Uma análise do jornalismo não é apenas um olhar sobre a técnica a partir da teoria, mas também o desejo de programar nessa prática comunicacional uma qualidade, um sentido profundo, um saber necessário. Em outras palavras, transformar o jornalismo em algo realizador e humano, superando a mesmice repetitiva de uma ação que pode alienar, escravizar e embrutecer a quem elabora e a quem recebe as notícias. Aqui, buscamos também entender o jornalismo como ciência complexa, que perpassa o humano e tem uma teleologia ética, estética e social. Isso nos liga verdadeiramente à epistemologia no jornalismo que compromete e liberta a ação de informar e formar opinião.
Por espistemologia entendemos o estudo do conhecimento, a teoria das ciências, metodologia de pesquisa e validação do conhecimento científico. Cremilda Medina [‘Jornalismo e a epistemologia da complexidade’. IN Comunicação & Política, v.9, n.11, p. 85-93. abr./jun., 1990] é bem crítica à prática cotidiana do jornalismo pobre superficial e condenado à mediocridade do jornalismo que se afasta da epistemologia. Interessante: a notícia é o produto humano dentro de uma praxe complexa e hoje é mercadoria que segue o tempo e a ideologia dominante, o capitalismo de mercado. A notícia é condicionada a ser transmitida sem qualquer critério de profundidade, reflexão e sentido epistemológico. Todavia, é um produto comercial, com tudo que a tecnociência pode oferecer, como nas fábricas transnacionais de bugigangas baratas.
Assim, o jornalista tende, em sua maioria, a ser superficial, parcial, limitado e por isso condenado: ‘(…) tramita como um técnico de produção de sentidos reducionistas (através da fórmula técnica), ingênuos ou ideologicamente toscos, transita também como um ser desenraizado, com sua atenção perceptiva voltada para matrizes culturais estrangeiras’ [MEDINA, 1990, p.194]. Medina também é insistente em salientar que o jornalista produz sentido ou produção simbólica. Assim, ele tem a obrigação de ter uma qualidade maior e uma responsabilidade cultural, humana e social muito grande. Mas, será que o jornalista consegue captar esse valor profundo numa técnica de produção industrial? Faz-se essa autocrítica?
Transmissão dos símbolos culturais
Somos necessários à sociedade contemporânea, que se baseia no fluxo infinito de informações. Todavia, essa mesma sociedade que valoriza a informação é bem determinante ao colocar o jornalista como um semi-escravo esclarecido, uma espécie de leva-e-traz do pensamento capitalista, do neoliberalismo, da cultura pop. Nunca esqueço as palavras proféticas do professor, jornalista, que disse para tomarmos cuidado, pois podemos nos transformar em fiéis empregados de uma produção, a serviço das oligarquias que possuem os jornais, as concessões de rádio e TV, os sites na internet.
Medina tem razão em chamar a atenção para a questão do trabalho jornalístico, pois a dinâmica da pressão do tempo, do editor, do dono do jornal ou dos aparelhos ideológicos vai apagando o sentido profundo do jornalismo e a busca por uma tentativa de elaborar um sentido aos enunciados. Entretanto, ‘sonhar é preciso’ [1990, p.197] com o arroz com feijão do dia-a-dia. Os desafios colocados por Medina, como abrangência para uma salutar transmissão dos símbolos culturais, podem ser interpretados como utopias ou metas de uma profissão que deseja formar-se mais e mais com uma finalidade.
******
Jornalista, escritor e pós-graduando em Meio Ambiente e Desenvolvimento no Centro de Ensino, Pesquisa e Extensão Socioambiental (CEPESA), na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), Itapetinga, BA