Leia abaixo a seleção de quarta-feira para a seção Entre Aspas.
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Folha de S. Paulo
Quarta-feira, 8 de outubro de 2008
ATENTADO
Fechamento de jornal no Rio é ataque à democracia, diz ANJ
‘A ANJ (Associação Nacional de Jornais) criticou a decisão do juiz Flávio Silveira Quaresma, da 28ª Zona Eleitoral do Rio, que mandou fechar o periódico ‘Entre-Rios Jornal’, do município de Três Rios (a 120 km do Rio).
Em nota divulgada ontem, a entidade caracterizou o episódio como um atentado à liberdade de imprensa cometido por alguns magistrados eleitorais de primeira instância. ‘É lamentável que, atendendo a pedidos de políticos, eles (juízes eleitorais) venham exercendo a censura e até determinando a ocupação de jornais. Em lugar de fazer justiça, estão atacando a democracia’, diz a nota assinada pelo vice-presidente Júlio César Mesquita.
O jornal foi fechado na última sexta-feira e seus funcionários foram expulsos do prédio por policiais. O motivo foi a não-publicação de um direito de resposta do prefeito de Paraíba do Sul, Gil Leal. O periódico foi reaberto no sábado após obter uma liminar.’
CRISE
Guerra financeira
‘O NOTICIÁRIO a respeito da crise financeira evoca um cenário de guerra mundial, com diversos fronts espalhados pelo planeta. Da Austrália ao Brasil, da China à Rússia, da Alemanha aos Estados Unidos, governos mobilizam arsenais financeiros para tentar deter o efeito destrutivo do pânico que, ao alastrar-se depressa, paralisa os negócios.
Os múltiplos combates, contudo, mostram-se débeis e disfuncionais diante de uma ameaça que não respeita fronteiras -ou, pior, que ganha força quando falta ação coordenada para atacá-lo. O descrédito no sistema financeiro é global, mas as abordagens para enfrentá-lo são nacionais, limitadas e heterogêneas.
Mais lentamente do que seria desejável, as autoridades econômicas mundiais vão se dando conta dessa debilidade estratégica. A Europa começou a corrigir a catastrófica atitude tomada no fim de semana, quando líderes do continente se reuniram em Paris para nada decidir e cada país se sentiu livre para atuar da maneira que lhe conviesse.
Produziram um furacão financeiro na segunda-feira, o que os levou a traçar a primeira linha de combate minimamente combinada: elevaram, de 20 mil para 50 mil, a garantia de depósitos bancários nos 27 países do bloco europeu e afirmaram que vão impedir a quebra de grandes instituições financeiras e facilitar a sua recapitalização. Enquanto isso, os bancos centrais europeus, o japonês e o canadense se articularam ao Fed (BC dos EUA) para oferecer US$ 450 bilhões ao sistema bancário.
O presidente George W. Bush, por seu turno, disse que mantém contato com líderes europeus ‘para assegurar que nossas ações sejam estreitamente coordenadas’. Uma reunião entre autoridades financeiras do G7 (países mais ricos) está marcada para sexta, em Washington. Configura-se ocasião ideal para anunciar um plano conjunto -programa que, para ampliar sua eficácia, não deveria dispensar a participação de países como China, Brasil e Rússia, detentores de grandes caixas em dólar.
Além da turbulência na Europa, que ensejou um pacote de até US$ 87 bilhões para estatizar parte dos bancos no Reino Unido, o pessimismo que derrubou novamente as Bolsas ontem foi influenciado por uma fala do chefe do Fed, Ben Bernanke. Ele afirmou apenas o óbvio: o prognóstico para a economia americana em 2009 piorou. Deixou no ar a possibilidade de uma redução da taxa de juros básica dos EUA, hoje em 2% ao ano.
Retorna, nesse ponto, a necessidade de uma estratégia global para vencer a profunda crise de confiança que se alastra pelo planeta. Seria um desperdício que um dos armamentos mais poderosos do Fed, a redução dos juros de curto prazo, fosse utilizado sem articulação com outros países que passam pela mesma situação, já algo desesperadora.
Uma diminuição mundial e sincronizada no custo dos empréstimos ampliaria as chances de que a derrocada fosse ao menos estancada. A notícia de que a crise chegou ao fundo do poço já seria boa neste momento.’
Clóvis Rossi
Começa a era da incerteza
‘MADRI – As falhas grosseiras que o mercado apresentou e as sucessivas intervenções dos governos levaram à suposição de que o liberalismo morreu ou está em coma e que o intervencionismo estatal está de volta com toda a força, certo?
Errado, escreve Daniel Innerarity, professor de filosofia da Universidade de Zaragoza, em artigo para o jornal ‘El País’.
‘Se estivéssemos ante o final do neoliberalismo e o retorno das certezas social-democratas, talvez nos sentíssemos mais aliviados, mas não teríamos entendido que o que se acaba é outra coisa: uma determinada concepção de nosso saber acerca da realidade social e de nossa capacidade de decidir sobre ela’, escreve.
Conseqüência: ‘Agora, nos toca acostumarmo-nos à instabilidade e à incerteza, tanto no que diz respeito às predições dos economistas, ao comportamento do mercado ou ao exercício das lideranças políticas’, acrescenta o filósofo.
Fecha com: ‘Nosso principal desafio é a governança do risco, que não é a renúncia a regulá-lo nem a ilusão de que poderíamos eliminá-lo completamente’.
Desagradável, não é? Os seres humanos, com poucas exceções, preferimos as certezas, mesmo que sejam ilusórias. Os mercados ofereceram certezas absolutas, acompanhados pelo coro que lhes conferia características de semideuses ou de ‘Mestres do Universo’, para remeter a Tom Wolfe e a sua ‘Fogueira das Vaidades’.
Agora vem o papa Bento 16 e constata: ‘Vemos que, na queda dos grandes bancos, o dinheiro se desfaz e que todas essas coisas que parecem a única verdade são na realidade de segunda ordem’. Sorte do papa (e dos crentes), para quem ‘só a palavra de Deus é uma realidade sólida’.
Para todos os demais (e mesmo para os crentes que têm dinheiro nas Bolsas), resta administrar a instabilidade e a incerteza.’
REGRA BÁSICA
Boa vida para entrevistados
‘RIO DE JANEIRO – A lei reza: repórter de jornal, de rádio ou de TV, só com diploma. Significa que são rapazes e moças que passaram por cursos de jornalismo -e, quando eles dão às ruas, ao fim do curso, não vêm ‘como espiões solitários, mas em batalhões’, apud ‘Hamlet’. Pois temo que, na faculdade, seus professores estejam se esquecendo de ensinar uma regra básica: ao entrevistar alguém, façam apenas uma pergunta de cada vez.
É o que mais se vê nas entrevistas coletivas que a TV transmite, principalmente aquelas com os técnicos de futebol, aos domingos, depois dos jogos. O repórter faz uma longa pergunta, que parece maior ainda pela falta de objetividade, e, quando enfim a dá por encerrada, emenda com: ‘Outra coisa…’ -e segue-se uma segunda pergunta, tão interminável quanto a primeira.
