Uma curiosa foto circula no Facebook. Ela mostra John Lennon e Che Guevara juntos tocando violão em um estúdio. Nenhuma biografia de um ou de outro registra tal encontro, o que nos autoriza a afirmar que é uma falsificação. A manipulação de imagens é uma prática antiga, mas a internet e os diversos programas de computador elevaram suas possibilidades. Posso colocar um post no Facebook mostrando Lênin com seu celular ou Getúlio Vargas manipulando um iPhone. Este tipo de imagem já existe aos montes nas redes sociais e tem intenções humorísticas, obviamente, mas a manipulação de imagens eleva a possibilidade da calúnia, da difamação e pode levar a crimes.
É preciso que se entenda que não vivemos propriamente uma época de expansão do conhecimento, mas da informação. O conhecimento acontece quando pegamos as informações e as analisamos de forma crítica e o que menos temos hoje é análise crítica, principalmente nas redes sociais. Com o declínio do hábito da leitura, o conhecimento crítico sofre uma decadência que, infelizmente, é mundial. As massas que recebem as informações estão cada vez menos preparadas para processá-las em seus cérebros. É preciso observar também que a quantidade extraordinária dessas informações faz com que a seleção que um indivíduo possa fazer delas fique muito difícil. A velocidade com que chegam, sua enorme quantidade e o declínio do senso crítico são pontos perigosos nesta relação entre o homem e a tecnologia de informação.
A falsificação de imagens vem dos primórdios da fotografia. O famoso Arthur Conan Doyle foi vítima de uma delas, em 1917. As garotas que o enganaram usaram um truque simples: desenharam e recortaram figuras representado fadas e as prenderam com grampos nas árvores de uma floresta. Tiraram fotos ao lado das figuras e chegaram até o senhor Doyle. O genial criador de Sherlock Holmes acreditou na existência de fadas até o fim da vida. Imaginem o que é possível hoje com o Photoshop.
Reforçar o senso crítico
Desde o início da fotografia que fomos brindados com fotos de fantasmas, discos voadores, duendes, fadas, ETs etc. O mundo da falsificação e da lorota ganhou um importante aliado com a máquina fotográfica, sem esquecer da filmadora, claro. Mas a lorota e o humor brincalhão não são tão perigosos quanto a capacidade de caluniar pessoas, instituições, governos, empresas etc. As ditaduras totalitárias do século 20 abusaram da manipulação da imagem. Ficou famoso o caso do stalinismo. Stálin mandou apagar Leon Trotsky das fotos dos livros de história da antiga URSS e fez o mesmo com outros dirigentes da revolução soviética. Apagar pessoas (os desafetos) da história através da manipulação das fotos virou uma prática comum das ditaduras.
Tudo isso leva o cidadão comum a uma dúvida: o que é real e o que não é? Existem vídeos tentando demonstrar que o onze de setembro de 2001 foi uma farsa e outros que afirmam que a viagem à lua não existiu. Justamente por ter um senso crítico diminuído o cidadão pode ser tentado a considerar que não só algumas informações são falsas, mas que todas o são. O que não resolve o problema e talvez o piore.
Este “admirável mundo novo” que adentramos a partir do surgimento da internet precisa ser acompanhado de um fortalecimento do hábito da leitura. É a única forma de reforçar o senso crítico das massas. A escola deve ter um papel fundamental neste processo. Se isso não acontecer correremos o risco de no futuro vivermos ao lado de pessoas que darão crédito a qualquer imagem e outras que não darão crédito a nenhuma.
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Aristóteles Lima Santana é professor, Paulo Afonso, BA