As origens das novas modas de internet podem normalmente ser atribuídas à elite tecnológica do Vale do Silício ou aos aficcionados da mídia digital de Nova York – nunca às mulheres das pequenas cidades do Meio-Oeste americano.
Isso transforma a repentina ascensão do Pinterest, site de coleta e compartilhamento de imagens, numa anomalia intrigante. O sucesso do site, lançado primeiramente em Iowa – um Estado americano mais conhecido por seu milho do que por seus programas de computador -, cresceu rapidamente nos últimos meses, principalmente em meio a usuárias.
Elas gostaram de seu design altamente visual, que lhes permite postar nos murais temáticos das suas páginas imagens encontradas em outras fontes on-line. Artesanato, casa, comida e moda aparecem em altas classificações na lista das imagens que os usuários copiam de outros sites. Muitas são em seguida compartilhadas por outros usuários aos seus próprios murais, o que dá às imagens uma circulação mais ampla numa rede crescente de pessoas com afinidades intelectuais.
“Recortar imagens de revistas e pregá-las na parede do quarto é coisa que todos fizemos quando crianças”, diz Julian Green, empresário de internet que testou ideias semelhantes em campos como o de viagens e casa. “O Pinterest sintetizou perfeitamente essa experiência.”
O site foi recompensado com quase 18 milhões de visitantes no mês passado só nos Estados Unidos – um salto de 50% em relação ao mês anterior – e está registrando um sólido crescimento, a partir de uma base mais baixa na Europa, segundo a empresa de pesquisa de mercado comScore.
Áreas temáticas
É cedo demais para dizer se essa mais recente empresa de internet de consumo em alta será mais do que uma moda passageira. Mas ela está se tornando a líder de uma categoria de sites de internet que ganha seguidores rapidamente entre os usuários, bem como de empresas de produtos de consumo e de entretenimento que tentam segui-los por toda a rede.
Contando com o que ficou conhecido como “curadoria social”, esses sites estimulam os usuários a exibir as coisas que lhes interessam – muitas vezes pela seleção, salvamento e combinação de imagens, vídeos e artigos da internet como um todo – para depois permitir que outros os sigam e copiem. Os formadores de gostos são criados quase da noite para o dia, e suas ideias se propagam pelo mundo de forma viral.
Em áreas como moda e viagens, sites desse tipo pipocam já há algum tempo. O Polyvore, fundado cinco anos atrás, foi um dos primeiros dentre muitos sites concorrentes a permitir que os usuários exibam seu conceito de moda, enquanto o Houzz, formado em 2009, estimula seus membros a dar vazão à sua paixão por arquitetura e decoração.
“A curadoria social tornou-se o tópico em alta em 2012”, diz Chad Hurley, um dos cofundadores do YouTube, que agora tenta a sorte na ideia por conta própria. Juntamente com seu parceiro comercial de longa data Steve Chen, ele recentemente comprou uma totalmente reformulada Delicious – fundada quase uma década atrás para que usuários armazenassem e compartilhassem links da internet – a fim de refletir o estilo visual atual de misturar e combinar.
A superabundância de informação na internet esgotou o alcance das ferramentas de busca, deixando os usuários à cata de maneiras de selecionar o que realmente lhes interessa, diz Hurley: “Os algoritmos só podem levá-lo até esse ponto.”
A causa imediata para essa explosão de redes on-line de agrupamento por interesse específico pode ser detectada na ascensão das redes sociais, embora as suas raízes remontem a um passado mais remoto.
Destinos on-line iniciais, como o GeoCities, de grande sucesso na década de 90, agrupavam sites criados pelos usuários por áreas temáticas e representavam para os usuários uma forma de encontrar e propagar informações entre si, diz David Karp, empresário de internet de Nova York. O Tumblr, o site de microblogs fundado e comandado por ele, tenta reproduzir essa experiência ao permitir que as pessoas criem séries de postagens multimídia curtas, passíveis de seguir e copiar.