O treinador, ou qualquer entrevistado, se for esperto, só responderá à segunda pergunta, e levará tanto tempo fazendo isto que, quando acabar, ninguém mais se lembrará da primeira. Ou responderá apenas à que lhe for conveniente, com o que a outra também irá para o espaço. Contraria frontalmente um princípio elementar da profissão: numa entrevista, o que importa não é a pergunta, mas a resposta.
Outro tipo de pergunta que tenho visto ser formulada com freqüência é aquela, também interminável e tão elaborada pelo repórter, que pode ser respondida pelo entrevistado com uma simples palavra: ‘Exato’. Ou: ‘Correto’. Ou, num incontrolável arroubo verbal: ‘É isso aí!’.
E há uma forma de entrevista que começa a ficar perigosamente popular por aqui, em que o repórter não faz perguntas, mas afirmações. Foram os franceses do ‘Cahiers du Cinema’ que a inventaram nos anos 60. Exemplo: ‘Seu filme é um delírio verbivocovisual’. O entrevistado, feliz da vida, finge que entende e concorda.’
ESCOLA
Demissão na escola
‘‘Gostaria de comentar a reportagem ‘A guerra das palavras’, publicada no Mais! de domingo passado.
Sou pai de duas crianças de 11 anos que estudam no Rio de Janeiro, em escola similar à Escola Parque. Ambas estão no 6º ano. Escrevo poesia, algumas das quais de forte conteúdo erótico.
Daqui a alguns anos, quando elas souberem sobre sexo e suas práticas, talvez irão gostar de lê-las; hoje, nem pensar. Não acho que o professor Teixeira deveria ter sido demitido por escrever poesias eróticas, mas tenho sérias dúvidas sobre se minhas minhas filhas ou qualquer outra garota da idade delas -ou mesmo um ano mais velha- têm capacidade para discernir o conteúdo da poesia de Drummond de Andrade publicada -e nem sei se a apreciariam se tivessem acesso a ela.
E, pelo que me consta, Teixeira nunca sugeriu que seus alunos lessem seu blog ou seus poemas.’
DANIEL WILLMER (Rio de Janeiro, RJ)’
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‘‘É triste, sobretudo para quem, como eu, é professor de literatura, descobrir o motivo da demissão do professor Oswaldo Teixeira (caderno Mais!, 5/10).
Embora me alegre em saber que a atividade poética ainda pode causar incômodo, fica a pergunta: até quando as escolas particulares serão reféns de gente obtusa, cujo argumento maior é a quantidade de grana na conta bancária?’
LEANDRO VEIGA DAINESI (Lorena, SP)’
TODA MÍDIA
‘Eu avisei…’
‘‘Mr. Doom’, Nouriel Roubini, enviou e-mail ontem ao site Portfolio, curto e direto: ‘Nós estamos perto do derretimento financeiro e corporativo total, cara’. A única instituição disposta a emprestar é o banco central americano. ‘Atingimos o ponto em que o Fed é o único banco no país ou, melhor, no mundo.’
Lembra os 12 passos que listou em fevereiro, até a ‘mãe de todos os derretimentos’, e diz, sem modéstia: ‘Estamos agora, como previ, no 12º passo. Desculpe-me por dizer que eu te avisei…’ Para quem não leu no site de Roubini ou, depois, na coluna de Martin Wolf, o 12º seria ‘um círculo vicioso de perdas, liqüidações forçadas, vendas de ativos’ a qualquer preço etc.
Seu erro, diz em entrevista ao Council on Foreign Relations, foi prever dois anos, não sete meses.
Mas o ‘Sr. Apocalipse’, pela primeira vez, arrisca na direção contrária, de contenção do desastre. No final da semana, defendeu que o Fed dispensasse os bancos e passasse a emprestar diretamente às corporações. Foi o que o Fed fez, ontem. Não basta, afirma Roubini, receitando garantir todos os depósitos e fazer uma ‘triagem radical entre bancos solventes e insolventes a serem fechados’, para começar a conter o desespero -e evitar, não mais recessão, mas depressão global.
‘MUDEI DE IDÉIA’
Martin Wolf, no ‘FT’, diz que, como os fatos, ele mudou. Que ‘é hora de resgates amplos’, não mais por banco ou país, mas no mundo e de maneira coordenada. E de cortar ‘um ponto inteiro’ nos juros. Aos ministros do G7, avisa que ‘a história vai julgar’ se vão restabelecer a confiança -ou se tornar ‘os autores de outra Grande Depressão’
‘BANK OF USA’
O ‘FT’ se manteve ausente do sobe-e-desce o dia todo, com a manchete on-line de que o Fed já ‘ignora os bancos e empresta diretamente às empresas, em tentativa sem precedentes de descongelar os mercados de dinheiro’. Abaixo, na análise ‘Banco dos EUA’, dizia ser ‘a coisa certa’.
‘New York Times’ e ‘Wall Street Journal’ focaram Wall Street, que desabou depois do discurso do presidente do Fed, sinalizando cortar juros. O Bank of America caiu 25%.
SEM FIM, SEM FUNDO
O site da ‘Economist’ já vislumbra um ‘padrão’ nos pacotes seguidos de rejeição pelos mercados, num círculo vicioso ‘sem um fim à vista’.
O site MarketWatch, em análise de 160 ‘newsletters’ financeiras, vai por aí. A crise ainda está ‘sem fundo’. Diz que a sensação na segunda era de capitulação frente à crise, mas já havia sido assim dias antes. ‘Como a revolução’, arrisca o site, ‘a capitulação não vai ser televisionada’. Poucos vão perceber, no dia.
KREMLIN, AO RESGATE
No ‘FT’ e outros, a Islândia foi parar ontem nos braços da Rússia. Foi ‘forçada a buscar injeção de capital russo’, mas antes ‘expressou sua decepção com os aliados ocidentais, que falharam em providenciar apoio para enfrentar a crise’. No dizer do primeiro-ministro, sem ‘nossos amigos, tivemos que procurar novos amigos’.
‘Guardian’ e outros ecoaram o videoblog do presidente russo, Dmitri Medveded, 43, que postou sobre o encontro hoje com líderes ocidentais, onde vai defender ‘respostas conjuntas às reviravoltas na economia’. Na avaliação do jornal, o novo site e a própria performance on-line do jovem líder, que abre o dia lendo sites ocidentais, indicariam um político ‘pós-soviético’.
‘W.’, O FILME
O ‘Variety’ soltou crítica de ‘W.’, a produção de Oliver Stone sobre George W. Bush. Diz que é até ‘equilibrado’, levando em conta tanto diretor como seu personagem. E beira a tragédia
‘BUSINESS AS USUAL’
Sob o enunciado ‘No Brasil, os negócios de sempre muitas vezes envolvem grampo’, o ‘WSJ’ deu a Operação Satiagraha na capa, ontem. Relata que a ‘mania’ por escuta vem dos arapongas da ditadura. Mas não alivia ‘o banqueiro Daniel Dantas’, citando a Kroll, que ‘filmou até o então presidente do Banco do Brasil’, na disputa em torno da Brasil Telecom’
PRÊMIO
Folha é eleita a mídia do ano pela Aberje
‘Pelo segundo ano consecutivo, a Folha foi eleita pela Aberje (Associação Brasileira de Comunicação Empresarial) a ‘mídia do ano em comunicação empresarial’ na categoria jornal. O objetivo do prêmio, que está em sua 34ª edição, é destacar a criatividade, a originalidade, a capacidade de evolução e o compromisso com a sociedade dos meios de comunicação.
