Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Três dias de ‘puro jornalismo’

A atual presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo (SBPJor) e professora da Faculdade de Comunicação (FAC) da UnB, Dione Moura, prepara-se para conduzir o encontro nacional da entidade com a expectativa de avançar no processo de fortalecimento da pesquisa em jornalismo – mote principal do evento. São muitas e significativas as datas que distinguem o encontro marcado para os dias 7, 8 e 9 de novembro, desde os dez anos de criação da própria SBPJor até o cinquentenário de fundação da FAC, que comemora também uma década de criação de seu doutorado.

A professora também aborda em entrevista os principais temas do 11º Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo e traz suas reflexões sobre os resultados alcançados ao longo da trajetória da entidade. A FAC e a UnB são referências fundamentais nessa história, como explica Dione Moura. Foram os pesquisadores que escolheram a UnB para sediar a criação da SBPJor, em 2003, e que agora retornam à mesma casa para dar um sentido ainda mais expressivo à reunião nacional. A promessa é de “três dias de puro jornalismo, do melhor jornalismo”, resume a presidente da entidade.

Qual o significado da realização do 11º Congresso da SBPJor na FAC, onde a entidade nasceu há dez anos?

Dione Moura – Trata-se de uma demanda da comunidade de pesquisadores em jornalismo, assim como foi a criação da organização na UnB pelo significado da universidade no campo do jornalismo no Brasil. A comunidade pediu que o evento comemorativo fosse aqui, pois a UnB continua sendo uma referência no estudo de jornalismo. A presidência atualmente está conosco, há vários professores que trabalham na associação como conselheiros, diretores, ao longo da história. A UnB é fundadora, mentora e referência no estudo de jornalismo no Brasil e para a SBPJor. O significado é esse, de voltar. Como eu digo, um bom filho à casa retorna. É a SBPJor voltando para celebrarmos juntos onde ela foi criada.

O tema principal do congresso é a menção aos dez anos de fortalecimento da pesquisa em jornalismo. Concretamente, como podemos avaliar esse processo e a evolução da pesquisa no campo?

D.M. – Temos um crescimento na quantidade e qualidade dos trabalhos de pesquisa em jornalismo. A cada ano, existe um número maior de pesquisas apresentadas não só na SBPJor como em outros eventos de comunicação. Apresentamos dentro do evento duas seções, que são resultados concretos desses dez anos. Temos o primeiro simpósio das redes de pesquisa da SBPJor. Nesse período, foram formadas três redes de pesquisa: JorTec (Rede de Pesquisa Aplicada Jornalismo e Tecnologias Digitais), Renoi (Rede Nacional de Observatórios de Imprensa) e TeleJor (Rede de Pesquisadores em Telejornalismo). E o próprio seminário nacional da pós-graduação em jornalismo vai refletir e demonstrar o crescimento que houve no programa de pós-graduação que tem o jornalismo como tema central ou linha de pesquisa. A expansão foi evidente nesses dez anos de criação da SBPJor. A pós-graduação é um resultado indireto, mas com o qual a entidade contribuiu e vai contribuir ainda mais na medida em que vai fazer o primeiro seminário nacional dedicado ao tema.

Qual o papel dessas redes de pesquisa da SBPJor?

D.M. – A rede de pesquisa é o que tem de mais duradouro nas pesquisas. Quando uma pesquisa é realizada isoladamente tem menos impacto e pouca visibilidade, menores condições de comparabilidade dos dados. No caso da pesquisa feita em rede, é possível aumentar seu corpus de amostragem, porque existem mais pessoas coletando dados, há condições de comparação. Dentro de uma rede de pesquisa, muitas vezes não se chega com a pesquisa pronta, mas se usa a rede justamente para conceber a pesquisa, comparar, diversificar abordagens e metodologias. Por tudo isso, a rede de pesquisa é uma das missões, está no nosso estatuto fomentá-la. Toda pesquisa tem que estar integrada a uma rede de pesquisa. O erro muitas vezes vem do recorte, das condições de aplicabilidade, da abordagem e o acerto será maior se essa pesquisa estiver integrada em rede.

Outras datas significativas mencionadas como temas do congresso são os dez anos do doutorado em Comunicação na Universidade de Brasília e o cinquentenário da Comunicação na UnB, que coincide com os 50 anos da Comunicação no Brasil. Como a senhora analisa essa trajetória histórica?

