A velocidade cada vez maior das mudanças tecnológicas tem destruído setores inteiros. Pense no que os celulares fizeram com as máquinas fotográficas convencionais. Ou com os navegadores automotivos com localização via satélite. Como fazer, então, para não ser vítima da inovação que vem de fora?
“É preciso reconhecer o futuro inevitável”, disse Paul Nunes, diretor global do Instituto Accenture para Alta Performance, que visitou o Brasil pela primeira vez na semana passada. Ele é coautor do livro Big Bang disruption, sobre o qual escrevi neste espaço há algumas semanas. O “futuro inevitável” é a mudança radical que está para acontecer, e que as pessoas que atuam na área normalmente conseguem identificar, mas muitas vezes têm dificuldade em aceitar.
Segundo Nunes, não há como ter certeza de que a ruptura Big Bang (referência à explosão que deu origem ao universo) vá afetar todos os setores econômicos, mas ele não consegue apontar nenhum setor que esteja imune a ela. O subtítulo do livro fala em “inovação devastadora”, causada principalmente pelo avanço das tecnologias da informação e da comunicação. O preço da capacidade computacional cai pela metade a cada dois anos, e isso acaba afetando todas as indústrias.
“Mesmo um setor como a mineração, baseado em maquinaria pesada, atualmente utiliza caminhões autônomos. Existe uma camada de software nos equipamentos usados pelas mineradoras. Toda indústria é uma indústria digital”, explicou Nunes. Escrito em parceria com Larry Downes, o livro ainda não tem uma versão em português.
A inovação devastadora atinge cada setor em momentos diferentes. “O ponto de inflexão acontece quando as economias da queda de preço da tecnologia são maiores do que os gastos necessários em inovação”, disse Nunes. Ele citou o caso da Amazon, com o leitor de livros eletrônico Kindle. Outras empresas tinham criado aparelhos similares antes, sem sucesso. Mas a Amazon tinha as informações necessárias sobre os mercados de livros e de eletrônicos para saber quando lançar seu produto. “Eles tiveram paciência de esperar a tecnologia ultrapassar o limiar do preço.”
Além disso, vivemos numa época de inovação combinatória, o que acelera ainda mais as mudanças. “Os concorrentes levaram poucos meses para lançar rivais do iPad, porque os componentes estavam todos disponíveis”, exemplificou o diretor da Accenture.
Antigamente, a ascensão e a queda de uma nova tecnologia eram representadas por um gráfico de sino. Havia um crescimento lento, que depois dava lugar a um declínio num ritmo parecido. Hoje, Nunes e Downes apontaram no seu livro, o gráfico se parece mais com uma barbatana de tubarão, com uma alta acelerada e uma queda ainda mais abrupta.
“As pessoas não são boas em entender mudança não linear”, disse Downes.
Previsões
Está errado achar que é impossível conhecer o futuro, de acordo com o diretor da Accenture. “Dá para saber ‘o que’, mesmo que seja difícil dizer ‘como’ e ‘quem’”, explicou Downes. “Existem empresas que são melhores nisso e outras que são piores. Se alguém consegue se antecipar várias vezes, não é sorte. Mas mesmo os melhores erram. Tiger Woods não deixa de ser um grande jogador porque errou uma tacada.”
Diferenças
Downes ficou entusiasmado com algumas coisas que viu no Brasil. “Um aplicativo como Easy Taxi está por toda parte”, disse o autor. “Vocês têm leitores de palma de mão em caixas automáticos, o que não temos nos Estados Unidos. Vejo mais hackathons (maratonas de programação) e corporate venture (fundos de investimento em startups criados por empresas) por aqui que em outros países. O futuro já está no Brasil, pelo menos em algumas partes.”
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Renato Cruz é colunista do Estado de S.Paulo