Os ataques têm sido tão sistemáticos e sintomáticos que no Brasil há um abismo entre o discurso político-ideológico de Estado Democrático de Direito e a preservação das liberdades e garantias constitucionais, que não acho difícil as futuras reuniões físicas da blogosfera acontecerem em trincheiras ou bunkers. O novo encontro da blogosfera realizado na capital cearense, WebFor 2013, aconteceu na Universidade do Parlamento Cearense, de 24 a 26 de maio, levando ao Nordeste o debate sobre a democratização da comunicação no país e apresentando de lá o feedback sobre a realidade dos brasileiros que ousam pensar e manifestar opiniões nas redes sociais da internet.
O cenário no ensolarado Ceará é o de desidratação das mídias alternativas, como não poderia deixar de ser, já que o Brasil é uma federação dominada por oligopólios familiares, políticos e empresários sedentos pelo exercício do poder de comunicação. Então, não podemos nos solidarizar somente com o povo cearense sobre o que acontece em qualquer canto do Brasil. Infelizmente, a realidade é a mesma: no charmoso Sul, entramos numa fria; no Vip Sudeste, somos barrados no baile; no Velho Centro-Oeste, mocinhos são transformados em bandidos; e no Norte, reside o maior símbolo nacional da repressão imposta por superpoderes obscurantistas, na qual essa mídia alternativa está sendo subjugada, ele se chama Lúcio Flávio Pinto.
Todo cenário brasileiro só nos traz agonia dia a dia. A falta de interesse da massa nos assuntos liderados pela blogosfera ainda preocupa mais que a indústria da criminalização da opinião na qual seus participantes estão sendo enquadrados. Na sexta-feira, dia de credenciamento gratuito na WebFor 2013, pouca gente compareceu. Nas redes sociais, não percebi grande entusiasmo. Já assentados no pomposo auditório da Universidade do Parlamento, suspeito que parlamentar algum teve seu interesse conectado por um assunto de suprema importância para a democracia brasileira tal como é a democratização da comunicação no país.
Tempo novo, uma ova
A falta de público não se deveu à falta de organização, porque o evento foi bem anunciado, e contou com palestrantes de respeito e uma plateia antenada. A questão é outra: a blogosfera luta pela democracia, acima de tudo, e o brasileiro acha que essa luta teve um ponto final com o fim da ditadura militar. Não é culpa desses milhões de brasileiros acharem que navegam em mares mediterrâneos, mas a verdade é que aqui nos costados tupiniquins a maré não está para peixe e os tubarões nadam de braçadas.
Segundo a enciclopédia livre da internet, a Wikipédia, a blogosfera, inicialmente, ainda na década de 1990, designou as redes sociais formadas por autores de blogs. Seria a esfera de comunicação na internet construída originalmente pelo aumento exponencial do acesso de cidadãos às Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs). Mais tarde, o que aconteceu também no Brasil, a blogosfera passou a ser reconhecida como uma crescente rede de blogs cujos autores tendem ao debate de temas de interesse público, especialmente, os temas que a imprensa conservadora direciona, muitas vezes omite e tantas outras não permite dar voz ao contraditório.
O fomento da cidadania e a redução da desigualdade social no Brasil resumem e alavancam toda a luta da blogosfera. Eis porque a blogosfera hoje se tornou um espaço para a discussão e até o enfrentamento político. Seria um espaço apropriado para o fortalecimento da democracia? Pelo jeito sim, tamanho é o cerco político-ideológico que os usuários das redes sociais enfrentam, principalmente, em blogs, Twitter, Facebook e outros programas destinados à formação de redes sociais por meio da publicização de imagens, informações, notícias e por que não, opiniões. O fato é que o cidadão que hoje se anima a desfrutar de sua cidadania dando um simples pitaco na internet pode descobrir que vivemos em tempo novo, uma ova!
Jornalismo-cidadão
Na falta de lei que regulamente o que pode ser dito ou não na Internet, o que impera é a lei dos mais fortes. A blogosfera é tratada como se esta fosse uma perigosa ameaça que pode contaminar nosso organismo social ou piorar o quadro de artrose crônica que já o faz se arrastar. Vale lembrar que é impossível criar uma lei que proíba a liberdade de expressão, não numa democracia, mas a ameaça sofrida já produz fraturas expostas típicas de regimes fascistas: censura, autocensura, tortura psicológica e até homicídios e suicídios.
Internet sem liberdade de expressão ou com ela sob ameaça é o mesmo que um bólido da Ferrari sem gasolina. Não serve para nada, é tecnologia jogada no lixo. Por esse motivo, a blogosfera passou a defender algumas bandeiras que estão sendo multiplicadas pelos que desejam um futuro melhor para todos os cidadãos brasileiros. A blogosfera está se constituindo agora como o espaço para o verdadeiro jornalismo-cidadão.
Conectados e unidos
Entre suas bandeiras, considero como as mais desafiadoras (não necessariamente em ordem de grau de importância):
1) Que a Justiça entenda que a liberdade de expressão e manifestação do pensamento é uma garantia e direito fundamental dos cidadãos brasileiros, na defesa dos interesses públicos (republicanos), muito superior às possíveis queixas de ofensas cometidas contra políticos, empresários e autoridades públicas;
2) Que o esforço pela democratização da comunicação implique aos governos federal, estaduais e municipais a formulação de políticas públicas que apoiem a mídia e a imprensa alternativas, dando oportunidade de o povo brasileiro ter direito à voz;
3) Que o oligopólio da comunicação, formado por conhecidos “barões da mídia”, é uma ameaça à democracia, pois estes têm o poder de manipular e manter o controle mental sobre esmagadora parte da população brasileira, que fica reconhecidamente alienada pela pasteurização da informação e a desinformação que atende interesses privados, prioritariamente;
4) Que as TICs precisam ser fortalecidas pelo apoio e investimento em infraestrutura de transmissão de dados, tecnologias, softwares livres e políticas públicas intersetorias de inclusão social e digital;
5) Que a Educação precisa abraçar as TICs como ferramenta de emancipação da cidadania, oferencendo ao povo brasileiro mais chances de participar proativamente do aperfeiçoamento da República Federativa do Brasil; e
6) Que o Brasil regulamente artigos da Constituição Federal que permitem democratizar a produção de conteúdo e combata a formação de oligopólios e a concentração de poder no setor de comunicações eletrônicas, o que pode ser traduzido em um novo marco legal como “Lei de Meios”.
Encontros como esse do WebFor 2013 devem se espalhar pelo país. Mesmo que sejam menores, e até maiores, o importante é que esses debates cheguem às redes sociais e sejam multiplicados. Não importa se for uma reunião pequena, numa sala de aula, ou outra oportunidade maior, como um seminário, o importante é que a democratização da comunicação seja uma reivindicação de todo o povo brasileiro, na defesa da cidadania e do futuro do país. O WebFor 2013 foi transmitido ao vivo por um celular: maravilha, parabéns! Se não fosse assim, jamais eu teria motivação para escrever este texto. Estamos conectados e unidos.
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Fernando Fagundes é consultor de Comunicação