Além da Folha, receberão hoje o Prêmio Mídia do Ano o Canal Futura (categoria televisão), a Band News FM (rádio), a ‘Revista Amanhã’ (revista) e o jornal ‘Valor Econômico’ (mídia especializada).
Os vencedores foram escolhidos por um júri formado pelos diretores e membros do Conselho Deliberativo da Aberje -uma sociedade civil sem fins lucrativos fundada em 1967 que reúne pessoas físicas e jurídicas ligadas à área da comunicação empresarial. O objetivo da entidade é promover a comunicação entre as organizações e a sociedade.
Neste ano houve 423 inscritos em todo o país, dos quais 68 foram selecionados para a fase final. No âmbito das premiações regionais a empresas e instituições, os vencedores são: Unimed Rio (Espírito Santo e Rio de Janeiro), Fiat Automóveis (Minas Gerais e Centro-Oeste), Alcoa (Norte e Nordeste), Votorantim (São Paulo) e Volvo do Brasil (Sul).
Além das empresas do setor, também serão homenageados, na mesma solenidade, quatro intelectuais da área de comunicação pelo conjunto de suas obras: Margarida Maria Krohling Kunsch, professora titular da ECA (Escola de Comunicação e Artes) da USP; Francisco Gaudêncio Torquato do Rego, ex-professor da ECA e da Faculdade Cásper Líbero; José Marques de Melo, professor titular da Universidade Metodista de São Paulo e diretor da Cátedra Unesco de Comunicação; e Manuel Carlos Chaparro, professor colaborador da USP.
A cerimônia de premiação acontece hoje, às 19h, em um jantar que reunirá cerca de 600 convidados no Espaço Rosa Rosarum, em Pinheiros.’
ELEIÇÕES NOS EUA
Em debate mais agressivo, democrata sai vencedor
‘No debate de retórica mais intensa na corrida pela sucessão de George W. Bush, John McCain referiu-se a Barack Obama como ‘aquele lá’ e disse que o senador ‘e sua patota e seus amigos em Washington’ eram responsáveis pela crise imobiliária que desembocou na atual turbulência.
O democrata respondeu com firmeza a seu oponente, dizendo a certa altura: ‘Esse é o cara que cantou ‘bombardeie o Irã’. A ofensiva do republicano, atrás nas pesquisas nacionais e em Estados críticos, sugere um clima de ‘vale-tudo’ em sua campanha, a menos de 30 dias das eleições presidenciais.
Logo no começo, falando da quebra dos gigantes imobiliários Fannie Mae e Freddy Mac, McCain diria: ‘Mas, você sabe, eles foram os que, com o apoio do senador Obama e de sua patota e seus amigos em Washington, continuaram e fizeram todos aqueles empréstimos de alto risco, os deram a pessoas que nunca teriam condições de pagar de volta’.
Mais adiante, referindo-se ao fato de que tinha votado contra uma lei proposta por Bush e Cheney, mesmo os dois sendo de seu partido, o republicano diria: ‘Sabe quem votou a favor? Talvez você nunca saiba. Aquele lá [apontando Obama com a cabeça]. Sabe quem votou contra? Eu’.
A escalada fez Obama reagir à altura. Ao se referir às propostas de política externa -McCain citara o presidente Teddy Roosevelt, que dizia ‘fale macio e carregue um grande porrete’-, o democrata refutou. Referindo-se a McCain, disse: ‘Esse é o cara que cantou ‘Bombardeie o Irã’, que pediu a aniquilação da Coréia do Norte. Isso não me parece um exemplo de ‘falar macio’.
Com a tática, os dois arriscavam, mas McCain tinha mais a perder. Obama foi o vitorioso no primeiro encontro, segundo as pesquisas, porque parecia mais contido. Já McCain encara nesse momento o que seu colega de partido, Newt Gingrich, ex-presidente do Congresso nos anos Clinton, chamou de ‘a maior crise de sua carreira’.
Pois as pesquisas instantâneas feitas após o debate apontavam a vantagem de Obama. Para 54% dos ouvidos pela emissora CNN, ele venceu o debate, ante 30% que escolheram McCain. É uma queda importante em relação ao primeiro debate, em que o republicano havia ficado com 38%, e o democrata, com 51%. A pesquisa da CBS apontou Obama como vencedor por 39% a 27%.
O encontro aconteceu na Universidade Belmont, em Nashville, no Tennessee, Estado sulista norte-americano solidamente pró-McCain, a quem deve entregar seus 11 votos no Colégio Eleitoral. Foi o primeiro com a participação do público, 80 eleitores indecisos escolhidos pelo Gallup, mais perguntas selecionadas entre 6 milhões colocadas num site.
O formato supostamente beneficiaria o republicano, que prefere e se sente mais à vontade nesse tipo de interação. Mas amarrou um pouco os braços do moderador, o veterano âncora Tom Brokaw, a quem praticamente só coube ler perguntas alheias.
‘Hypo’ e ‘Subject’
Ao longo do dia, a escalada de ataques negativos continuou de ambos os lados. Antes do debate, entraram no ar os anúncios ‘Subject’ (assunto), da campanha de Barack Obama, e ‘Hypo’ (abreviação de hipócrita), da de John McCain.
No primeiro, o democrata diz que seu oponente quer mudar o foco da campanha da discussão da crise econômica para a discussão das personalidades dos candidatos. No segundo, o republicano chama seu adversário de hipócrita ao fazer o que chama de ‘falsos ataques’ às suas propostas: ‘Barack Obama. Ele prometeu coisa melhor. Ele mentiu’, diz o locutor.
A escalada tinha sido anunciada pela campanha de McCain no sábado e iniciada de fato pela candidata a vice, Sarah Palin. Desde então, os anúncios deixaram de ser sobre propostas e passaram a ser ataques pessoais. A governadora do Alasca vem repetindo que Obama ‘anda com terroristas’. O democrata contra-atacaria colocando na rede um ‘documentário’ de 13 minutos sobre o envolvimento do senador no escândalo financeiro dos anos 80 conhecido como ‘Os Cinco de Keating’.
Na seqüência, McCain colocou no ar anúncio que duvida do patriotismo de Obama, chamando-o de ‘desonroso’ por criticar a atuação das tropas americanas no Afeganistão.
Obama e McCain se encontrarão de novo na quarta que vem, na universidade Hofstra, em Hempstead, a 40 minutos de Manhattan. É o último debate antes da eleição do dia 4.’
Fernando Canzian
Candidatos fogem da realidade
‘John McCain ou Barack Obama sentará na cadeira de presidente dos EUA em 20 de janeiro com uma das maiores crises da história no colo. Mas ambos negam-se a olhar de frente o tamanho do problema. Pois não parece razoável que ainda não tenham entendido, a ponto de listar energia, saúde e segurança como suas ‘principais prioridades’.