D.M. – Quando parei para pensar e analisar, enquanto SBPJor, o que isso significa, ficou evidente que o próprio convite da comunidade de pesquisadores em jornalismo para que a criação da entidade fosse aqui já ecoava esse papel da Comunicação da UnB no Brasil. Acho que nem nós, que havíamos sido convidados, tínhamos noção disso, porque recebemos tarefas e, muitas vezes, santo de casa não faz milagre. Então, nós mesmos não percebemos qual era o lugar que o nosso jornalismo tinha no Brasil e fomos executar essa missão como um convite que cumprimos com muito valor. Quando refletimos agora, percebemos que esse convite já estava ancorado na história da FAC. Uma faculdade criada por duas personalidades grandes: Darcy Ribeiro, fundador da UnB, e Pompeu de Souza, um pensador, filósofo do jornalismo e da Comunicação, que revolucionou a prática e o pensar do jornalismo. Isso, lá de 63, era a raiz para esse convite de 2003 e refletia o respeito que a comunidade tinha pelo jornalismo da UnB. Hoje a faculdade está em um estado maduro e se coloca como contribuinte da história da Comunicação no Brasil. O doutorado também foi criado no mesmo ano pelo mesmo grupo que criou a SBPJor. A comissão de criação de doutorado foi formada por Mauro Porto, Denilson Lopes e por mim. Era um movimento de jovens doutores, recém-formados. Voltamos para a FAC com esse desejo de estar em uma faculdade em que houvesse doutorado, estávamos com o fôlego renovado pelo doutorado recém-concluído. Acreditávamos na UnB. Não fazia sentido ter um mestrado há 30 anos e não ter um doutorado, que inova a carreira de uma pessoa. Por que não tínhamos doutorado aqui? O diretor na época, Murilo Ramos, nos apoiou e fomos trabalhar para rediscutir e reelaborar o projeto, que por fim foi aprovado. Passados esses dez anos, o doutorado da FAC já tem excelentes resultados, tanto que o projeto do Eduardo Correia, orientado pelo professor Motta, vai ser premiado na SBPJor. É sinal de que andamos no caminho certo.

O Encontro de Jovens Pesquisadores em Jornalismo, agora em sua terceira edição, contribuiu de fato para dar visibilidade ao trabalho dos pesquisadores em formação, como se propôs em sua criação?

D.M. – Esse projeto foi criado na gestão da presidência anterior justamente com o desejo de dar visibilidade à pesquisa na graduação. Temos que entender que os jovens pesquisadores vêm envolvidos em um espírito de valorização da graduação como espaço de formação de pesquisa. Esse jornalista profissional está sendo formado não só na técnica profissional, mas na prática do pensar profissional, que é o espaço da pesquisa. Os resultados que temos recebido nesses três anos são pesquisas extremamente instigantes e inovadoras. Temos um prêmio de iniciação científica e o premiado deste ano, o Kevin Furtado, da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), estudou as cartas de São Paulo e seus elementos jornalísticos. É um tema inovador, buscando ver o jornalismo em um texto bíblico. Isso reflete o que se faz na pesquisa em jornalismo na graduação no Brasil.

A organização do I Seminário Nacional da Pós-Graduação em Jornalismo não gera um espaço redundante em relação ao que já é realizado no congresso mais amplo da SBPJor?

D.M. – Não, porque o seminário vai discutir os programas e as linhas de pesquisa, não há apresentação de trabalho. O seminário discutirá o que aconteceu nesses dez anos em relação à pós-graduação em jornalismo, que crescimento foi esse, quais foram os temas estudados, de que forma podemos ampliar, buscar mais fomento e incentivo. E dar mais visibilidade à pesquisa em jornalismo. Isso tudo está mergulhado em um contexto em que algumas abordagens no campo de estudo dizem que o jornalismo é apenas prática profissional, que não é a abordagem que propomos. O que estamos dizendo é que o jornalismo é uma forma de conhecimento e quem disse isso foi Adelmo Genro Filho, pesquisador que deu origem ao nosso prêmio. E se é uma forma de conhecimento, é ciência, então vamos trabalhar com o jornalismo que é ciência. Vamos ver como o programa de pós-graduação pode dar espaço para ampliar essa esfera do jornalismo como forma de conhecimento.

Quais os destaques podem ser conferidos à programação prevista? E quais resultados podemos esperar desse esforço de discussão e análise entre os pares?

D.M. – São três dias que equivalem a uma maratona de pesquisa em jornalismo. Sempre procuro destacar os temas conforme o lugar de fala da pessoa. Para conhecer um pouco mais da FAC, é a mesa do Pompeu de Souza, que discute a história da faculdade, a origem e a contribuição do próprio Pompeu. A dimensão dos cinquenta anos da faculdade e da comunicação está nessa mesa. Para quem busca uma visão do cenário internacional da pesquisa em jornalismo, indico a mesa da Florence Le Cam, da Universidade de Bruxelas, que vai apresentar um panorama desse cenário nos últimos dez anos. Os jovens pesquisadores devem ser interessar por grupos de trabalho, que são mesas coordenadas com debates sobre temas específicos. É um recorte que pode ser temático também. São três dias em que grandes pesquisadores de jornalismo estarão presentes. A mesa de lançamento de livros, por sua vez, é uma oportunidade de adquirir obras e conversar com os autores. A promessa é a de termos três dias de puro jornalismo, do melhor jornalismo.