Foco nas afinidades
O algoritmo de busca do Google lançou uma nova forma de filtrar informações on-line. Ao possibilitar encontrar rapidamente respostas para as perguntas de cada consulente, ele contornou a necessidade de ingressar em redes sociais para descobrir material relevante.
Mas, com a ascensão do Facebook e do Twitter, as coisas voltaram ao ponto de partida. As redes de amigos e contatos estão se tornando uma poderosa fonte de referência, principalmente no caso de assuntos que são subjetivos ou pessoais demais para serem captados pela análise mecanicista da internet.
Foi nesse novo mundo que o Pinterest decolou. “Ele está captando um comportamento que, segundo pensamos, é bem poderoso: a descoberta, pelas pessoas, de coisas do mundo real, com uma cobertura social”, diz Jeff Jordan, um empresário da área de compra de participações e ex-diretor da empresa de pagamentos on-line PayPal, que atualmente compõe o conselho de administração do Pinterest. O site tornou-se uma maneira de mostrar ao mundo “coisas que você quer comprar, lugares aos quais você quer ir”, diz ele.
Embora o Pinterest diga que deixou para depois suas ideias de ganhar dinheiro, as possibilidades comerciais criadas por esse comportamento volitivo já geraram uma série de imitadores on-line. Congregar os usuários em torno de interesses específicos, argumentam seus proponentes, criará formas mais direcionadas (e valiosas) de anunciar. As recomendações de produtos, além disso, poderão impulsionar as vendas on-line.
Isso em teoria. A maioria dos anunciantes ainda não concluiu se esses sites com curadoria dos usuários são um bom canal de negócios. “Nenhum de nós, na verdade, comprovou isso”, diz Karp. “Eles ainda não são suficientes para pagar as contas”.
Os empresários e executivos de compras de participações que acorrem em massa para essa área compartilham uma convicção simples: se os usuários vierem, o dinheiro acabará vindo também. “As pessoas querem muito mais experiências de curadoria, às quais sentem que podem encaminhar maior volume das coisas que consomem”, diz Roelof Botha, um dos sócios da empresa de compra de participações Sequoia Capital, que investiu em empresas como a Tumblr e a Houzz.
Segundo seus apoiadores, essas redes pautadas por área de interesse acabarão superando não apenas a primeira geração dos portais de internet, como o Yahoo, como também as redes centralizadas do antigo universo da mídia. “Não interessam mais a Fox ou a CNN – não interessam as grandes redes”, diz Karp do Tumblr. “O importante são essas comunidades de pessoas com afinidade intelectual.”
Mas, embora esses sites afirmem ter abocanhado uma fatia considerável da atenção de seu público – por exemplo, os usuários ficam um total de minutos seis vezes maior no Tumblr que no Twitter, por exemplo, segundo a comScore -, eles ainda enfrentam muitas interrogações. Entre as maiores questões está a possibilidade ou não de sobreviver num universo já congestionado, que quase não impõe barreiras ao ingresso, e se eles conseguirão superar o que se tornou a maldição do mundo das redes on-line: o rápido arrefecimento do interesse, na medida em que os usuários se voltam para novas gerações de sites da moda.
O novo grupo de sites de curadoria social tende a seguir um modelo comum. Alguns usuários criam contas, muitas vezes lançando mão de suas credenciais no Facebook para se inscrever, e começam a fazer postagens em suas páginas. Outros passam a “seguir” os que consideram mais interessantes. O conteúdo que é postado novamente pelos seguidores é o que gera boa parte do movimento: 80% das imagens do Pinterest são compartilhadas, por exemplo. Pode parecer preguiça – ou mesmo hábito de plagiar -, mas esse filtrar e refiltrar constante da rede tornou-se uma forma de revelar e repassar coisas que poderiam, caso contrário, ter permanecido encobertas.