O caos nos EUA e na Europa nos últimos dias é ante-sala do estrago que vem aí. Os faróis de milha do mercado já enxergaram isso. Daí o pânico.
A crise é uma crise de crédito. De sumiço de dinheiro para quem não tinha dinheiro. É uma ressaca. O fim da festa de quase cinco anos regada por consumo a base de crédito. Crédito tão potente e volumoso que tirou os EUA rapidamente da recessão de 2000 e irradiou seus efeitos para todo o planeta. Foi a fase mais exuberante em três décadas.
Problema: descobriu-se que um único dólar em crédito a receber lastreava até outros US$ 13 em empréstimos bichados. Tudo girava no vazio, que agora suga grandes bancos, mutuários e consumidores para a falência. A cadeia toda bate recordes de endividamento.
Mais de três quartos do PIB dos EUA vêm do consumo, que é movido a crédito. Ele agora secou até para empresas que faturam bilhões, obrigando as autoridades a ligar a máquina de dólares.
Pois bem. No debate de ontem, a crise esteve menos no centro do que deveria. ‘Ficaremos piores em termos econômicos antes de ficarmos melhores?’, questionou o mediador Tom Brokaw.
Obama respondeu que ‘confia na força da economia americana’ e desviou o assunto para a necessidade de ‘regular o mercado’. Para McCain, ‘depende do que vamos fazer’.
Somados, os resgates do Tesouro e do Fed já roçam os US$ 2 trilhões. De onde vem tanto dinheiro? Do déficit fiscal, que tende a dobrar no curtíssimo prazo e se tornar de difícil administração em um cenário de recessão, quando consumidores deixam de gastar, e o governo arrecada menos.
Mas Obama prometeu ‘um corte de impostos a 90% dos norte-americanos’. McCain, ‘não elevar nenhum tributo e dobrar várias deduções’.
Diante do front econômico, o resto do tempo foi gasto em Iraque, Irã, Afeganistão e Israel. O fato confirma a regra: debate é igual em qualquer lugar. Não serve para quase nada.’
Folha de S. Paulo
Quênia expulsa autor de livro contra Obama
‘O escritor americano Jerome Corsi, autor de um livro polêmico contra Barack Obama, foi forçado a deixar o Quênia ontem, horas antes de lançar sua obra. Detido em Nairóbi, ele deveria ser deportado ontem à noite. Obama é ultrapopular no país, onde vive sua família paterna.
O governo alega que o escritor foi detido porque seu visto, de turista, não o autorizava a trabalhar. Além de lançar seu livro, Corsi pretendia também visitar a favela onde vive um dos meio-irmãos de Obama e dar a ele US$ 1.000, em uma tentativa de demonstrar que o senador abandonou parentes.
Corsi tornou-se célebre em 2004, quando lançou um best-seller que abalou a candidatura do democrata John Kerry à Presidência. O livro ‘A Nação Obama: Política de Esquerda e o Culto à Personalidade’, também entre os mais vendidos, acusa Obama de ser um radical e inclui rumores negados, como o de que ele foi criado como muçulmano.
A mãe de Obama era atéia, e o pai, de família muçulmana, é descrito por parentes como agnóstico. O casal se separou quando Obama tinha dois anos e ele só conheceu a família paterna já adulto, após a morte do pai.
Apesar dos parcos laços, muitos quenianos sentem-se próximos a Obama e sua candidatura atrai grande atenção no país, onde tem 82% de apoio.
Com o ‘Financial Times’ e agências internacionais’
RÚSSIA
Folha de S. Paulo
Medvedev e Putin lançam podcast e vídeo
‘O presidente da Rússia, Dmitri Medvedev, aderiu ao uso da internet para reforçar sua mensagem política e lançou ontem o seu primeiro podcast, em russo e inglês. Ele segue o caminho do antecessor e mentor, Vladimir Putin, hoje premiê, que, além de anunciar a repaginação do seu website (www.premier.gov.ru), está lançando um vídeo de 90 minutos, ‘Vamos Aprender Judô com Vladimir Putin’.
‘Caros amigos, bom dia’, diz um sorridente Medvedev, girando em sua cadeira para ficar de frente para o espectador. ‘Quero falar sobre questões urgentes com que o mundo se confronta’.
O podcast faz parte de uma ‘ofensiva de charme’ da Rússia após a guerra de agosto contra a Geórgia, em que o país venceu o conflito militar, mas ficou com sua imagem arranhada no Ocidente. Diz o ‘Financial Times’ que a iniciativa teve ajuda de uma consultoria de imagem com sede em Bruxelas, a G Plus Europe.
O podcast coincide com um discurso que Medvedev vai fazer hoje na Conferência Política Mundial em Evian, França, no qual fará sugestões para um novo tratado de segurança da Europa.
Já Putin disse sobre o vídeo de judô que o título é apenas ‘um truque de propaganda’ e que os principais mestres, na fita, são japoneses. Mas o premiê aparece em várias cenas e também filosofa sobre a natureza do esporte: ‘O objetivo é obter o melhor resultado possível por meio de esforços pequenos, mas efetivos’.
Com ‘Financial Times’ e ‘Independent’’
TELES
Decisão sobre Oi e BrT será tomada em sessão pública
‘A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) vai decidir sobre a mudança na regulamentação do setor que irá permitir a compra da Brasil Telecom pela Oi em sessão pública, na quinta-feira da semana que vem.
Para permitir a compra da Brasil Telecom pela Oi, a Anatel terá que, primeiro, aprovar uma proposta de mudança no PGO (Plano Geral de Outorgas), decreto que divide o país em áreas de atuação para as operadoras de telefonia fixa. Em sua versão atual, o decreto impede que uma concessionária compre outra, que atue em região diferente.
Acatando recomendação do Ministério das Comunicações, a Anatel colocou em consulta pública documento sugerindo a supressão do PGO dos artigos que impedem que uma concessionária compre outra, abrindo caminho para a operação Oi-Brasil Telecom.
Durante o período de consulta, encerrado em agosto, o documento recebeu mais de 400 sugestões. Agora, o conselho diretor da agência terá que se reunir e aprovar uma versão final. É essa versão que será votada na próxima quinta-feira, em sessão aberta ao público.’
ACADEMIA
Caso de plágio entre físicos da USP derruba o vice-diretor da Fuvest
‘O vice-diretor da Fuvest (Fundação Universitária para o Vestibular da USP), Nelson Carlin Filho, se demitiu do cargo anteontem, duas semanas após ter recebido uma moção de censura ética da reitoria. Carlin era um dos autores de uma série de artigos científicos assinados também pelo diretor do Instituto de Física, Alejandro Szanto de Toledo, que apresentavam trechos plagiados.
Segundo a assessoria de imprensa da Fuvest, Carlin apresentou seu pedido de demissão ao conselho curador da instituição, que o homologou na segunda-feira. Sua carta não detalhava a motivação do pedido.
A denúncia de plágio veio a público em junho do ano passado, quando um dos autores copiados, Mahir Hussein -também da USP- entrou em conflito com Szanto ao pedir explicação relativa aos seus textos que haviam sido plagiados.
