Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Uma saída para a imprensa brasileira

Surgido no final da década de 80 nos Estados Unidos, o Civic Journalism, ou Jornalismo Cívico, é um movimento polêmico e que busca uma nova perspectiva dentro da prática jornalística. As primeiras experiências do CJ surgiram da insatisfação dos jornais americanos com a cobertura das campanhas presidenciais dos Estados Unidos de 1988.

O jornal Columbus Ledger Enquirer, do estado da Geórgia, foi o primeiro a se inclinar para uma postura mais ativa na busca de um jornalismo comprometido com a comunidade. Durante as eleições de 1990, o veículo sondou a comunidade sobre os problemas que a preocupavam, realizou entrevistas com os cidadãos e criou espaços editoriais para os leitores.

O editor Davis Merrit, considerado um dos fundadores do CJ, também tomou atitudes semelhantes durante as eleições de 1990 no seu diário Wichita Eagle. Assim, as primeiras incursões do Jornalismo Cívico se centraram nas campanhas eleitorais. Mas, aos poucos, temas como raça, família e saúde também passaram a integrar os periódicos.

No Brasil, ocorrências são raras

Uma das principais características do movimento é sustentar um jornalismo mais participativo na vida democrática e que ajude na construção da esfera pública. Assim, o jornalista adquire também um papel fundamental no processo comunicacional e passa a ser um intermediário ativo entre comunidade e poder público.

Merrit defende uma revitalização completa na profissão, com a inversão de algumas ‘regras de ouro’ do jornalismo. Como, por exemplo, o combate à objetividade. Outra mudança seria deixar para trás a concepção do jornalista como observador depreendido e assumir a noção de participante ativo. Dessa forma, o CJ defende uma postura constante dos meios de comunicação em prol dos temas que preocupam a sociedade.

A defesa que faz o Jornalismo Cívico pela subjetividade assusta e levanta muitas críticas, já que um jornalismo tão ativo e engajado possa apresentar-se como um perigo constante para a bandeira da isenção e da imparcialidade tão defendida pela imprensa ocidental.

Para os defensores do CJ, no entanto, o jornalismo poderia ao mesmo tempo tomar uma atitude ativa em prol da comunidade sem, no entanto, comprometer os valores jornalísticos.

Um jornalismo assim é possível?

No Brasil, são raras as ocorrências de Jornalismo Cívico. Os poucos casos encontrados apresentam ações aleatórias, e não uma adoção permanente das causas públicas. Aqui, ele ainda não emplacou.

Participante ativo

O CJ pode não ser uma espécie de salvador para todos os problemas do jornalismo, mas resolveria boa parte deles. No Brasil, ele poderia ser uma boa alternativa para o jornalismo tendencioso e partidário que muitas vezes encontramos em terras verde-amarelas. Saídas existem. Uma delas é o jornalismo regional. Os veículos comunitários se apresentam como uma grande oportunidade para o CJ. Com a avalanche de informações que o mundo moderno impõe, as pessoas estão cada vez mais interessadas nas notícias que as afetam e que interferem na sua realidade. Outra possibilidade pode ser encontrada no jornalismo digital. Os recursos que a internet oferece podem ser ótimas ferramentas para estímulo dos cidadãos na vida pública.

Apesar de ser em muitos aspectos utópico, algumas coisas boas podem ser aprendidas com o CJ. A primeira delas é que o jornalismo precisa se aproximar mais da sociedade e deixar de relatá-la com um distanciamento por vezes exagerado. Outra lição é a idéia de que o jornalismo pode e deve ser um participante ativo da vida pública, e não apenas um observador neutro.

Próximo à realidade social

A sociedade padece de jornalistas comprometidos com a sociedade, de comunicadores que não sejam meros produtores de matérias, mas que tenham consciência crítica. Padece de jornalistas que visitem a comunidade e ouçam o que ela precisa, que cobrem das autoridades soluções para os problemas e voltem à comunidade para checar se o problema foi resolvido. Eis aí um bom exemplo prático de Jornalismo Cívico. Outro exemplo poderia ser o combate às drogas, não como campanha, mas com uma atitude permanente dos meios de comunicação na publicação de reportagens e promoção de debates que discutam o tema.

Aliás, essa sempre foi a missão primordial da profissão e que hoje parece estar sucumbida. Somente jornalistas éticos e participativos podem contribuir para a construção de um jornalismo mais ativo na vida pública. Isso não significa deixar para trás a noção de isenção e imparcialidade, mas adotar uma postura que aproxime o jornalismo da realidade social. Somente jornalistas críticos sabem identificar na profissão o valor que ela de fato tem. São esses os jornalistas que a sociedade quer e necessita.

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Acadêmica de Jornalismo e pesquisadora, Trombudo Central, SC