no tempo e recordar que a RCTV foi a única emissora venezuelana a se opor a Chávez em muitas das suas investidas políticas. Não era aderente, não era situacionista. Não era a última maravilha do mundo também. Importava pacotões de programas, inundava o público com novelas melodramáticas, mas informava, entretinha e mais: causava a diferença por seu posicionamento diverso do presidente.

A concessão, vencida após vinte anos de exploração do sinal, não foi renovada. Claro que a desculpa foi um ou outro aspecto técnico e não questões de ordem política. Mais um ponto para Chávez, que controla o Parlamento, parte substantiva do Judiciário e por aí vai. Agora, unificou as posições em torno dele no espectro da televisão.

O que está em jogo? Uma série de coisas: o sistema de concessão dos sinais de rádio e TV, a relação promíscua entre políticos e meios de comunicação, o exercício sem limites de poder de algumas pessoas, a liberdade de expressão, e a democracia como instituição.

Mas isso não vale apenas para a Venezuela. Vale para nós, brasileiros, também.

Aliás, é bom se perguntar: E se isso acontecesse por aqui? O que faríamos? Iríamos às ruas para protestar? Ocuparíamos a emissora? Investiríamos contra o presidente? Concordaríamos com a medida e assistiríamos à TV da mesma forma?

Perguntar não ofende. Até porque neste ano, mais precisamente em 4 de julho, vence a concessão da RBS TV de Florianópolis. Alguém se aventura a responder o que acontecerá?

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