Ele acusou Szanto de cometer assédio moral: articular retaliações contra ele, que perdeu a sala que possuía no instituto após se aposentar. O físico continua trabalhando como professor colaborador na universidade, mas teve de se alojar em um espaço improvisado.
Alguns colegas de Hussein saíram em sua defesa. O professor Elcio Abdalla diz ter sofrido ameaças de retaliação por parte de Szanto. Em reunião no Instituto de Física, diz, o diretor afirmara possuir um dossiê apontando plágio em artigos de físicos que o denunciavam.
Assim como Carlin, Szanto sofreu moção de censura ética do Comitê de Ética da USP, mas só o artigo plagiado foi mencionado pela reitoria, não a acusação de intimidação. Durante a investigação do caso, após troca de acusações em cartas, o comitê também repreendeu Abdalla e outro professor, João Barata, que questionou a tomada da sala de Hussein.
Um dos artigos com trechos plagiados de Hussein, publicado na revista ‘Physical Review C’, foi alvo de uma errata em publicação posterior. Apesar de o estudo ter sido assinado por vários físicos da USP, Carlin assumiu responsabilidade pessoal pelos trechos com cópias.
A USP, por meio de sua assessoria de imprensa, afirmou que o pedido de demissão de Carlin é uma ‘decisão pessoal do professor’. Ele será substituído na Fuvest por Maria Tereza Fraga Rocco, professora da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Sociais). Szanto, que é do conselho curador da Fuvest, ainda mantém o cargo, também na diretoria do IF.
Os físicos nunca admitiram plágio intencional. Em entrevista à Folha no ano passado, Szanto afirmou que os trechos copiados se deviam a ‘erros de referenciamento’. Carlin não foi encontrado ontem pelo jornal para dar entrevista.’
TELEVISÃO
Mulher de Silvio Santos adapta Janete Clair
‘Caberá a Íris Abravanel, mulher de Silvio Santos, a adaptação para o SBT de ‘Vende-se um Véu de Noiva’, radionovela escrita por Janete Clair em 1966. O texto serviu de base para ‘Véu de Noiva’ (Globo, 1969), que inaugurou a moderna telenovela brasileira.
‘Vende-se um Véu de Noiva’ integra um pacote de 35 textos de Janete Clair, a maior autora de novelas do país, comprados recentemente pelo SBT. A maioria desses textos é originalmente do rádio.
Íris Abravanel irá começar a escrever a nova versão de ‘Vende-se um Véu de Noiva’ em novembro. A mulher de Silvio Santos escreve os últimos capítulos de ‘Revelação’, seu texto de estréia, ainda inédito. A produção está prevista para estrear no próximo dia 27, provavelmente antes de ‘Pantanal’.
Segundo Renata Dias Gomes, neta de Janete Clair e roteirista da Record, ‘Vende-se um Véu de Noiva’ contava a história de Eliana, uma mulher que perdeu o marido em um acidente de carro logo após saírem da igreja. Antes do casamento, eles discutiram por causa de um véu que ela ganhara de amigas, caríssimo. Esse véu, mais tarde, será vendido para Luiz Carlos, o mocinho, responsável pelo acidente.
Os dois se apaixonam. ‘É uma grande história de amor’, conta Renata.
Na versão da Globo, Eliana era Andréia (Regina Duarte). Ela abandonou o noivo no altar, pois descobrira que ele a traía.
NA PRAIA
Daniella Cicarelli será âncora da programação de verão da Band. Apresentará um programa diário, que deverá ser itinerante (passando por várias praias brasileiras). O verão da Band terá ainda shows semanais e envolverá os programas matutinos e vespertinos.
NO GAME
O ‘Quem Pode Mais?’, que Cicarelli apresentou até o início de setembro, não volta mais ao ar _pelo menos neste ano.
MONOPÓLIO
A Band está tentando negociar com a Globo a compra dos direitos da Copa de 2010, exclusivo da concorrente. A direção da emissora já dá como certa a renovação de acordo com a Globo para compartilhar os principais campeonatos brasileiros em 2009 e 2010.
NEGÓCIO 1
Deu 29,9 pontos na Grande São Paulo o primeiro capítulo de ‘Negócio da China’. Foi a melhor estréia às 18h da Globo desde ‘Eterna Magia’ (2007, com 30,3 pontos). A cúpula da emissora, que assistia a uma escalada decadente, vibrou.
NEGÓCIO 2
A expectativa pela estréia da trama de Miguel Falabella alavancou ‘Malhação’, que, com 28,8 pontos, registrou seu recorde na atual temporada, no ar desde outubro de 2007.
CRISE?
A Globo News está tirando proveito da crise mundial. Durante esta semana, o programa ‘Conta Corrente’ terá edições de uma hora cada uma (o normal são 30 minutos). Anteontem, foram quatro programas ao vivo (geralmente, são dois).’
Fernanda Ezabella
‘Dexter’ volta charmoso e apimentado
‘Trinta e oito dias sem matar ninguém. Assim começa a segunda temporada de ‘Dexter’, sobre o serial killer mais queridinho da TV norte-americana -o canal FX exibe os novos episódios a partir de amanhã.
Dexter Morgan, interpretado por Michael C. Hall (‘Six Feet Under’), volta mais atormentado e cheio de problemas em seu trabalho de investigação forense na polícia de Miami. Engana-se, no entanto, quem vê aqui mais um seriado estilo ‘CSI’. Dexter faz justiça com as próprias mãos.
Mas, após matar o próprio irmão, o chamado ‘Assassino do Caminhão de Gelo’, na primeira temporada, Dexter passa a ter problemas em satisfazer seu desejo de morte.
Além disso, para atrapalhar mais sua vida, o protagonista conta com a vigilância cerrada do sargento Doakes, que acaba tendo um futuro inesperado nesta nova trama. O lugar onde Dexter esconde os corpos de suas vítimas também é descoberto, levando pânico a Miami e à caçada pelo ‘Açougueiro de Bay Harbor’.
Obviamente, ele se envolverá nesta nova investigação, enquanto passa mais tempo com sua namorada Rita (Julie Benz) e uma nova personagem, a artista e incendiária Lila (Jaime Murray), apimentando um pouco a vida do até então frígido Dexter.
DEXTER – 2ª TEMPORADA
Quando: amanhã, às 22h
Onde: no FX
Classificação indicativa: não recomendado para menores de 16 anos’
LIVRO
Alencar, o escravista
‘‘A escravidão caduca, mas ainda não morreu; ainda se prendem a ela graves interesses de um povo. É quanto basta para merecer o respeito.’
Quem vinha a público, em 1867, desejoso de ser ouvido na defesa do cativeiro no país era o romancista José de Alencar (1829-1877). A memória histórica no Brasil, no entanto, silenciaria seus argumentos no século seguinte.
A frase aparece numa das sete cartas públicas em que, naquele ano, o autor de ‘Iracema’ criticou o imperador d. Pedro 2º por propor que o país começasse a pôr fim gradual à escravidão. Só agora, 140 anos depois, elas ganham uma edição em livro, ‘Cartas a Favor da Escravidão’ (ed. Hedra), que chega nesta semana às livrarias.
