Isto está na Constituição desde o início da era republicana, mas quando o presidente Lula declarou ontem, diante do papa Bento XVI, que o Estado brasileiro é laico, pareceu a todos que anunciava algo extraordinário.
O Estado democrático é necessariamente laico, leigo, secular, os governantes não têm o direito de interferir nas crenças ou descrenças individuais.
Apesar de não conter qualquer novidade, a declaração do presidente Lula soou como uma proclamação diante das ameaças do Vaticano de excomungar os políticos que favorecerem a legalização do aborto.
Novidade ou não, é um compromisso renovado, veemente e público. É um compromisso não apenas do governo, mas de todos os poderes, inclusive da mídia. Não é demais repetir que a mídia eletrônica é uma concessão pública e, como tal, não pode contrariar os fundamentos do Estado concedente.
A maioria das tevês brasileiras contraria flagrantemente as exigências de um estado laico: assumem-se como porta-vozes de diferentes confissões e chegam mesmo a confrontar-se em perigosas guerrilhas santas.
A esmerada cobertura do Jornal Nacional ontem à noite foi um pouco além dos limites de uma mídia laica dentro de um estado laico. A emoção dos fieis diante do Sumo Pontífice é uma realidade que deve ser compartilhada por todos, mas a catequese religiosa através da TV fere o caráter leigo do estado brasileiro, ontem reafirmado de forma tão enfática pelo presidente da República.