O Twitter, com sua tecla “seguir” e seus “re-tweets”, há muito lança mão desses recursos. Mas um estilo visual forte, juntamente com a capacidade de postar uma maior gama de material – como vídeos e textos de maior volume – diretamente nos 'feeds' RSS (dispositivos que exibem dados atualizados) ou em murais estáticos põe os mais novos sites de curadoria social em destaque. Muitos também se limitam a uma linha restrita de assuntos, na tentativa de ingressar em grandes mercados on-line, como o de viagens e imóveis.
Os sites com curadoria social divergem das redes sociais sob aspectos importantes. Eles dependem, em parte, da simbiose – ao autorizar, por exemplo, que as pessoas se inscrevam utilizando sua conta no Facebook, muitos facilitam as tarefas de convidar amigos para aderir ou de chamar atenção para si por meio da postagem de informações sobre as atividades de um usuário em sua página no Facebook.
Mas eles também tentam ir bem além do “gráfico social”, ou rede de contatos, que caracteriza o Facebook. “Nosso foco não são relacionamentos – são mais interesses”, diz Hurley. “O que interessa é que pessoas com afinidades intelectuais possam se conhecer. A coisa não se resume em saber o que seus amigos estão fazendo.”
Comportamento autoalimentado
Ao apresentar mais interfaces do usuário visuais e tornar mais fácil identificar e seguir pessoas com interesses semelhantes, eles também esperam não ter de enfrentar as enxurradas de informações que podem tornar as redes mais consagradas difíceis de navegar.
“O Facebook e o Twitter possuem toneladas de informações cujo sentido eles tentam decifrar”, diz Hurley. “Todo mundo tem muita coisa a contornar.”
Se muitos deles serão capazes de sobreviver num mundo em que cresce cada vez mais a competição pela redução dos períodos de atenção, no entanto, é uma outra questão. Em especial, o amplo alcance do Facebook e seus altos níveis de “engajamento” – seus usuários gastam de seis a sete horas mensais com o site, segundo a comScore – ameaçaram tirar boa parte do foco dos outros sites que pretendem crescer à sua sombra.
Mas, embora o gráfico social do Facebook seja um incentivo poderoso para fazer as pessoas voltarem constantemente, a fim de se manter em contato com os amigos e a família, os “gráficos de interesses” de sites como o Pinterest – que ligam pessoas com afinidades intelectuais – também estão se mostrando uma atração irresistível.
Isso desmente o ponto de vista amplamente defendido no passado de que todo o comportamento social on-line acabaria sendo atraído para um pequeno número de redes, lideradas pelo Facebook, afirma Botha, do Sequoia. “É o surgimento de vários gráficos – não existe apenas um gráfico”, diz o empresário.
Quantos deles existirão no longo prazo é outra questão. As redes on-line da moda – como o MySpace e o Bebo – muitas vezes perdem o brilho e morrem na medida em que formas mais recentes de interação on-line conquistam sucesso. Historicamente, a “meia-vida das redes sociais” revelou-se extremamente curta, diz Karp, do Tumblr. “Nunca vimos uma dessas redes de internet durar mais de dez anos.”
O Facebook espera contrariar essa tendência ao se consolidar como serviço de utilidade pública que outros sites podem acionar, valendo-se de sua grande base de usuários e de contatos sociais. A exemplo dos restaurantes favoritos que se tornam instituições locais e duram por gerações, existe lugar para esse tipo de destino na internet, diz Botha. Mas a maioria dos sites empregados pelos usuários para se comunicar se parece mais com casas noturnas, que trilham altos e baixos ao sabor das marés da moda, acrescenta ele.
Ainda é cedo demais para dizer se o Pinterest, a mais recente nova casa em alta do quarteirão, seguirá esse modelo. Por enquanto, os efeitos de rede estão, sem dúvida, operando em seu favor, já que os usuários estão acorrendo ao site. “A coisa se torna autossustentável”, afirma Jordan, que diz que o Pinterest ultrapassou rapidamente seu público original de habitantes do meio-oeste americano. Quanto mais as pessoas se conectam entre si e compartilham fotos, mais esse comportamento se autoalimenta.
Quanto essa festa durará, no entanto, é difícil prever.
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[Richard Waters, do Financial Times, de San Francisco]