Embora diversos pesquisadores tivessem conhecimento de sua existência -que era citada em alguns trabalhos- e das posições políticas de Alencar, o conteúdo das cartas não chegou a ser reimpresso. O conjunto não aparece, por exemplo, nas obras completas do autor romântico, organizadas em 1959 pela editora José Aguilar (hoje Nova Aguilar).
No final dos anos 90, a historiadora Silvia Cristina Martins de Souza encontrou as cartas na Biblioteca Nacional, no Rio.
Republicou parte delas numa revista especializada da Unicamp. ‘Elas não haviam sido reproduzidas no século 20’, diz a pesquisadora, que atribui o ‘esquecimento’ do material ao ‘desconhecimento e desinteresse’ sobre a obra de Alencar.
O organizador do livro que vem agora a público, Tâmis Parron, tem opinião diferente.
Ele escreve na introdução aos textos de Alencar que se trata de uma ‘provável tentativa de expurgar sua memória artística de uma posição moralmente insustentável para os padrões culturais hegemônicos desde o final do século 19’.
‘É um expurgo? Pode ser. É provável, mas não tenho acesso a documentos que provem essa hipótese’, disse o historiador, em entrevista à Folha.
Procurada, a Nova Aguilar não respondeu aos questionamentos sobre a lacuna e sobre a possibilidade de inclusão das cartas em edições futuras (a última, esgotada, saiu em 1965).
As ‘Novas Cartas Políticas de Erasmo’, como foram denominadas, numa referência ao pensador holandês, apareceram num momento de crise internacional da escravidão. Com o fim da Guerra Civil Americana (1861-1865) e da servidão nos EUA, aumentaram as pressões internacionais para que o Brasil, como último país independente da América a mantê-la, pusesse fim à instituição.
No princípio de 1867, o imperador pede que seu gabinete encaminhe ao Legislativo uma proposta de discussão que resulte num prazo para o fim da escravidão.
Instituição necessária
É em reação a essa movimentação de d. Pedro que Alencar argumenta, em suas cartas, contra a extinção por lei de uma instituição que, para ele, deveria acabar como resultado de um processo ‘natural’ de maturação -processo que na Europa, ele diz, levou séculos.
O escritor e político -falava como integrante do Partido Conservador- reconhece que a escravidão já se apresentava ‘sob um aspecto repugnante’, mas completava que ‘ainda mesmo extintas e derrogadas, as instituições dos povos são coisa santa, digna de toda veneração’. ‘Nenhum utopista, seja ele um gênio, tem o direito de profaná-las. A razão social condena uma tal impiedade.’ As ‘razões sociais’ do cativeiro no Brasil eram muitas, segundo o autor. Em primeiro lugar, de ordem econômica, já que era pelo trabalho escravo que se mantinha a produtividade das unidades agro-exportadoras do século 19. Depois, política, já que era daí que o Estado tirava recursos para existir.
Mas também ‘social’, já que, segundo Alencar, a instituição no Brasil trazia a promessa de inserção, como cidadão (ainda que parcial), do escravo alforriado e de seus filhos.
Finalmente, num raciocínio pouco usual na época, Alencar, de certa forma prefigurando Gilberto Freyre, autor de ‘Casa Grande & Senzala’, afirmava que a escravidão permitia a existência de uma cultura original no Brasil, fruto da ‘miscigenação’ de costumes entre ‘brasileiros’ e negros africanos.
CARTAS A FAVOR DA ESCRAVIDÃO
Autor: José de Alencar
Organizador: Tâmis Parron
Editora: Hedra
Quanto: preço a definir (160 págs.)’
Tales Ab’Sáber
Esforço letrado de Alencar é chocante
‘Quem ler as ‘Cartas a Favor da Escravidão’, de José de Alencar, que a editora Hedra publica após 140 anos de sua primeira aparição, deve se espantar. De fato, o livro tende para o inacreditável.
Há muito que circula a percepção em círculos progressistas de que as elites nacionais poderiam funcionar por princípios pré-modernos em plena modernidade, diante dos quais o horizonte real de desenvolvimento social do país não é um móvel histórico forte.
A vida ideológica estável de nossa época nos impede de checarmos as concepções de mundo do poder e seu controle do corpo e destino no mundo do trabalho. Em um tempo em que todo poder emana do capital, e a crítica da violência no espaço do trabalho está vedada por princípio, apesar da virtual escravidão, a verdade é que a violência contra o trabalho continua aí, presente, configurando amplos setores da economia. No entanto, tais novos senhores do trabalho do outro estão justificados a priori.
Afinal, imensas empresas, como as grandes marcas esportivas ocidentais, não exploram também ao extremo o trabalho, até mesmo o infantil, no sudoeste asiático, ao mesmo tempo em que terceirizam as responsabilidades, como se nada tivessem a ver com essa ordem de iniqüidades, mesmo quando ganham tudo com ela?
Clareza e astúcia
Em uma certa passagem de nossa modernidade, José de Alencar se pôs a defender, com seu estilo transparente e elegante, a posição do Partido Conservador pela manutenção da escravidão no Brasil. A instituição estava abalada, pois fora abolida no império inglês (1833), nas colônias francesas (1848) e nos EUA (1863).
As pressões sobre o Brasil eram grandes, e d. Pedro 2º sinalizava, mesmo que de modo muito lento e gradual, para o horizonte de supressão do trabalho escravo. Então Alencar escreve essas peças execráveis, mas, paradoxalmente, admiráveis pela clareza e pela astúcia, sustentando a necessidade civilizatória da escravidão.
Fundado em um princípio de violência inconciliável da civilização com a natureza e com o outro humano -o bárbaro-, que seria civilizado pela força avançada que o poria como escravo, mas força que também o tornava um virtual sujeito para ele próprio, Alencar se utiliza de todos os argumentos imagináveis em seu tempo para justificar o modernamente injustificável, do risco de crise social à necessidade econômica fatalista e até mesmo um desenho de amálgama de raças pela miscigenação e pela cultura, que faria da escravidão a mãe da cultura nacional.
Hoje, o esforço letrado e frio do escritor é chocante e nos parece vazado de desfaçatez. Algo parece ter mudado no valor dos fatos e da história.
Mas o que podemos dizer dos neo-senhores, que mantêm condições de terror e ignomínia no mundo do trabalho? Se eles fossem obrigados a falar, como recentemente os neocons americanos o fizeram para justificar a ilegítima invasão no Iraque, seu sistema de razões e sofismas soaria semelhante ao do elegante e culto senhor de escravo e romancista brasileiro, como toda ordem de razão que emana da pura força.
De modo algum é acaso que este tenha sido o único trabalho publicado do autor no século 19 ausente das obras completas de 1959. Tal voz conservadora é de fato mais poderosa quando silenciosa, quando não mais necessita se justificar. Por isso o livro de Alencar é importante. Ele dá voz e configuração ao que silencia, pois não necessita justificativa, e pode apenas agir, tão sistematicamente no Brasil.
