Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Humor tosco, com certeza

Hoje [quarta-feira, 29/5], na pequena vitória em uma batalha que não deveríamos ter de lutar, o Facebook decidiu se tornar um pouco menos conivente com o estupro. Obrigada, Facebook!

Não quero parecer ingrata. É animador que o Facebook tenha sido receptivo – e prontamente, aliás – à carta aberta enviada na semana retrasada e assinada por dezenas de ativistas femininas e organizações de mulheres com respeito ao problema gritante e revoltante do discurso de ódio contra mulheres no site. Como assinalaram Women, Action and the Media, a escritora Soraya Chemaly e o Everyday Sexism Project, o Facebook está repleto de imagens de violência contra mulheres e mensagens favoráveis ao estupro – com frequência ordeiramente justapostas a anúncios inócuos de patrocinadores do site.

Um movimento simultâneo #FBrape no Twitter assinalou exemplos gritantes, e pediu medidas e responsabilização. Em apenas uma semana, 15 empresas retiraram sua publicidade do Facebook, enquanto o site continuava a subestimar a importância das imagens como mero “conteúdo de mau gosto e perturbador, ou tentativas toscas de humor”.

E após eu ter escrito sobre a cultura de estupro no Facebook, na semana retrasada, um representante de sua divisão de Comunicação Global e Políticas Públicas me enviou um e-mail reconhecendo, de maneira bem pouco animadora, que “erros podem ocorrer às vezes” na sua aplicação, dizendo, “ocasionalmente, cometemos um erro… Mas isso não é uma falha da política”.

Talvez. Mas por muito tempo esses erros pareceram se inclinar para uma aplicação mais pesada da política em imagens de arte inócuas de mulheres amamentando, e ignorando convenientemente as do tipo “vou cortar fora seu clitóris, vadia”, e “é por isso que garotas indianas são estupradas”. “Humor tosco”, com certeza.

Anúncio bem-vindo

Na terça-feira, porém, a empresa parece ter mudado de atitude. Numa declaração no fim do dia em Controversial, Harmful and Hateful Speech on Facebook (Discurso controverso, danoso e de ódio no Facebook), a equipe de segurança da empresa reconheceu problemas com seu “conteúdo que visa a mulheres com imagens e conteúdos que ameaçam ou incitam à violência baseada em gênero ou ódio”, e admitiu que, apesar de seus ideais de comunicação “segura e respeitosa, ficou claro que nossos sistemas para identificar e remover discursos de ódio não funcionaram tão efetivamente como gostaríamos, particularmente em torno de questões do ódio baseado em gênero”.

Para esse fim, o Facebook prometeu trabalhar com, e treinar, suas equipes de conteúdo sobre como avaliar e tratar o discurso de ódio, “aumentar a cobrança de responsabilidade dos criadores de conteúdo” e estabelecer linhas de comunicação mais formais e diretas com grupos de mulheres como Everyday Sexism para identificar os problemas – e mudar a conversa.

Não devia ter demorado tanto. Não devia ter sido preciso um clamor público em massa e a ameaça de boicotes e perda de anunciantes para o Facebook chegar à ideia de que não é celebrando a violência e ataques sexuais que se constrói uma comunidade. Mas, em que pese o atraso, o anúncio de terça-feira é, mesmo assim, bem-vindo. É uma promessa que, podem acreditar, muitas de nós vão exigir que o Facebook cumpra, e ficar muito vigilantes. Como observou Soraya Chemaly na terça-feira, “a responsabilização é a chave. Agora começa o trabalho.”

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Mary Elizabeth Williams é ensaísta da revista Salon, autora de Gimme Shelter: My three years searching for the american dream (Simon & Schuster)