Envergonhada. Foi assim que Maria Clara Ribeiro, 17 anos, ficou após cometer uma gafe tremenda. Fazia um trabalho sobre drogas na escola e tinha que enviar sua parte para um colega da sala. Mandou um e-mail não apenas para a pessoa errada, mas também anexou um conteúdo diferente do correto. “Isso aconteceu por não saber como mexer em e-mail. Eu tenho um, mas nunca falei: ‘me manda um e-mail para a gente conversar’. Só uso quando esqueço a senha de um site e tenho que resgatá-la”, diz.
Quando pequena, Maria Clara criou seu e-mail para poder entrar no MSN, o software de mensagens instantâneas mais popular da época. De início, pensou que o correio eletrônico seria bem útil, já que sua mãe costumava usá-lo. Não foi o que aconteceu. “Foram surgindo outras redes sociais para me comunicar, como Twitter, Orkut, Facebook, e percebi que ninguém usava e-mail. As pessoas simplesmente pararam de falar a palavra ‘e-mail’. Agora, minha mãe só usa para o trabalho”, diz.
Apesar de 36% dos jovens de 16 a 25 anos acessarem o e-mail todos os dias, segundo a pesquisa Juventude Conectada (parceria entre Escola do Futuro, da USP, Ibope Media e Telefônica), acesso não significa uso. “Uma infinidade de coisas na internet ainda dependem de confirmação, de código para acesso. E isso é enviado via e-mail. Mas esse jovem entra, vê, e pronto. Ele não chega a usá-lo”, diz Samantha Kutscka, coordenadora do projeto e pesquisadora da Escola do Futuro.
E, de fato, esses jovens usam o e-mail apenas quando necessário. Segundo uma pesquisa do Ibope feita em 13 capitais do Brasil, 17% dos jovens entre 10 e 19 anos usam o e-mail na empresa. O número cai para apenas 2% dessa população quando a navegação é feita em celulares e tablets e somente 1% em acessos em casa.
Agora nas festas de fim do ano, Renato Biagi, 16, deve fazer algo no computador que não faz há três meses: entrar em seu e-mail. Isso porque sua mãe, que não possui Whatsapp, lota a caixa de entrada do filho quando a família se reúne. “Não acho que tenha algo ruim no e-mail, apenas não preciso dele. Não pego e falo: ‘hoje vou entrar no e-mail’”, afirma.
A agilidade da conversa nos novos aplicativos é um dos fatores que explicam a falta de interesse dos jovens nativos digitais pelo e-mail.
“O e-mail tem uma sucessão de etapas até que a mensagem chegue ao interlocutor. Os aplicativos em dispositivos móveis eliminaram isso. Eles te mandam sinais instantâneos quando uma mensagem é enviada, quando é lida. Essa geração de jovens está acostumada a isso”, diz Elizabeth Saad, pesquisadora de mídias digitais da Universidade de São Paulo (USP).
A pesquisa Juventude Conectada constatou ainda que quanto mais velho e mais elitizado o jovem, mais ele usa o e-mail. “De 19 anos para cima, na faculdade, é quando se observa o maior número de jovens que usam e-mail. Mas ainda assim é para ver novidades acadêmicas, imprimir o boleto da mensalidade, pegar um texto que o professor mandou”, explica Samantha Kutscka, da Escola do Futuro.
Base de usuários de e-mail deve aumentar até 2018
Apesar de preterido por usuários mais jovens, o e-mail não corre nenhum risco de extinção. Segundo pesquisas, seu alcance deve na verdade se expandir nos próximos anos.
É o que aponta, por exemplo, relatório do Radicati Group, localizado em Palo Alto, EUA, que fornece levantamentos sobre uso de e-mails, mensagens instantâneas e redes sociais. O número de contas de e-mails deve passar de 4,1 bilhões em 2014 para 5,2 bilhões no fim de 2018. Além disso, a quantidade de usuários nesse mesmo período também deve aumentar de 2,5 bilhões para 2,8 bilhões.
Ainda que muitas contas existam apenas porque o usuário precisa se inscrever nesse serviço para acessar outros, como no caso do Gmail e dos aplicativos do Google, existem muitas razões pelas quais as pessoas ainda precisam de uma caixa de correio eletrônica.
Em comparação com outros modos de comunicação online, o e-mail leva vantagem em diversas utilizações: documentação de conversas e mensagens; comunicação em tom formal, adequada para empresas ou instituições; recebimento de mensagens de confirmação ou de ativação de sites ou serviços.
“Existe uma tendência de que aquilo que é mais formal seja mandado por e-mail, enquanto as ações de caráter menos decisório migrem para outras formas de comunicação, principalmente grupos de WhatsApp”, acredita a professora Elizabeth Saad, da USP.
A estudante de Direito Ana Moura, de 19 anos, é um desses casos: ela não usava e-mail até passar no vestibular. Ao fim de seu primeiro ano de faculdade já era usuária habitual. “Acho o e-mail prático, bem organizado, fácil de usar. Além disso, dá mais privacidade que as redes sociais”, diz.
Outra vantagem dos e-mails é sua capacidade de armazenamento. O Gmail, e-mail grátis mais usado do mundo, possui 15 gigabytes de memória. Já o concorrente YahooMail oferece até 1 terabyte de espaço. “No Whatsapp, qualquer foto ou vídeo baixado vai direto para a memória do celular, e isso tem que ser deletado de tempo em tempo”, afirma Samantha Kutscka, da Escola do Futuro.
Muitos apostam também no e-mail como uma ferramenta de marketing com eficácia maior que as redes sociais. Um relatório da consultoria McKinsey concluiu que ele é 40 vezes mais eficiente em conseguir novos clientes do que o Facebook e o Twitter combinados.
Na mesma linha segue o relatório “Estratégias de Relações Sociais que Funcionam”, publicado em novembro pela consultoria Forrester Research, que sentenciou que as redes sociais são “perda de tempo” para marcas.
De acordo com o autor da pesquisa da Forrester, Nate Elliot, e-mails são entregues a mais de 90% dos destinatários, enquanto posts no Facebook só chegam a 2% dos seguidores das marcas.
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Mateus Luiz de Souza, para o Estado de S.Paulo