Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O ocaso do e-mail

Nos tempos da internet a vapor, quando ninguém sequer sonhava com redes sociais, e os correios entregavam cartas – cartas de verdade, não só envelopes de cobrança –, o e-mail era considerado algo mágico, rápido e eficiente. Não carecia de selo e envelope, muito menos de papel, e chegava ao destinatário assim que deixava o computador do remetente. Era uma coisa mágica, comparável, no rol dos sonhos e das improbabilidades, aos tapetes voadores e ao teletransporte. Mas, naqueles tempos pioneiros, pouca gente usava a internet, e spam era só um tipo de carne enlatada que se comprava no supermercado.

A lua de mel da humanidade com o correio eletrônico durou muito e atingiu seu ápice em 2008, último ano em que se registrou crescimento no seu uso. De lá para cá, a sua popularidade vem caindo, a tal ponto que, em diversas empresas, ele vem sendo substituído, para comunicações internas, por sistemas parecidos com as redes sociais. Em outras, que sabem o estresse que ele pode causar, já existe o “Dia sem e-mail”, conforme relata Andréa Fanzeres Cordoniz, expert em treinamento. Neste dia, ninguém manda e-mail interno, o que é um desafio, mas tem feito a alegria dos funcionários.

Ouço cada vez mais queixas em relação à carga que viraram as mailboxes e me solidarizo com todas: há tempos desisti de conseguir manter a correspondência em dia, pela quantidade de lixo com que sou obrigada a lidar diariamente. Filtros de spam resolvem apenas parte do problema, porque jornalistas precisam deixar a janela aberta para assessorias de imprensa, empresas, leitores. Já deixei de ver convites para eventos a que teria gostado de comparecer por ficarem perdidos entre as dezenas de mensagens não lidas. E me sinto culpada e mal educada por não responder muitas das mensagens amáveis dos leitores.

Arquivo permanente

Em suma, a minha relação com as mailboxes tem, hoje, todo o charme que têm as coisas que fazemos por obrigação. E está a um passo da fronteira com o ódio. Mas escrevo em jornal, estou na internet desde o milênio passado, e o meu endereço de e-mail circula há décadas, de modo que não posso ser considerada, nem de longe, usuária padrão da ferramenta.

Perguntei, então, aos meus amigos de Facebook como se relacionam com as suas caixas de correio – e recebi mais de 350 respostas. A tônica é praticamente a mesma em todas elas: o e-mail virou ferramenta de trabalho. A comunicação com a família e os amigos foi transferida para o Facebook e, sobretudo, para o WhatsApp, sem falar em Skype e Viber.

Parte do resumo da ópera foi feito pelo Ricardo Mavigno, que reparou que, “nos últimos dois anos, o conteúdo do meu e-mail ficou igual ao conteúdo do correio físico, isto é, só chegam contas, propagandas e comunicações ‘oficiais’ ou de trabalho”. Essa percepção é geral. O mais interessante é observar que mesmo quem não gosta do WhatsApp o está usando, porque lá é que se encontra a maioria dos amigos. Caso da Marcela Suarez, por exemplo: “Todo mundo parou de mandar e-mail. A turma que tem iPhone só quer falar pelo WhatsApp, e a turma do Windows só pelo Skype. Quando muito, mandam e-mail pelo Facebook. Eu detesto o WhatsApp, mas a galera que eu conheço só é acessível por ele”.

Achei curioso observar, também, quanta gente usa o GMail como uma espécie de arquivo permanente. Como tem bastante espaço, nada é jamais apagado, sua pesquisa é rápida e eficiente e ele pode ser acessado através de qualquer plataforma, o GMail se transformou em caixa de guardados. Eu mesma, que uso Evernote e Dropbox, volta e meia me pego mandando e-mails para mim mesma com coisas importantes que não posso esquecer.

Na semana que vem volto a falar nisso, para dar voz a quem – acreditem! – adora e-mail. Até lá.

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  Cora Rónai é colunista do Globo