Thursday, 19 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Mídias antigas migram para a nuvem

Jennifer Brown está em prantos. Ela está convertendo em arquivos digitais imagens filmadas por uma câmera no começo dos anos 2000. Nas imagens, os colegas de uma mulher comemoram sua promoção, até que o namorado dessa mulher surge do nada, fica de joelhos e a pede em casamento. Quando um grupo de transeuntes interrompe Jennifer, enquanto ela chora diante da tela do computador, ela aponta para a cena e tenta se explicar. “Ela está totalmente surpresa”, diz Jennifer, “e agora eu estou envergonhada.”

Jennifer é especialista em mídia digital e trabalha no departamento operacional da YesVideo, uma das mais curiosas companhias do Vale do Silício. Há muitos serviços de transferência digital que recuperam velhos filmes domésticos e fotografias desgastadas, que estimadas 90 milhões de famílias americanas mantêm em seus armários e porões, e que geralmente as convertem para DVD. Alguns trabalham pelo correio e muitos outros são operações locais para pessoas que não confiam suas recordações à FedEx.

O que há de diferente na YesVideo é sua escala e tecnologia: na última década, ela se tornou obrigatoriamente a empresa a que a Walmart, CVS, Costco e outros grupos varejistas recorrem para as solicitações de conversão de clientes. (Os preços variam de acordo com o formato de mídia; por exemplo, a YesVideo converte duas horas de filmagens em fitas VHS por US$ 20.) Estima-se que 90 milhões de famílias americanas tenham em seus armários fotos e filmes para conversão.

Investidores incluem Kodak e Polaroid

Agora sob nova administração, a YesVideo pretende ir bem além do DVD e oferecer todos os vídeos para clientes a qualquer hora por meio de seus smartphones e tablets. “Acreditamos que há 1,5 bilhão de unidades de mídias velhas encostadas por aí, somente nos Estados Unidos”, diz Michael Chang, um empreendedor que assumiu o controle da companhia no ano passado, adquirindo-a por US$ 5 milhões de alguns de seus investidores originais.

A YesVideo foi fundada em 1999 por Sai Wai Fu, um designer de microchips nascido em Xangai que trabalhou na Intel, e avaliou que deveria haver muitas famílias como a sua, com pilhas de gravações domésticas em formatos obsoletos juntando poeira nos sótãos e porões. A startup progrediu lentamente ao longo de uma década, firmando acordos com empresas varejistas e abrindo escritórios de processamento de filmagens em Santa Clara, na Califórnia, e Atlanta, na Geórgia.

Em seus primeiros anos, a YesVideo levantou US$ 20 milhões junto a um grupo de investidores que incluiu a hoje concordatária Kodak e a Polaroid. A operação seguiu obtendo lucros modestos e em 2012 os maiores acionistas a venderam para Chang e seu sócio, Andy Choi, que um ano antes haviam vendido a rede de anúncios móveis Greystripe para a companhia de marketing on-line ValueClick.

“A Amazon vem nos dando muita atenção”

Os dois têm planos mais ambiciosos. “Em cinco anos todo mundo terá televisores conectados e acreditamos que os filmes pessoais serão o aplicativo da hora”, diz Chang. Ele quer transformar a YesVideo em um tipo de YouTube premium – um serviço de parada única para armazenagem e compartilhamento de vídeos favoritos.

No último ano, os novos administradores da YesVideo reconstruíram a companhia de olho nos serviços da “nuvem” da computação, explorando também as novidades em tecnologia de compartilhamento online. Uma das primeiras iniciativas de Choi, hoje diretor de tecnologia da companhia, foi usar seu cartão de crédito pessoal para abrir uma conta na unidade de computação na nuvem da Amazon.com, a Amazon Web Services.

Os vídeos dos clientes estão agora nos servidores da Amazon e sua rede de fornecimento de conteúdo faz a transmissão da YesVideo para os clientes. A companhia também começará em breve a usar seu serviço Elastic Transcoder para converter vídeos para formatos que possam ser exibidos em qualquer smartphone, tablete ou PC. “Imagino que somos, na melhor das hipóteses, uma conta de tamanho médio. Mas estamos crescendo rapidamente e a Amazon vem nos dando muita atenção ultimamente”, diz Chang.

Recordações dos clientes

Cercada por companhias de chips e empresas iniciantes da internet, a unidade de produção de 7,6 mil metros quadrados em Santa Clara se destaca. Ela funciona ao ritmo de velhos projetores de cinema e de slides. Há um espaço dedicado aos formatos VHA, Betamax, 16mm, Super 8 e até mesmo o 8mm tradicional, inventado na década de 30.

Uma sala é dedicada a álbuns de fotografias, com cada página digitalizada com o uso de uma câmera de alta resolução. Em outra, usada na conversão de slides, engenheiros da YesVideo fizeram furos nas laterais de meia dúzia de projetores Kodak Carousel e inseriram câmeras digitais Nikon D10 para capturar diretamente cada slide. A companhia compra muitos de seus aparelhos retroprojetores antigos e peças de reposição no eBay. “Ninguém conseguiria recriar esse negócio em cerca de três anos” porque não haveria equipamentos de trabalho suficientes, diz Rolf Breuer, engenheiro da YesVideo.

Câmeras de vídeo monitoram o centro de operações da YesVideo, enquanto lotes de mídias de clientes são estocados em latões de lixo pintados de cinza, que têm tampas com cadeados e são etiquetados em letras grandes com os dizeres: “Cuidado: Aqui dentro estão as recordações dos clientes.” Os 300 funcionários da companhia têm de examinar cada vídeo para garantir uma qualidade elevada de transferência e impedir infrações ao contrato com o usuário, como a proibição de trabalho com pornografia doméstica.

“Desvendamos as recordações das pessoas”

Assim como a chorona Jennifer Brown, às vezes os funcionários se envolvem mais no processo de conversão, quando os vídeos são executados em tempo real em seus computadores. Eles afirmam que assistem a muitas festas de aniversário e casamento e muita dança ruim, mas alguns clips se destacam. Um funcionário lembra de ter visto um filme branco e preto em 8mm de um safari que deparou com um leão na savana africana. O filme termina abruptamente, com o leão atacando o grupo e a câmera caindo no chão.

Nos próximos dois anos, Chang quer ampliar as operações embrionárias no Japão e Reino Unido. Em fevereiro, a companhia lançou um aplicativo que permite aos clientes assistir às suas mídias convertidas no iPhone, e pretende lançar um aplicativo parecido para o iPad no terceiro trimestre.

Chang diz que a YesVideo está desenvolvendo serviços premium, como um software de edição de vídeo e um sistema de reconhecimento facial – para permitir aos clientes identificar rapidamente todos os seus vídeos em que determinadas pessoas aparecem.

Outro serviço que será lançado nos próximos meses, chamado Snapshot, permitirá aos usuários imprimir uma fotografia a partir de frames individuais. “Acreditamos que assim que tivermos acesso a um número maior dos 90 milhões de lares que possuem mídias antigas guardadas, poderemos tornar a armazenagem o centro do negócio e agregar valor aos vídeos”, diz Chang, que imagina cobrar uma mensalidade de US$ 10 pelo serviço e dividir a receita com as companhias varejistas. “Sem querer ser muito sentimental, acho que todo mundo aqui acredita estar fazendo algo muito especial. Estamos desvendando as recordações das pessoas.”

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Brad Stone, da Bloomberg BusinessWeek, em San Francisco