TALES AB’SÁBER é psicanalista, membro do Instituto Sedes Sapientiae e autor de ‘O Sonhar Restaurado’ (ed. 34)’
BIG BROTHER
De olho para você
‘Você quer acompanhar o que acontece na sua casa e na escola do seu filho enquanto está viajando. Gostaria de visitar o berçário da maternidade para conhecer seu novo sobrinho.
Prefere ver os amigos que moram longe a apenas teclar com eles. Precisa fazer uma reunião de trabalho com colegas de cidades diferentes. Ou, ainda, preocupa-se com segurança e quer deixar sua casa de praia longe de roubos e furtos.
Com a ajuda de webcams, você consegue acompanhar à distância todas as atividades acima -e muitas outras, é claro.
Dos modelos mais simples, que servem para bater papo, até os mais sofisticados, que transmitem imagens pelo sistema Wi-Fi -e podem ser instaladas longe do computador-, há opções para diversos tipos de uso.
Existem até modelos que avisam por e-mail se algum movimento estranho ocorrer no ambiente monitorado, graças a um sensor de movimento.
A popularização da banda larga, fundamental para que a transmissão não engasgue, e a redução de preços impulsionam o mercado. Basta ter um computador conectado à internet para se comunicar por voz e vídeo, em tempo real.
Diversos fabricantes vendem o produto embutido em notebooks ou como acessório de desktops. Quem tem um modelo antigo compra o aparelho por menos de R$ 50, como mostra uma pesquisa realizada no site de comparações de preços Buscapé (www.buscape.com.br).
Segurança
As câmeras não servem apenas para bater papo com os amigos ou fazer reuniões de trabalho: são usadas, também, para reforçar a segurança.
De acordo com a Abese (Associação Brasileira das Empresas de Sistemas Eletrônicos de Segurança), existe cerca de 1 milhão de câmeras de monitoramento em todo o Brasil.
Esse mercado movimentou, apenas em 2007, cerca de R$ 3,4 milhões no país e comporta desde microcâmeras até modelos que podem passar dos R$ 20 mil e são usados no monitoramento de grandes indústrias.
Nesta edição, saiba como proteger sua casa por monitoramento com câmeras IP, que têm alcance maior que o das webcams, e descubra endereços para visualizar imagens ao redor do mundo. Veja, ainda, detalhes sobre o uso de câmeras para segurança e aprenda o que é importante saber ao escolher uma webcam.
1991
f oi o a no em que teve início a primeira transmissão por webcam. A CoffeeCam era direcionada para uma máquina de café no Departamento de Ciência da Computação da Universidade de Cambridge, na Inglaterra. A câmera foi desligada em 2001, de acordo com a Wikipédia. Para ver uma foto minúscula da época, você pode visitar o site www.cl.cam.ac.uk/coffee/coffee.html’
LÍNGUA
Rafael Capanema
Softs se adaptam ao acordo ortográfico
‘Um dos impactos do Acordo Ortográfico, assinado na semana passada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, se dará sobre a informática, a começar pelos verificadores ortográficos dos editores de texto.
Segundo a Microsoft, a atualização do corretor do pacote Office será gratuita para todos os usuários.
O Acordo Ortográfico mudará a grafia de aproximadamente 0,5% das palavras no Brasil. Mudanças como o fim do trema, do acento agudo em ditongos abertos (‘idéia’ será ‘ideia’) e do acento circunflexo com duplos ‘e’ e ‘o’ (‘vôo’ será ‘voo’) ocorrerão gradativamente de 1º de janeiro do próximo ano até 2012.
Segundo Eduardo Campos, gerente-geral da divisão de produtividade e colaboração da Microsoft, ainda não foi definida a data em que a atualização do Office estará disponível, ‘mas há um comprometimento da Microsoft em colocar isso à disposição dentro do prazo estabelecido pelo governo’.
‘Essa atualização poderá vir dentro de um service pack [pacote de atualizações], que acontece de tempos em tempos nos produtos, ou, eventualmente, pode até haver uma atualização específica para o Office do Brasil’, afirmou Campos.
Assim como é possível manter em uma mesma instalação do Office corretores ortográficos de idiomas diferentes, você também poderá deixar dicionários adaptados para a ortografia atual e para a nova, segundo Campos.
O gerente-geral explicou ainda que as interfaces dos programas da Microsoft -os menus do Windows, por exemplo- serão adaptadas gradativamente até 2012.
BrOffice.org
Um dos maiores concorrentes do Office, o pacote gratuito BrOffice.org saiu na frente: colocou para download, em julho deste ano, o verificador atualizado para a reforma.
O corretor pode ser baixado gratuitamente em www.broffice.org/verortografico. Depois, é necessário descompactar os arquivos e, no Windows, copiá-los para a pasta C:Arquivos de programasBrOffice.org2.3sharedictooo.
Nos testes da Folha, o verificador se saiu bem ao analisar frases como ‘Eles crêem ter uma boa idéia para tranqüilizar os passageiros do vôo’ (que se tornará ‘Eles creem ter uma boa ideia para tranquilizar os passageiros do voo’).
Coordenado por Raimundo Santos Moura, o processo de atualização do corretor ortográfico já envolveu 82 voluntários.
‘É fácil colaborar. Você observa, ao digitar um determinado texto no BrOffice.org, que uma palavra correta ficou grifada em vermelho. Aí você nos envia um e-mail relatando esta palavra’, diz um texto no site.
Google Docs
Até a conclusão desta edição, o Google ainda não havia respondido às solicitações da reportagem para detalhar os planos de atualização do corretor ortográfico do pacote de escritório on-line Google Docs & Spreadsheets (docs.google.com).
BANCA ON-LINE
A rede Issu (www.issu.com) é ‘o lugar para publicações on-line’ de revistas a arquivos em PDF, passando por catálogos; além de ler, você consegue fazer upload de arquivos; dá para procurar por categorias, como arte, fotografia, moda e tecnlogia’
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Consulta pública sobre nova ortografia recebeu só 12 e-mails
‘O MEC (Ministério da Educação) abriu uma consulta pública para que os brasileiros tirassem dúvidas ou enviassem sugestões sobre a reforma ao endereço de e-mail acordoortografico@mec.gov.br. Ao longo de três semanas, foram enviadas apenas 12 mensagens, e nenhuma sugestão foi aproveitada. A página do MEC sobre o assunto (www.mec.gov.br/acordoortografico) traz a íntegra do acordo e o texto do decreto. Em 7 de setembro, o portal iG passou a adotar a reforma em seus textos e colocou no ar um site sobre a reforma (educacao.ig.com.br/acordo_ortografico), que reúne artigos, notícias e um manual das novas regras.’
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O Estado de S. Paulo
Quarta-feira, 8 de outubro de 2008
ATENTADO
ANJ repudia ordem para fechar jornal
‘A Associação Nacional de Jornais divulgou nota condenando decisão do juiz Flávio Silveira Quaresma de mandar fechar o Entre-Rios Jornal, de Três Rios (RJ), na sexta-feira. A decisão foi determinada pela não publicação de direito de resposta ao prefeito Gil Leal. Nesses casos, segundo nota da ANJ assinada pelo vice-presidente, Júlio César Mesquita, a lei determina apenas multa.’
