Jornal por jornal, sou mais o Facebook. Sob qualquer critério. Para começar, ele contém todos os outros. É impossível entrar na rede sem trombar com um link para uma notícia e, a partir dela, vasculhar o portal de onde proveio. O Facebook dá acesso a notícias do mundo todo, em todas as línguas e mídias, e isso já o faz, de saída, o mais completo jornal existente.
O Facebook é também o mais plural, um produto coletivo de todos os seus usuários – 1,23 bilhão no mundo, 61,2 milhões no Brasil. Todo mundo lê, mas todo mundo também publica. Assim, todas as visões coexistem, de um extremo a outro de todos os espectros: político, religioso, cultural, moral, o que se queira. Simplesmente todos os discursos do universo se apresentam.
O Facebook é o jornal mais diversificado. Os formatos de imagem, os gêneros narrativos e os estilos de texto variam nele como em nenhuma outra publicação. É reportagem, crônica, poema, depoimento, aforismo, crítica, ensaio, foto, arte, vídeo, desenho, pintura, tudo que foi inventado até agora para a expressão do pensamento. O leitor pode trombar com uma estética futurista num post e ser remetido ao passado longínquo, no post seguinte. Transita das pensatas mais cabeludas para as trivialidades domésticas, passando por todo e qualquer tema de interesse do vasto zoológico humano.
O Facebook é ainda o jornal mais democrático. Todos têm a palavra e intervêm no debate. Uma vez publicado, o post pertence ao mundo. As ideias que ele contém podem ser apoiadas, corroboradas e complementadas, como o exato oposto: combatidas, desmontadas, deturpadas, arrasadas. A responsabilidade de censura fica nas mãos de quem publica, como na mídia convencional. Mas só pode ser exercida a posteriori, o que expõe – e inibe – o censor.
Senso perdido
Vendo as coisas desse prisma, até parece que o Facebook é o Fim da História na mídia, o veículo definitivo. Mas todo mundo sabe que ele está longe disso. É antes uma balbúrdia, um playground de desatinados, um altar ao exagero, um ringue de luta, um campo onde a expressão é tanta e tão livre que gera apenas incomunicação.
Esse misto de fascínio e incômodo, sentimento tão típico do usuário de Facebook, deveria inspirar alguma reflexão sobre o papel dos jornais na seleção de informações, dosagem, hierarquização e tratamento. Esta é a sua maior utilidade, a de filtrar e ponderar os fatos, e apresentar uma visão organizada do mundo.
Nunca foi tão necessário que o jornal cumprisse o seu papel. Nunca, entretanto, ele falhou tanto nisso como agora. Que o cidadão seja tragado pelo vórtice caótico e fascinante do Facebook é compreensível, mas que o jornal perca o senso de medida dos fatos, apenas enterra sua chance de ser farol onde o caos produz escuridão.
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Gabriel Priolli foi editor executivo e diretor de redação da revista Imprensa entre 1987 e 1991; hoje é produtor independente de TV