Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Mangue geek

Imagine uma arena com capacidade para 3.000 pessoas, lotada de nerds, geeks, jovens apaixonados por tecnologia. Todos conectados em altíssima velocidade. Um olho na tela de seus possantes computadores e outro em alguns dos palestrantes nos quatro palcos do local. Ali não se aplaude com palmas. Para ser diferente, o público entoa um crescente “uoooooo” quando ouve algo interessante. Essa moçada está ali com o objetivo único de se conectar com jovens que têm em comum a paixão pela tecnologia.

Foi assim a minha experiência na semana passada durante a Campus Party em Recife. O evento foi criado na Espanha em 1997 e está em sua quinta edição no Brasil. Neste ano, aconteceu pela primeira vez fora de São Paulo e juntou milhares de jovens de toda a região Nordeste. Estive lá para ministrar uma palestra sobre inovação. Comigo vieram cinco engenheiros brasileiros que trabalham na sede do Facebook, nos Estados Unidos. Eles realizaram pela primeira vez no Brasil nossa tradicional maratona hack de programação, conhecida internamente como Hackathon.

O objetivo é lançar um desafio relacionado a tecnologia, trabalhar com os jovens no tema durante toda a noite e depois avaliar as melhores ideias. Em Recife, o tema foi “Tecnologia para o bem”. A presença da empresa em Recife levantou muito interesse nos jovens. Queriam saber por que havíamos escolhido o Nordeste para falar sobre inovação e ainda realizar o nosso primeiro Hackathon de programação no país.

Mais perto do mercado consumidor

A resposta é muito simples. O Nordeste começa a despontar como uma grande incubadora de talentos tecnológicos e a economia da região se destaca da do restante do Brasil. É em Recife que se encontra uma das mais interessantes experiências desse gênero no nosso país. O Porto Digital é um projeto de desenvolvimento econômico que agrega investimentos públicos, iniciativa privada e universidades. A ideia surgiu em julho de 2000 e visa a criação de um ecossistema local de inovação. Em 12 anos de operação, o Porto Digital já gerou 6.500 postos de trabalho ligados a inovação e tecnologia.

Se não bastasse o investimento em tecnologia, a economia do Nordeste cresce a passos largos. O PIB de Pernambuco, por exemplo, teve crescimento superior ao do Brasil no primeiro trimestre de 2012. Enquanto o estado nordestino cresceu 4,6%, o país teve alta de 0,28%. A ideia de descentralizar desenvolvimento tecnológico e inovação não é nova. Mesmo o Vale do Silício, na Califórnia (EUA), conhecido como a meca da inovação mundial, começa a sofrer concorrência de outras cidades americanas.

Nos últimos anos, Nova York investiu pesado em políticas públicas e incentivos para se tornar um importante polo de tecnologia. Empresas como a Google e, mais recentemente, o Facebook, já estabeleceram seus centros de engenharia ali. Para os novos empreendedores, Nova York é a possibilidade de trazer toda a capacidade de inovação e tecnologia para perto do mais importante mercado consumidor dos Estados Unidos.

Lição a ser seguida

O desafio de descentralizar os polos de inovação é simples e pode tranquilamente dar certo no Brasil. Diferentemente de outras indústrias, a de tecnologia e inovação não requer infraestrutura mais complexa do que capital intelectual e boa conexão de dados. Portanto, aos investidores e empresários interessados no crescente mercado de tecnologia e inovação no país, aqui vai uma dica: olhar para o Nordeste com a desconfiança de que a região floresce apenas pelas mãos da agricultura e do turismo é miopia pura.

Uma região que se propõe a estimular a tecnologia e a inovação de maneira tão pragmática, com taxas de crescimento acima da média do país, só pode ser um bom negócio. Sem contar com o enorme mercado consumidor da região que, a cada dia, migra das camadas mais baixas para a classe média.

Recife saiu na frente e está mostrando que tecnologia é uma das maneiras mais eficazes de estimular o crescimento sustentável e descentralizado no país. Que o exemplo sirva de lição para nosso grandioso e rico Brasil.

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[Alexandre Hohagen, jornalista e publicitário, é responsável pelas operações do Facebook na América Latina]