A maioria dos problemas enfrentados pelo cliente de TI no Brasil vem dos modelos de contratos adotados pelo mercado brasileiro, seja no meio público ou privado. Reclamar e apontar como ciberterrorismo ataques dos quais são vítimas é apenas repassar a culpabilidade dos clientes a possíveis e muitas vezes indetectáveis ou mesmo anônimos reveladores de vulnerabilidades como são criminalizados os hackers em todo o mundo. Não que as ações fossem legais, ou mesmo meritórias, porém um grande e estratégico debate deve ser iniciado urgentemente pelas instituições brasileiras, bem como pelo mercado dependente da rede mundial de computadores, para continuar promovendo seu crescimento globalizado.
Quando refiro o modelo contratual brasileiro, aponto para as vulnerabilidades das contratações, em que as cláusulas preventivas de segurança de dados, confiabilidade de processamento, sigilo e garantias de auditagem, modelagem padrão de exportação para possível migração por rescisão contratual estão ausentes na forma contratual, principalmente de software e serviços telemáticos.
Por anos venho acompanhando editais de contratação milionários por órgãos públicos que não têm as tais cláusulas resguardando a informação pública, expondo as informações a todo o tipo de vulnerabilidades, além de os mesmos não atenderem muitas vezes à demanda. O grande câncer do dinheiro público aplicado em TI é sem dúvida a ineficiência na elaboração de editais e contratos inerentes a sistemas de informação, bem como a ausência de convergência nos modelos de negócios aplicados ao desenvolvimento de softwares brasileiros. Medidas e ações governamentais, principalmente do governo federal, no sentido de diminuir esses riscos são hostilizadas e ignoradas. Os padrões de interoperabilidade como o e-PING, Software Público Brasileiro, instruções normativas e tantas outras tentativas são louváveis, porém algo acontece que simplesmente essas iniciativas são simplesmente deixadas de lado em momentos cruciais de zelar pelo bem público.
Software é estratégico
Outro câncer brasileiro no dinheiro público é a descontinuação de projetos por conta de mudança de gestões. Nenhum projeto tem sustentabilidade justamente por não conter planejamento de evolução, atualização de versão e continuidade do modelo. Um absurdo irresponsável cometido pelos gestores públicos que a cada quatro anos jogam no lixo muitos recursos, refazendo todo o trabalho apenas para atender interesses individuais e justificando essa vergonha denominada atualização tecnológica. Sem comentários.
Muitas cidades brasileiras não têm recursos para implantação de sistemas caros e pesados em termos de infraestrutura informacional, e acabam procurando apoio nessas iniciativas tão importantes, mas interesses escusos conseguiram algo fenomenal: transformar três poderes em formas de ser poder.
Pela lógica informacional, só existe um modelo de negócio a ser atribuído a um poder. Só existe um jeito de ser Executivo, Legislativo e Judiciário, mas a sede de criar cada vez mais problemas desnecessários, e um complexo e diversificado modelo de se fazer diferente para simplesmente aparecer, ou, ainda, atender interesses minoritários e sectários, faz com que o dinheiro público financie uma verdadeira farra de burocratização e uma incompreensível torre de Babel dos sistemas de informação brasileiros.
O Brasil precisa urgentemente traçar linhas estratégicas de onde quer chegar em termos de segurança informacional, desenvolvimento tecnológico, confiabilidade, sigilo e, principalmente, um modelo padronizado e confiável de contratação de bens e serviços. E ainda será preciso orientar o mercado brasileiro sobre a importância de salvaguardar, por meio de uma boa contratação, as informações econômicas do mercado brasileiro fornecendo com responsabilidade a modelagem de métodos e procedimentos nesse sentido. Software é estratégico para um país e devemos ter responsabilidade na hora de adquirir esses serviços. Depois, não adianta chamar de terroristas quem invade sites oficiais.
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[Jean Sestrem é analista, Itajaí, SC]