As redes sociais são a próxima fronteira das ciências sociais. Essa nova disciplina (ciências sociais aplicadas às redes sociais) já tem um nome: física social.
O termo “física social” data do Iluminismo do século 18 e era um projeto de uma ciência do humano à semelhança da mecânica newtoniana. Claro, fracassou porque o ser humano é difícil de ser contido dentro do controle das variáveis que o método científico exige. Por isso as ciências humanas são algo entre a arte, a poesia e uma ciência envergonhada com sua própria imprecisão.
Mas, eis que, com o advento das redes sociais, temos a possibilidade de aplicar métodos quantitativos a “fragmentos de comportamento” humano (sonho do behaviorismo), traduzidos em número de posts. Os físicos sociais sonham com a possibilidade de prever comportamentos nas redes (e fora dela, mas estimulados por ela) com precisão matemática.
O pesquisador do MIT Alex Pentland tem esperanças de que a física social nos traga as certezas que as ciências “duras” trazem, sem criar problemas éticos. Talvez ele seja um tanto sonhador. E mais: ele pensa que com o advento do big data seremos capazes de prever guerras, massacres, epidemias, tendências ainda invisíveis de comportamento. Enfim, seremos capazes de criar uma sociedade organizada a partir do big data (“data-driven society”).
Big data é uma gigantesca plataforma de convergência de dados que desenharia de modo muito preciso o que eu “sou”.
Essa plataforma saberia o que eu quero e o que eu não quero de modo mais objetivo do que meus devaneios existenciais, a partir do rastro do que compro, dos meus exames médicos, dos lugares que frequento, dos filmes que baixo na internet, do que como, dos remédios que tomo, das roupas que uso, dos posts que faço, enfim, dos dados que descrevem minhas escolhas e minha fisiologia.
Impacto visível
O livro “Social Physics, How Good Ideas Spread – The Lessons From a New Science” de Alex Pentland, ed. Penguin Classics, New York, 2014, (física social, como boas ideias se espalham – lições a partir de um nova ciência) é um manifesto de boas intenções com relação à ciência do big data e das redes sociais.
A ideia dele é estabelecer de modo preciso como boas ideias se espalham pelas redes e se transformam em ação no mundo.
Entretanto, até Pentland, um “integrado” à sociedade tecnológica moderna, teme pelos riscos de tamanha empreitada e chama a atenção para a necessidade de parâmetros éticos na lida com as pessoas que, afinal, estão criando esses dados e muitas vezes postando suas vidas. Temo que Pentland seja um tanto ingênuo no seu projeto.
Veja, não duvido que tal ciência ocorra (ferindo todos os parâmetros éticos existentes). Pelo contrário, formas dela já estão em curso. Temo que as redes sociais não sejam tão evidentemente “do bem” como pensa Pentland. Refiro-me aos transtornos que ela pode causar.
Nem tudo são flores na vida dessa jovem ciência. Recentemente, o artigo “Experimental evidence of massive-scale emotional contagion through social networks” (evidência experimental de contágio emocional de massa através das redes sociais), fruto de uma pesquisa desse tipo (a Folha falou desta pesquisa na segunda-feira dia 30 de junho), gerou protestos nas redes e fora dela.
A pesquisa realizada por Adam D. I. Kramer, James I. Guillory e Jeffrey T. Hancock filtrou posts recebidos por usuários do Facebook escolhidos randomicamente e sem que eles soubessem (daí os protestos). O filtro fez com que essas pessoas recebessem apenas posts com conteúdo emocional “positivo” ou “negativo” durante uma semana em janeiro de 2012.
O resultado foi que as emoções se espalharam “na velocidade da luz” provando que nas redes sociais emoções positivas e negativas se espalham indiscriminadamente, levando os usuários a repetirem (postarem) as emoções que receberam via Facebook.
O impacto é claro: as redes sociais são um veículo poderoso de reprodução de comportamentos que podem facilmente se tornar violentos. Vide o que aconteceu com a infeliz falsa “bruxa” do Guarujá.
******
Luiz Felipe Pondé é colunista da Folha de S.Paulo