ELEIÇÕES NOS EUA
Crise financeira domina debate na TV
‘A um mês da eleição americana, a crise econômica foi o assunto dominante do segundo debate presidencial. O democrata Barack Obama voltou a acusar o governo de George W. Bush e o republicano John McCain pela grave desaceleração que atinge os EUA. Já o republicano afirmou que Obama aumentará impostos e agravará a crise. No meio do debate, McCain lançou uma proposta para o governo federal comprar e refinanciar hipotecas de mutuários que estão prestes a perder suas casas, embora não tenha detalhado o plano.
De acordo com pesquisas realizadas logo após o debate, Obama saiu-se melhor que McCain. Pela sondagem da rede CBS, o democrata venceu o debate para 39% dos eleitores. McCain foi superior para 27% dos entrevistados – 35% disseram que houve empate.
A CNN também divulgou pesquisa mostrando vantagem para Obama no debate de ontem. Ele venceu para 54% dos entrevistados, enquanto McCain foi o melhor para 30% dos americanos. Segundo a mesma sondagem, a maioria dos entrevistados afirmou que Obama é o candidato mais indicado para lidar com a crise.
McCain, que está atrás nas pesquisas e tem de lutar até em Estados tradicionalmente republicanos, como Carolina do Norte, Virgínia e Flórida, precisava vencer o debate para virar o jogo. Obama, porém, foi muito mais articulado ao responder as perguntas, com detalhes específicos de seus programas econômicos.
O democrata tem-se saído melhor durante a crise do sistema financeiro e ontem McCain não conseguiu mudar o foco do debate nem ganhar pontos com a economia. O republicano tentou disfarçar seu aparente desprezo por Obama – no último debate, ele nem sequer olhou para o rival. Apesar de estar mais sorridente dessa vez, McCain e cometeu um pequeno deslize ao dirigir-se a Obama como ‘aquele lá’. ‘Você sabe quem votou a favor da lei de energia cheia de verbas para projetos inúteis?’ , perguntou McCain. ‘Aquele lá’, disse, apontando para Obama.
O debate na Universidade Belmont, em Nashville, Tennessee, durou uma hora e meia. O formato permitia que os eleitores fizessem perguntas para os candidatos, mas não impediu que os dois trocassem acusações. ‘Não podemos continuar tomando dinheiro emprestado dos chineses para mandá-lo para a Arábia Saudita. Estamos hipotecando o futuro de nossos filhos’, afirmou Obama.
McCain atacou o histórico do adversário no Senado. ‘O senador Obama votou mais de 90 vezes para aumentar impostos dos americanos’, disse o republicano, que também defendeu a construção de mais usinas nucleares como alternativa energética. ‘Meu adversário se opõe à energia nuclear.’
Obama defendeu-se. ‘Não me oponho à energia nuclear. Eu só acho que ela é apenas uma das alternativas’, respondeu. ‘O que McCain não disse é por que ele votou mais de 100 vezes no Senado contra a promoção de energias alternativas.’
O democrata afirmou que assistência à saúde é um direito das pessoas e citou o exemplo da mãe, que morreu de câncer. ‘Minha mãe, que morreu de câncer aos 53 anos, passou seus últimos dias no hospital discutindo com as seguradoras que não queriam cobrir, que diziam que ela tinha condição pré-existente’, disse Obama, em um momento considerado um dos pontos altos por analistas.
Em outro momento positivo para o senador democrata, ele foi perguntado sobre os sacrifícios que iria pedir ao povo americano. ‘Na política energética, será necessário que cada um de nós façamos sacrifício de economizar energia.’
Além de lançar o plano de compra das hipotecas em atraso dos mutuários, o republicano criticou Obama por ter votado a favor de US$ 800 milhões em gastos inúteis, inclusive ‘US$ 3 milhões para um projetor para o planetário de Chicago.’ O republicano também deu pistas sobre quem escolheria para substituir Hank Paulson na secretaria do Tesouro. ‘Warren Buffett, que apóia o senador Obama’, disse, citando também Meg Whitman, uma das conselheiras da campanha de McCain e ex-CEO do site de leilões eBay.’
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Revista justifica apoio a democrata
‘A revista americana The New Yorker publicou na edição desta semana um editorial em defesa da candidatura do democrata Barack Obama à presidência, em um texto que faz duras críticas ao ‘desastre’ do atual governo republicano. O editorial afirma que, mesmo antes da atual crise financeira, o cenário econômico e fiscal já era ‘desolador’. ‘Durante o governo Bush, a dívida interna quase dobrou. A criação de empregos pelo setor privado ficou em um sexto do que era com o presidente (Bill) Clinton’, diz o texto.
Ao tratar da guerra no Iraque, os ataques são ainda mais duros. ‘Não há mais a menor dúvida de que o governo manipulou, intimidou e mentiu à população americana sobre a guerra e, depois, gerenciou mal quase todos os aspectos dela.’ O editorial diz ainda que a guerra só trouxe prejuízos tanto para os EUA como para o Iraque e cita a tortura de presos como uma catástrofe ética e diplomática.
A revista acusa o atual governo de transformar os EUA nos ‘retardatários globais’ no setor energético e ambiental. O país não investe em fontes alternativas de energia e não promoveu política para conter consumo e desperdício exagerados.
O texto tampouco poupa críticas ao candidato republicano, John McCain, descrito como alguém sem interesse e conhecimento de questões econômicas. ‘Ele tem pouca coisa com substância a dizer sobre a crise.’ Apesar de ambos os candidatos abusarem da palavra ‘reforma’, a New Yorker acusa McCain de ‘demagogia’ e afirma que apenas Obama ‘forneceu uma visão convincente, racional e desenvolvida por completo’ de seu projeto de reforma.
Sobre as nomeações à Suprema Corte, ‘o contraste entre os candidatos é ainda maior’. Obama, que atuou como professor de direito constitucional, votou contra a indicação de vários juízes considerados sem qualificação pela revista.’
TELEVISÃO
Estréia retoma ibope
‘A estréia de Negócio da China, nova novela das 6 da Globo, animou a direção da emissora. A trama de Miguel Falabella registrou média de 30 pontos em sua primeira exibição, anteontem, retomando a média de estréias no horário. Para se ter uma idéia da força do resultado, sua antecessora, Ciranda de Pedra, estreou com 25 pontos. Desejo Proibido, trama que antecedeu Ciranda, estreou com 26.
Falabella, que assistiu ao primeiro capítulo ao lado de parte do elenco, recebeu telefonemas da direção da Globo durante a estréia, com elogios ao desempenho inicial da trama.
Outro ponto elogiado: a química entre o casal protagonista, Grazi Massafera e Fábio Assunção. A música de abertura, Lig-Lig-Lig-Lé, interpretada por Ney Matogrosso, também caiu no gosto da chefia da rede.
Quanto ao elenco, o que se viu no primeiro capítulo foi Grazi lutando – ainda – para perder o sotaque do interior, enquanto Antônio Fagundes, em participação especial, e Natália do Valle, garantiam o peso de boa interpretação.
O núcleo de humor, chefiado por Ney Latorraca e que muito promete, pouco apareceu na estréia.’
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