Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A responsabilidade dos pais

O direito e o dever educativo dos pais qualificam-se como essenciais, ligados como estão à transmissão da vida humana; como original e primário, em relação ao dever de educar dos outros, pela unidade da relação de amor que subsiste entre pais e filhos; como insubstituível e inalienável e, portanto, não delegável totalmente a outros ou por usurpável.” (João Paulo II, “A missão da família cristã no mundo de hoje”)

Educar na sociedade da informação não é apenas investir em aparato tecnológico e ensinar a usá-lo. Não adianta o jovem saber como utilizar a ferramenta digital; é preciso educá-lo sobre como usá-la de maneira responsável, ética e segura. É dever do educador orientar no uso correto da rede, indicando as conseqüências da utilização inapropriada não só para o indivíduo mas também para a sociedade.

Os pais desempenham papel importante na educação, mas muitas vezes se sentem perdidos em meio a tantas inovações tecnológicas, sem saber quais os limites a serem impostos, ou mesmo sem terem real conhecimento dos perigos que seus filhos correm em virtude da descontrolada exposição online.

Também restam confusos quanto aos papéis na educação, deixando a cargo da escola, inclusive, o que deveria ser sua obrigação. A educação no âmbito privado (valores morais) é responsabilidade da família, enquanto no âmbito público (cultura, conhecimentos) é responsabilidade da escola. Os pais devem assumir sua parte como educadores e não cobrar da escola funções que deveriam ser suas.

Pedófilos e seqüestradores, phishing scam, cyberbullying, boas maneiras, conteúdos inapropriados a menores, conseqüências legais do mau uso da internet, crimes cometidos sob a falsa impressão de anonimato, inabilidade de pensamento crítico quanto a informações falsas e verdadeiras disponíveis na rede, plágio, pirataria e até uso indevido da marca da escola são alguns dos assuntos sobre os quais poucos pais conversam com os filhos.

Muitos acreditam que filtros de conteúdo ou bloqueadores podem ser a solução para a falta de tempo em acompanhar o filho na internet. Ledo engano! Não podemos fugir de nossas obrigações. Como os filtros de conteúdo não são 100% eficientes (nenhuma tecnologia é!), é quase inevitável que crianças e adolescentes se deparem com pornografia infantil e adulta, conteúdos que promovem delinqüência (destruir, construir armas, falsificar documentos etc.), conteúdos que promovem ódio, tráfico de drogas, jogos de azar, entre outros. Assim, não há tecnologia que substitua uma boa conversa sobre domínio da curiosidade e moderação. Como os jovens são peritos em descobrir meios de burlar os filtros, sua reação é que fará toda a diferença.

Agressão à honra

Há modos fáceis de as crianças entrarem em contato com conteúdos inapropriados: propagandas (pop-ups, na maioria), palavras em sites de busca, typosquatting e cybersquatting, spam por e-mail, entre outros. As crianças devem conhecer tudo isso para saber o que fazer.

Outro ponto a ser observado é o ensino sobre a diferença entre domínio público e ambiente público. Muitas crianças e adolescentes pensam que se o conteúdo está na internet é porque pode ser utilizado de qualquer forma, sem ao menos pedir autorização ao responsável por ele. Porém, nem tudo o que está em ‘ambiente público’ (no caso, a internet) está em ‘domínio público’ (hipótese legal na qual o material pode ser utilizado sem autorização do autor).

Da mesma forma deve ser esclarecido o falso anonimato. Crimes são cometidos em blogs e comunidades virtuais (como o Orkut) porque o usuário acredita que não será identificado se fizer uso da condição de anônimo. Lembramos que é perfeitamente possível identificar qualquer usuário na web através do número de IP (Internet Protocol), que identifica cada um de nossos computadores conectados.

Baixar músicas sem pagar direitos autorais através de programas P2P (peer-to-peer), como o Kazaa, eMule, LimeWire etc., também é um ato inocente que pode causar muita dor-de-cabeça a filhos e pais. A Federação Internacional da Indústria Fonográfica (IFPI), com sede em Londres, está engajada em localizar e processar civil e criminalmente qualquer usuário que baixe ou compartilhe músicas ilegalmente, inclusive no Brasil (o que já está acontecendo). Recomenda-se o incentivo de downloads de forma legal em sites especializados em venda de música. Para tanto, uma idéia é dar uma ‘mesada’ específica para este fim.

Quanto ao cyberbullying (quando um aluno persegue e humilha a outro no ambiente virtual), deve ser esclarecido que há punições não só no âmbito judicial, mas também escolar. Escolas têm independência para advertir, suspender ou expulsar alunos, como em casos de agressão à honra de outros alunos ou professores na internet e desobediência a ordens impostas no uso da rede na instituição. No Rio de Janeiro, a desembargadora Cássia Medeiros afirmou num caso de suspensão escolar de estudante da 1ª série do Ensino Médio: ‘Desde que não existam abusos, a aplicação de penas disciplinares por instituições de ensino a seus alunos não pode ser revista pelo Judiciário’.

Experiências positivas

Jovens devem pensar mais de duas vezes antes de publicar algo online, pois os resultados podem ser avassaladores. Reforcem: cada um é responsável pelo que escreve. Neste sentido, tanto crianças quanto adolescentes podem ser punidos pessoalmente por seus atos ilegais no âmbito criminal. Menores de 18 anos não cometem crimes, mas sim atos infracionais, apenados de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente. As penas são medidas socioeducativas a serem definidas pelo juiz, que podem ir de programas comunitários a tratamento psiquiátrico. Os pais, por sua vez, podem sofrer ações de indenização civil, sentindo no bolso as conseqüências dos atos dos filhos.

Pensando ainda mais longe, a educação para o uso das tecnologias hoje pode refletir na vida profissional de jovem amanhã. Educando-o enquanto jovem, está-se preparando um profissional apto a lidar com o ambiente de trabalho. O domínio da tecnologia é um diferencial do profissional moderno e, sem o seguro, responsável e ético uso das ferramentas digitais, o espaço de trabalho diminui.

Por nos possibilitar a oportunidade de atravessar fronteiras, derrubar barreiras e dividir idéias de forma única, a internet não é vilã, mas aliada, que proporciona o aumento da capacidade de leitura (estimulando novas leituras), ajuda a encontrar informações, resolver problemas, comunicar, e sem dúvida a adquirir competências cada vez mais exigidas no mercado de trabalho. Compete aos pais assumir seus papéis de educadores para que seus filhos tenham uma experiência positiva online.

******

Advogada, consultora, palestrante