Eles não conheceram o mundo sem internet, não diferenciam a vida online da off-line e querem tudo para agora. São críticos, dinâmicos, exigentes, sabem o que querem, autoditadas, não gostam das hierarquias nem de horários poucos flexíveis. São os jovens da Geração Z, que nasceram depois de 1995, e que agora começam a entrar no mercado de trabalho bastante confiantes. A chegada dessa nova geração ao meio organizacional já causa certos impactos por conta das características peculiares desse jovens e vai exigir que empresas se adaptem e apliquem novas práticas para atrair e reter esses profissionais.
“Eles enxergam o mundo diferente. Sua relação com o tempo é outra, é online, a maneira como lidam com hierarquias e a autoridade, enfim, tudo é diferente para a geração deste milênio e as organizações devem se inspirar nela”, afirma o doutor em comunicação Dado Schneider. Ele estuda o comportamento dessa nova geração há anos e acredita que ela será revolucionária.
Hoje, na opinião do especialista, os jovens não se submetem a condições de trabalho que não os satisfaçam. “Mas não os considero arrogantes, eles apenas sabem o que querem. Diferentemente da Geração X (nascidos entre o fim de 1960 e 1980), que aceita as normas de trabalho, e daGeração Y (nascidos entre 1980 e 1995), que finge que aceita, eles são questionadores e possuem bons argumentos. A verdade é que eles são bastante maduros, assertivos e vão ser os chefes da geração Y em poucos anos”, prevê.
A estudante Mariana Orteblad, de 17 anos, é uma típica nativa digital. Usa o celular o dia inteiro e, quando qualquer dúvida surge, não pensa duas vezes, consulta logo o Google. Smartphone, tablet e redes sociais fazem parte da vida dela para se relacionar com os amigos, assistir a filmes e estudar. Segundo a jovem, apenas dessa maneira consegue acompanhar a velocidade e a abundância de informações. Nas aulas do cursinho, a estudante ainda escreve algumas anotações a lápis, mas confessa que é muito mais rápida digitando na tela do smartphone. Mariana vai prestar vestibular para administração a pedidos dos pais, que são de uma geração em que fazer carreira em uma mesma empresa era sinônimo de segurança financeira e sucesso.
“Eu até tenho vontade de trabalhar em uma multinacional, quem sabe na área de marketing, mas não para sempre. Meu sonho mesmo é ser atriz de TV. Resolvi fazer duas faculdades, uma de teatro e outra de administração, caso esse desejo de ser atriz não dê certo. O importante mesmo é ter prazer no que vou fazer. Acho muito mais importante do que o dinheiro que vou ganhar”, afirma.
Pesquisas mostram que, assim como Mariana, os nativos digitais são menos motivados por dinheiro que a Geração Y e têm mais ambições empreendedoras. A pró-atividade com relação aos meios digitais também levam muitos a desejarem ter sua própria start-up. “Eles não nasceram para serem empregados, e sim, para empreender e empregar. O trabalho para eles precisa ser uma extensão da casa. Essa geração vai nos ensinar a ter prazer com o trabalho”, explica Schneider.
A estudante Alessandra Agrumi, de 18 anos, é prova disso. Há um ano, o que começou como uma brincadeira para ela acabou se transformando em um site, que já possui parcerias com algumas empresas e que ela pretende transformar em um negócio com patrocinadores. A página aborda temas de moda e estilo de vida para o público adolescente. Apaixonada por tecnologias, Alessandra conta que “seu primeiro bom dia e seu último boa noite é para o celular”, onde pode atualizar rapidamente as informações do seu blog no Facebook e no Instagram. Ela também possui um canal no YouTube em que produz vídeos sobre o mundo da moda. “Quando me formar em administração, quero ter uma empresa relacionada ao mercado de roupa de luxo e todas essas redes que venho mantendo serão uma maneira de promover o meu negócio.”
Além da veia empreendedora, não é novidade que o costume de se dedicar quase toda a carreira a uma só empresa veio mudando ao longo das últimas gerações. Porém, foi com a Geração Z que essa tendência se consolidou. “Até mesmo as empresas já estão aceitando melhor os currículos dos profissionais que ficam menos tempo em um lugar, com passagens rápidas por elas. Isso antigamente não era bem visto pelas consultorias que contratam”, explica Diogo Forghieri, gerente regional da Randstad Professionals, especializada em recrutamento e seleção de profissionais.
Diferentemente da Geração Y, os nativos digitais não têm em mente o conceito work hard, play hard. O jargão sempre foi usado pelos jovens que se esforçavam muito no trabalho para ganhar bem e ter tudo que desejavam. De acordo com a coach Marie-Josette Brauer, os Y gastam com audácia e poucos limites enquanto grande parte dos Z prefere economizar. “A geração anterior cresceu em um momento de economia forte e a atual cresceu com o terrorismo, complexidade e volatilidade”, explica.
Flexibilidade no trabalho
Os nascidos neste milênio não querem abrir mão do seu tempo livre. Não consideram que trabalhar muito e ficar no escritório horas depois do fim do expediente seja gratificante. Além disso, eles preferem trabalhar de casa. Oito em cada dez brasileiros da Geração Z exigem condições de trabalho mais flexíveis que as gerações anteriores, aponta uma pesquisa da Randstad.
A estudante de Artes Visuais Yasmim Coolwijk, de 20 anos, atribui sua recente demissão à pouca flexibilidade da então chefe. A jovem trabalhava em uma loja de roupas, mas foi demitida na semana passada após meses de contrato. O motivo? Faltou um dia de trabalho. “Tive uma festa de formatura de um amigo e no outro dia estava muito cansada e com ressaca. Falei com a minha ex-chefe que não seria nem um pouco produtivo que eu fosse trabalhar. Dez dias depois, ela me demitiu explicando que esse comportamento não era aceitável. Ela era muito rígida, nesse caso foi uma festa, mas ela já não admitia nem cinco minutos de atraso, mesmo se eu explicasse que estava voltando da faculdade. Ela se esqueceu quantas vezes eu fiz horas extras no Natal”, explica.
Faltar o trabalho depois de uma festa pode parecer inaceitável aos olhos das novas gerações, mas as empresas que compreenderem as peculiaridades deste novo grupo profissional e estiverem dispostas a se adaptarem a essa geração sairão na frente. “O comportamento tanto dos jovens quanto das organizações está em constante mudança e evolução. As empresas precisam estar atentas e ter flexibilidade para alinhar suas práticas e programas para estarem sempre atualizadas, colaborando na retenção e desenvolvimento de futuros talentos”, afirma a gerente de aquisição de talentos da AkzoNobel.
A coach Marie-Josette ressalta, entretanto, que é importante que as companhias se perguntem se realmente estão prontas para a Geração Z. “Esses jovens podem dar muita dor de cabeça, e muito grave, se a empresa não atender às suas necessidades, tanto como clientes quanto como funcionários”, afirma.
No campo da carreira, o mercado observa que há uma tendência a que sejam futuros profissionais com abordagem mais generalista, de acordo com Forghieri, da Randstad Professionals. Por isso, há uma preocupação por ausência de especialistas em algumas áreas. “Isso acontece por causa do amplo acesso que a Geração Z tem às informações, por meio da internet, utilizando ferramentas como smartphones, tablets etc. Eles recebem muita informação, mas não se aprofundam em nada”, afirma.
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Heloísa Mendonça, do El País