Enquanto o continente europeu afirma o direito ao esquecimento, o Brasil discute o direito à memória.
Além das comissões da verdade, que investigam fatos do regime militar, anda vivo por aqui o debate sobre as biografias e se é preciso permissão legal para escrevê-las.
É possível traçar um paralelo entre essa questão e o “direito de ser esquecido” do Google, garantido na semana passada pela mais alta Corte da Europa.
O Código Civil, em vigor desde 2002, exige a autorização prévia da pessoa que será biografada.
No ano passado, o STF (Supremo Tribunal Federal) realizou uma audiência pública para examinar melhor a constitucionalidade dessa exigência e, neste ano, a Câmara aprovou um projeto para mudar a lei e assegurar o trabalho dos biógrafos.
Paradoxo inusitado
Garantir o esquecimento, a fim de proteger a intimidade, pode abrir as portas para o crescimento da censura privada. Já subiu o número de pedidos para remoção de resultados de busca –entre eles, um empresário que busca sucesso na vida política e quer limpar o passado.
Na Europa, foi ressalvado que o interesse público em acessar a informação supera a eliminação de dados considerados “inadequados, irrelevantes ou excessivos”.
E se fosse um livro, ou um filme, a palavra final sobre o que pode ou não ser narrado cabe ao desejo particular ou à Justiça?
Agora o espanhol Mario Costeja González vive um paradoxo inusitado: ficou mundialmente famoso por ter conseguido o direito de ser esquecido pelo Google. Será que algum brasileiro poderá escrever essa biografia?
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Paulo Rená é jurista, trabalhou na elaboração do Marco Civil da Internet e mantém o blog da rede social DiásporaBR